11 out, 2022 - 11:44 • Beatriz Lopes , Teresa Paula Costa com Lusa
Um total de 47 países exportadores - a nível mundial - recuaram no combate contra a corrupção, incluindo Portugal, nas atividades que as respetivas empresas mantêm no estrangeiro, alertou esta terça-feira a Transparência Internacional.
À escala global registou-se um "declive contínuo" na luta contra irregularidades incluindo o pagamento de subornos nas operações no estrangeiro, de acordo com a organização não-governamental (ONG) com sede da Alemanha.
Na Europa, de acordo com o estudo da ONG, predomina "um panorama sombrio" em países como Portugal, Espanha, Itália e Suécia onde se registou "um abandono brutal" do empenho em relação às medidas de combate a irregularidades.
Nos últimos dois anos estes países (incluindo Portugal) passaram da categoria "aplicação moderada" a "aplicação limitada", de acordo com os padrões estabelecidos pela ONG.
Ouvida pela Renascença, a diretora executiva da Transparência e Integridade diz-se "preocupada" com estas conclusões. Karina Carvalho lembra que "temos uma estratégia nacional anticorrupção, um novo regime geral de prevenção da corrupção e, do ponto de vista legislativo, começamos a ter instrumentos robustos para a prevenção da corrupção", mas "na prática não sabemos ainda qual é o impacto desta nova produção legislativa".
Para Karina Carvalho "esta avaliação é mais um detalhe de que não estamos bem, e o que nós queremos enquanto organização cívica que se dedica à prevenção da corrupção é que Portugal seja um país referência de boas práticas." "Infelizmente não é", remata.
A diretora executiva da Transparência e Integridade defende mais prevenção ao nível das empresas.
"Agora que temos o novo regime geral de prevenção da corrupção seria muito importante que os sistemas de compliance fossem ajustados também à prevenção da corrupção no comércio internacional incluindo explicitamente as medidas e sugestões para que essa prevenção se faça de forma eficaz", referiu Karina Carvalho.
Outros países da União Europeia como Bélgica, Dinamarca, Finlândia ou Luxemburgo mantêm-se na categoria "aplicação inexistente".
Entre os motivos para esta situação, a TI refere que, na "quase totalidade" dos países avaliados, as autoridades policiais ou de investigação contra delitos económicos e financeiros carecem de recursos necessários.
Apesar do impacto provocado pela pandemia de Covid-19, em todos os aspetos, incluindo na luta contra a corrupção, a Transparência Internacional indica que o "declive registado" começou a notar-se antes da crise sanitária refletindo "uma profunda vontade política".
A organização não-governamental que prepara o lançamento do relatório bianual com o título "A Exportação da Corrupção" alerta que se alcançaram níveis semelhantes aos verificados em 2009.
Em 2018, 27% dos países estudados aplicavam de forma ativa a Convenção Anti-Corrupção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), mas entre 2020 e 2022 assistiu-se à redução para 16,5% e 11,8%, respetivamente, o que significa um retrocesso de 56% em quatro anos.
"Os governos enfrentam muitos desafios, desde [o combate] à cleptocracia aos desastres climáticos e ao caos económico", afirma a presidente da Transparência Internacional, Delia Ferrera, em comunicado divulgado esta terça-feira
Mesmo, assim, sublinha Ferrera, os países não devem perder de vista as redes de corrupção transnacionais que fazem aumentar as ameaças e bloqueiam possíveis soluções ao infringir leis, ao afastarem a concorrência sendo que também bloqueiam recursos do erário público.
De acordo com as primeiras conclusões da Transparência Internacional, atualmente apenas dois países - de um total de 47 - se mantêm na lista "implementação ativa" da convenção da OCDE: Estados Unidos e Suíça.
Paradoxalmente, os Estados Unidos e a Suíça encontram-se também no final da tabela em matéria de "transparência financeira".
Sete países, responsáveis por 16,9% das exportações globais incluem-se na categoria "implementação moderada" e 18 Estados que acumulam 15,5% das exportações, aplicam a mesma convenção de forma "limitada".
A Transparência Internacional destaca igualmente que, na atualidade, 55% das exportações mundiais procedem de países que não lutam contra a corrupção das empresas multinacionais.
No caso da República Popular da China, a TI recorda que se trata de um país que não é signatário da convenção da OCDE e que não dispõe de qualquer legislação sobre subornos no estrangeiro.
No mesmo grupo da República Popular da China encontram-se países como o Japão, Índia, México ou Rússia.
Nos últimos dois anos só o Peru e a Letónia intensificaram o combate contra subornos no estrangeiro, de acordo com a Transparência Internacional.
A ONG avisa que a maioria dos grandes exportadores mundiais não dispõe de qualquer tipo de programa de proteção para denúncias sobre alegados delitos de corrupção internacional e recomenda que os governos reforcem "os pontos de debilidade" legislativa e os sistemas de implementação de medidas.
A TI insta também os vários países exportadores a garantir a transparência no que diz respeito à informação relacionada com a luta contra este tipo de corrupção como, por exemplo, a criação de uma base de dados pública de casos assim como pede aos governos medidas para compensação das vítimas destes delitos.
"Chegou o momento de se reconhecerem os direitos das vítimas e o momento para se desenvolverem mecanismos transparentes e capazes de prestarem contas no sentido de serem compensados os prejudicados, incluindo Estados estrangeiros, empresas e populações afetadas pelos subornos", disse Gillian Dell, uma das autoras principais do relatório da Transparência Internacional.
[notícia atualizada às 15h20, com declarações da diretora executiva da Transparência e Integridade]