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Entrevista

Santos Silva diz que não há “soluções mágicas” para insegurança em Moçambique

17 fev, 2022 - 18:00 • José Pedro Frazão

Em entrevista à Renascença, o ministro dos Negócios Estrangeiros diz estar sempre disponível para se deslocar a Maputo para reafirmar o apoio a Moçambique, assinalando contudo que a visita de Marcelo Rebelo de Sousa, marcada para dentro de um mês, vai ser importante para exprimir a posição portuguesa.

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Santos Silva diz que não há “soluções mágicas” para insegurança em Moçambique

Há sinais de novos focos de violência no norte de Moçambique, território que há um ano mobilizou a atenção de Portugal ao ponto de Augusto Santos Silva ter sido encarregue pela União Europeia de abrir caminho em Maputo para uma missão militar da União naquele país. Em entrevista à Renascença, o ministro dos Negócios Estrangeiros sublinha, com insistência, que Moçambique é um país soberano a quem compete propor alterações no aconselhamento externo de que possa necessitar.

Santos Silva admite que, a qualquer momento, pode regressar a Maputo para ajudar a consolidar a parceria entre aquele país lusófono e a União Europeia.

O chefe da diplomacia portuguesa apela ainda ao “espírito de bom senso e magnanimidade” na Guiné-Bissau, a propósito da investigação ao recente ataque armado falhado.

A situação de segurança não está consolidada no norte de Moçambique, com relatos de novos episódios de violência em diversas províncias. Isto está em linha com a sua avaliação da segurança naquele território?

São as informações de que dispomos e que aliás são públicas. É preciso não ter ilusões sobre isto. Não estamos a falar de soluções mágicas que, de um momento para o outro, resolvem este tipo de problemas. Em Cabo Delgado, a situação de segurança melhorou bastante. Mas, por vezes, verificamos que grupos insurgentes e terroristas de inspiração radical tentam criar outros focos de ataque noutras províncias no norte e centro de Moçambique. É preciso estar mesmo muito atento. O primeiro-ministro vai falar, certamente, sobre isto na Cimeira União Europeia – União Africana, porque o que fizemos em Moçambique é a prova de que quando fazemos bem as coisas, estas resultam.

Mas começou por reconhecer que a situação não está consolidada.

Eu sei. Mas hoje estamos a falar de uma situação sem nenhuma espécie de comparação com o que se vivia há dois anos. Não preciso de lembrar as decapitações, as deslocações forçadas em massa das populações, a fome, etc…

O diretor da Capacidade Militar de Planeamento e Condução da missão militar da UE em Moçambique esteve em janeiro no Parlamento Europeu onde disse que o mandato que tem exclui aconselhamento estratégico, sustenta que a capacidade de perceber realmente a eficácia das operações em Cabo Delgado é limitada e precisa de outros meios uma vez que não tem autorização para ir lá. Isto não pode ser resolvido?

Os termos de referência da missão europeia foram os acordados com Moçambique. A missão não foi imposta, mas pedida por Moçambique. Eu próprio desloquei-me a Moçambique, em representação do Alto Representante para a Política Externa, em janeiro de 2021, numa visita importante para que a missão de apoio pudesse ter sido aprovada em tempo útil e até em tempo recorde em comparação europeia. Nesses termos, nós fornecemos equipamento e capacidade logística a Moçambique, aumentámos o nosso esforço de ação humanitária e de cooperação para o desenvolvimento e participamos na formação de tropas especiais moçambicanas.

A posição que citei dá a entender que esse mandato está esgotado e será preciso ir mais além.

Não diria isso. Com todo o respeito por esse oficial, quem toma as decisões são os ministros. E os ministros tomaram uma decisão muito importante porque Moçambique é um Estado soberano. O aconselhamento de decisões estratégicas compete às autoridades moçambicanas. Nós estamos lá para apoiar, não por caridade mas porque temos boas relações com Moçambique e com toda a África Austral e também estamos a tratar da nossa própria segurança como europeus.

Marcelo vai a Moçambique
Marcelo vai a Moçambique

Mas se a situação dá sinais de alguns focos crescentes de tensão, não se justificaria a revisão dos termos de entendimento entre a União Europeia e Moçambique? Essa revisão está na agenda dos ministros dos Negócios Estrangeiros?

Está na agenda dos ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, no quadro da nossa monitorização permanente com as autoridades moçambicanas. Não somos nós que temos que decidir aquilo de que Moçambique precisa. Isso compete a Moçambique.

O Alto Representante mostrou-se tão interessado no envolvimento português para ajudar nessa situação que até pediu a sua ida a Moçambique, como recordou agora. Não será preciso ir lá outra vez para reafirmar essa posição tendo em conta o crescimento desses focos de tensão?

Sempre que for necessário. Aliás, o Presidente da República vai deslocar-se proximamente a Moçambique e há uma cimeira entre Portugal e Moçambique que teve que ser adiada, em novembro, devido ao chumbo do Orçamento do Estado e que será retomada certamente pelo XXIII Governo.

A visita do Presidente da República relaciona-se com a estabilização desta situação?

O Presidente da República de Portugal visita Moçambique a convite do seu homólogo. Como o Presidente diz e bem, sempre que dois Presidentes encontram-se, todos os assuntos são tratados.

Sobre a Guiné-Bissau, houve um golpe militar recente que fracassou. Na altura disse esperar que seja apenas um “incidente de percurso” na consolidação institucional no país. Mas a Guiné tem um longo historial destas revoltas e na África Ocidental estão a proliferar os golpes de estado.

Também por isso foi tão importante que a condenação desse ataque armado às instituições na Guiné-Bissau tivesse sido imediatamente assumida por Portugal, pela Comunidade Económica de Estados da África Ocidental e pela CPLP e que o ataque armado não tivesse tido sucesso.

Eu sou ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal. As questões internas da Guiné-Bissau não são as minhas questões. Não tenho nenhuma espécie de autoridade para me pronunciar. Tenho um partido em Portugal e não na Guiné-Bissau. A consolidação institucional de que falo é a da Presidência da Guiné-Bissau, do Parlamento, da Assembleia, do Governo, do sistema de Justiça, do sistema de média que é tão importante numa democracia. É muito importante que essas instituições que em situações anteriores já foram relativamente frágeis se vão consolidando. São essas instituições que permitem que a normal divergência de interesses, de debate e confrontação de propostas diferentes possa fazer-se em paz.

Tem indicação de que este incidente esteja sanado?

Tanto quanto sei decorrem inquéritos para tentar apurar factos e realidades e esperemos que se façam de acordo com a lei e também com o espírito de tolerância e até magnanimidade que são bons elementos nestas circunstâncias.

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