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Moçambique

Cabo Delgado. Histórias de quem teve de pagar para conseguir fugir da morte

27 mai, 2021 - 09:31 • Marta Grosso

Consegue imaginar não ter nada e ter de pagar para poder ir para um lugar seguro? Os voos humanitários são, em teoria, gratuitos. Mas entre a teoria e a prática ainda vai uma grande diferença.

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Para fugir aos violentos ataques e proteger a família, a população de Cabo Delgado (Norte de Moçambique) teve de pagar subornos às forças de segurança.

A denúncia é feita por uma correspondente da BBC em Pemba, num artigo publicado nesta quinta-feira.

Nesta altura, e depois dos violentos ataques levados a cabo pelos militantes jihadistas associados ao autodenominado Estado Islâmico, crescem as preocupações sobre uma emergência possível humanitária nas zonas a que as agências humanitárias não tiveram acesso.

As forças de segurança bloquearam algumas estradas e montaram postos de controlo – nomeadamente, no vilarejo de Quitunda, perto de Palma, onde mais de 20 mil pessoas se abrigaram.

Para sair para lugar mais seguro e longe dos terroristas, a população teve de pagar.

“De início, não cobravam a mulheres grávidas, doentes e crianças, mas depois começaram a cobrar a todos os que estavam na lista” de embarque, conta Farina (nome falso) à BBC.

Uma outra diz que pagou 5.000 meticais moçambicanos (67,60 euros) para conseguir entrar num voo do Exército.

“Não tínhamos dinheiro e tínhamos fome e as crianças estavam doentes. Para sair de Quitunda [uma aldeia], falei com o meu marido e ele falou com o patrão dele, que nos mandou o dinheiro”, conta Hadijah, outro nome fictício.

Farida e Hadijah conseguiram fugir com os filhos, mas muitas outras pessoas ficaram para trás, entre as quais o marido de Farida.

A situação é confirmada – e repudiada – pela organização não-governamental Human Rights Watch (HRW).

“Pode imaginar pessoas que não têm comida, nada para comprar, que perderam tudo durante este conflito a ser forçadas a usar o último dinheiro que têm para poder embarcar os seus familiares num avião com vista a um local seguro?”, questiona Zenaida Machado, investigadora sénior da HRW.

Farida estava desesperada para retirar sua família de Quitunda. As opções de transporte eram barco ou avião, mas a única alterantiva ao suborno era ficar ali. Arrecadados os 5.000 meticais (67,60 euros), conseguiu ser incluída numa lista de embarque para sair dali com os filhos.

Isto, apesar de os voos humanitários serem gratuitos.

Terrorismo em Moçambique. O que se passa em Cabo Delgado?
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Al-Shabab foi o grupo que lançou a invasão e os ataques na região de Cabo Delgado, rica em recursos, em 2017. Dois anos depois, jurou fidelidade ao grupo do Estado Islâmico, não sendo claro quão estreitas são as ligações entre as duas organizações.

Facto é que a violência foi extrema e matou mais de 2.800 pessoas e quase 700 mil forçadas a deixar as suas casas.

O ataque que mais atenção recolheu foi em Palma, uma cidade costeira que estava a ser transformada num centro de indústria de gás, situada a 10 km de uma fábrica de gás liquefeito operada pela gigante francesa Total. É o maior investimento estrangeiro da África, de cerca de 16 mil milhões de euros (20 mil milhões de dólares) , que agora ficou em espera.

Segundo uma avaliação da Organização Internacional das Nações Unidas para as Migrações havia 11.104 pessoas a viver no de Quitunda, numa escola próxima à instalação de gás, em abril.

“Os deslocados internos precisam urgentemente de assistência humanitária. 30% das famílias dormem ao ar livre e os restantes 70% vivem em abrigos improvisados”, refere o relatório da OIM.

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