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1942-2022

Uma figura "ímpar" que governou com "frieza". As reações à morte de José Eduardo dos Santos

08 jul, 2022 - 13:28 • Diogo Camilo , Fábio Monteiro , Pedro Mesquita

Marcelo destaca "protagonista decisivo" da História de Angola. À Renascença, o escritor angolano José Eduardo Agualusa diz que o ex-Presidente “podia ter sido um ditador não corrupto, mas não foi". "Zedu", como também era conhecido, morreu esta sexta-feira, aos 79 anos, numa clínica em Barcelona.

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José Eduardo dos Santos, o ex-presidente de Angola entre 1979 e 2017, morreu esta sexta-feira em Barcelona, onde estava há duas semanas ligado às máquinas e onde era acompanhado devido a problemas de saúde.

O anúncio foi feito pela Presidência de Angola, que em comunicado destacou "a figura de um estadista de grande dimensão histórica, que regeu durante muitos anos com clarividência e humanismo os destinos da nação angolana, em momentos muito difíceis".

Pouco depois, em nova publicação, o Presidente angolano, João Lourenço, decretou um período de luto nacional de cinco dias, com início este sábado, descrevendo o seu antecessor como uma "figura ímpar da pátria angolana, à qual se dedicou desde muito cedo, tendo tido relevante participação na luta contra a colonização, na conquista da independência nacional, na consolidação da nação, na sua afirmação no contexto das nações, na conquista da paz e reconstrução e reconciliação nacionais".

FALECEU ANTIGO PRESIDENTE JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS ■ PRESIDENTE JOÃO LOURENÇO DECRETA LUTO NACIONAL Considerando o...

Posted by Presidência da República - Angola on Friday, July 8, 2022

Tchizé, uma das filhas do antigo presidente angolano, foi uma das primeiras pessoas a reagir ao seu falecimento, deixando várias publicações na sua página pessoal do Instagram.

"Os pais nunca morrem porque são o amor mais verdadeiro que os filhos conhecem em toda a vida. Eles vivem para sempre dentro de nós", escreveu.

A filha de Zedu, como era conhecido, deixou também críticas ao atual chefe de Estado angolano: "Apagar a luz do outro não vai fazer com que a sua brilhe mais", indicou noutra publicação, visando João Lourenço e o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido que José Eduardo dos Santos dirigiu durante décadas.

O MPLA também reagiu em comunicado à morte do seu ex-líder, anunciando o cancelamento de todas as ações até ao final do luto nacional, dizendo-se "consternado" com a notícia da morte do ex-Presidente.

Em declarações à Renascença, o escritor e ativista angolano José Eduardo Agualusa disse que o antigo presidente ficará na memória do país por causa da corrupção. “Podia ter sido um ditador não corrupto, mas não foi. Não há volta a dar.” Ainda assim, também será recordado por, quando tomou posse em 1979, "ter colocado fim à vaga de repressão que se seguiu à independência de Angola”, ter libertado a maioria dos presos políticos e ter acabado com a pena de morte.

Emídio Fernando, diretor da Rádio Essencial, em Angola, antecipa vários problemas até que o funeral de José Eduardo Santos ocorra. Tchizé e Isabel dos Santos receiam que, se forem até Angola para as cerimónias fúnebres, acabem detidas. Alegadamente, há mandados de captura nesse sentido.

“Esta não é uma situação normal. Elas têm dito que são perseguidas”, diz à Renascença.

Marcelo: "Um protagonista decisivo"

Em Portugal, o Partido Comunista Português (PCP) anunciou ter enviado condolências ao MPLA, destacando a contribuição de José Eduardo dos Santos "para a conquista da paz pelo povo angolano e a reconstrução do país".

Marcelo Rebelo de Sousa disse que a morte de José Eduardo dos Santos representa o desaparecimento de um "protagonista decisivo" de Angola desde o final dos anos 70 até ser substítuido por João Lourenço, em 2017. Já o antigo Presidente português Cavaco Silva lembra um “artífice decisivo na construção da paz”.

O percurso de José Eduardo dos Santos, Presidente absoluto de Angola durante 38 anos
O percurso de José Eduardo dos Santos, Presidente absoluto de Angola durante 38 anos

A ex-embaixadora Ana Gomes considerou que José Eduardo dos Santos chegou a ser “uma promessa de transição para a democracia” em Angola, mas optou pelo “desenvolvimento de uma cleptocracia a favor de uma elite”.

“José Eduardo dos Santos chegou a ser uma promessa de transição para a democracia e tornar uma Angola mais desenvolvida e mais justa, mas essa promessa esboroou rapidamente”, disse à Lusa a ex-candidata à Presidência da República Portuguesa.

O ex-primeiro-ministro português Durão Barroso lembrou "com saudade" o antigo Presidente angolano, destacando "o patriota" e "o estadista" que ficará na História do seu país e de África.

"Recordo alguém de excecional inteligência, que foi capaz de garantir a unidade nacional angolana num contexto geopolítico extraordinariamente difícil, que ficará indelevelmente na História de Angola, de África e também das relações de Angola com Portugal", escreveu o ex-presidente da Comissão Europeia e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros português, numa declaração enviada à agência Lusa.

