27 jan, 2022 - 12:37 • Miguel Coelho
Os italianos estão a tentar eleger um novo Presidente. Desde segunda-feira, já houve três votações inconclusivas.
Porque é tão difícil escolher o Presidente em Itália?
Itália tem um sistema complicado de eleição presidencial. Não são os eleitores que escolhem, como acontece em Portugal, mas sim um colégio eleitoral de pouco mais de mil pessoas – mais exatamente, 1.008 – que são os chamados “grandes eleitores” (eram 1.009, mas um morreu esta semana).
São basicamente os senadores e os deputados e ainda 58 delegados das diferentes regiões italianas.
A dificuldade começa no facto de não haver candidatos designados à partida – o voto, que é secreto, pode ser em qualquer cidadão italiano com mais de 50 anos. Por isso, aparecem os nomes mais variados.
Mas, pode ser, por exemplo, Andrea Bocelli?
Claro. Aliás, ao longo dos anos, já foram indicados nomes como os da atriz Sophia Loren, do futebolista Francesco Totti e até de um chefe da Máfia. No fundo, cada um vota em quem quer e, para complicar ainda mais, é necessária, nas três primeiras votações, uma maioria de dois terços para eleger o Presidente, o que faz com que seja altamente improvável que alguém consiga seja eleito nas primeiras voltas.
Alguma vez um Presidente italiano foi eleito na primeira votação?
Sim, já houve três ocasiões em que foi eleito logo à primeira. Mas isso só foi possível porque os principais partidos fizeram previamente um acordo para escolher o Presidente, o que na maior parte dos casos não acontece.
O que é mais frequente é o Presidente só ser eleito a partir da quarta volta, porque aí passa a ser suficiente uma maioria absoluta, ou seja, mais de metade dos votos. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o atual Presidente, Sergio Mattarella.
E não há limite?
Não, as votações só acabam quando alguém conseguir uma maioria absoluta. A eleição mais longa foi em 1971, quando foram necessárias 23 voltas para eleger um Presidente. Mas, em 1992, foi preciso votar 16 vezes para eleger Oscar Luigi Scalfaro.
E desta vez, são precisas muitas votações?
Isso é sempre possível, mas o que se espera é que, a partir desta quinta-feira, o cenário fique mais claro, dado que acontece a tal quarta volta, a partir da qual basta maioria absoluta. E os partidos guardam para esta fase os nomes dos candidatos mais fortes. Não seria de excluir que, já numa das próximas votações, pudesse surgir “fumo branco”.
Como na eleição do Papa...
Sim, mas neste caso não há realmente fumo, ainda que o resto seja ao estilo da eleição do Papa. E, aliás, a residência oficial do Presidente italiano, o Palácio do Quirinal, já foi também residência papal, pelo que será daí que vem a inspiração.
Quem é apontado como candidato mais provável?
O candidato mais forte é o atual primeiro-ministro, Mario Draghi, que foi já também presidente do Banco Central Europeu e é uma figura muito prestigiada, que deu estabilidade política e económica a Itália.
Só que, se deixar a chefia do Governo, abre-se um novo problema, que é encontrar outro primeiro-ministro num quadro partidário muito fragmentado e onde os consensos são complicadíssimos.
E já se falou de Sílvio Berlusconi...
Esse era o maior desejo de Berlusconi, mas desistiu entretanto. Não só seria difícil que tivesse apoio maioritário, como já não é propriamente um jovem: já tem 85 anos e o mandato presidencial em Itália é de sete, o que o levaria até aos 92 anos. Além disso, está outra vez internado com complicações de saúde.
Então, se não for Draghi, não se sabe quem será...
Há vários nomes de que se fala, mas nenhum claramente consensual.
E não pode ser reeleito o atual Presidente?
Poderia, se quisesse, mas Sergio Mattarella também já tem 80 anos e garantiu que quer retirar-se. Apesar disso, na votação de quarta-feira, foi até ele quem obteve mais votos. E há quem diga que, em caso de impasse, pode mesmo ser Mattarella a ficar no cargo, ainda que não cumpra o mandato até ao fim. Há que esperar para ver.