O antigo ministro e líder do Banco BIC, Luís Mira Amaral, recordou o antigo Presidente angolano José Eduardo dos Santos como uma pessoa com um "comportamento bastante sereno e frio". Contactado pela Lusa, Mira Amaral respondeu que apenas esteve com José Eduardo dos Santos uma vez: "Apenas o cumprimentei uma vez, quando ele veio em visita oficial a Portugal, numa receção no Palácio da Ajuda [Lisboa] a convite do então Presidente da República, Cavaco Silva, (...), mas nunca conheci o senhor".

No entanto, o economista recordou a "longa duração" do mandato do antigo chefe de Estado angolano e reconheceu-lhe um "comportamento bastante sereno e frio".

Na leitura de António Martins da Cruz, José Eduardo dos Santos ganhou a guerra e, a seguir, ganhou a paz. São estas as duas marcas essenciais da longa presidência de José Eduardo dos Santos, com quem esteve dezenas de vezes, quando Cavaco Silva era primeiro-ministro.

Em declarações à Renascença, o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros considera, por outro lado, que a longa presença de Eduardo dos Santos no poder não fica ensombrada pela corrupção, porque diz: Angola tem que ser comparada com outros países africanos e não com a Dinamarca ou Suécia. É evidente que havia , para os nossos parâmetros, corrupção, mas "Angola tem que ser comparada com países africanos e não com países nórdicos".

Também o secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Zacarias da Costa, realçou através de um comunicado a “grande perda para Angola e, também, para o mundo da língua portuguesa."

[em atualização]

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  • DE NOVO
    08 jul, 2022 PORTUGAL 15:37
    Não sou o ÚNICO verdadeiro do Mundo, mas não sou INGÉNUO. Quando ouço GRANDES QUADROS Portugueses falarem daquilo que sou TAMBÉM conhecedor e não dizem toda a verdade ou falam em meias verdades, não consigo ficar CALADO. No que disse no anterior, estive entre 1973 e 1974 em Silva Porto, capital do BIÉ. Era Militar, SOLDADO, que comigo fez muitos serviços e deslocações na região o Cidadão Angolano, já falecido, Diogenes Malaquias. Foi este Cidadão que me orientou e me aconselhou a ficar em Silva Porto. Durante esses DOIS anos foi um GRANDE AMIGO e conselheiro fiel. Após a nossa vinda, durante uns meses e poucos anos trocamos correspondência. Sei que aderiu à UNITA e chegou a altas patentes. Foi responsável pela área onde tínhamos estado, ou seja, a zona do Andulo, Bailundo e não só. Foi Ele um dos escolhidos para MEDIAR negociações com Oficiais Superiores das Forças Armadas Angolanas. Na ALTURA tive conhecimento que Ele foi como que o OBREIRO do baixar armas entre Unita e MPLA e que pelo serviço prestado foi chamado para comandar as Forças Armadas Angolanas. Ora como Amigo do " DIOGENES ", peço que quem falar sobre o passado de Angola, não se coloque em BICOS de PÉ, pois outros foram MAIS úteis do que aqueles que em gabinetes escreviam ACORDOS. Diogenes Malaquias foi para a PAZ em Angola, muito IMPORTANTE, para além de outros.
  • EU
    08 jul, 2022 PORTUGAL 14:57
    Pois é, todo o SER VIVO morre. Uns dirão bem, outros dirão mal. Quando este Senhor Governou Angola fez tudo pelo POVO ANGOLANO, para que as suas condições de vida fossem as melhores? Essa é a grande e ÚNICA pergunta que se deve colocar. Estive DOIS ANOS em Angola como Militar Miliciano e OBRIGADO entre 1973 e 1974. Saí de lá em Dezembro de 1974. Conheci durante esses anos TODO o sul a leste de Luanda. País pelo qual me encantei, muito embora estivesse estacionado na cidade de Silva Porto, hoje Kuito. Como me sentia TÃO SEGURO como na METRÓPOLE, comecei a criar raízes na cidade, começando por COMPRAR casa. Registei, escriturei, paguei e cheguei a habitar a mesma. Fui convidado a ficar lá, quando o serviço militar me DISPONIBILIZASSE. De três ofertas já tinha, em mente, optado por uma. Era na Escola de Artes e Ofícios que ficaria por gosto. Após o 25 de Abril, TUDO se alterou. Os DOCUMENTOS da casa, embora os meus pessoais em meu poder, os OFICIAIS simplesmente me foi dito que NÃO TINHAM VALOR. Tudo foi DESTRUÍDO. Claro que nunca NOS foi devolvido o direito a NADA. HOJE, com a morte de um SER HUMANO, sendo de lamentar, não posso deixar de dizer que ELAS são pagas por NÓS nesta vida, deixando TUDO, partindo sem tudo de que somos DONOS. Mas também agora não posso deixar passar a atitude do PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS em se sentir TRISTE com esta Morte sem NUNCA se ter sentido triste pela PERDA dos bens dos Portugueses que DELA vieram sem os SEUS BENS. A MEMÓRIA não é curta.

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