19 set, 2022 - 20:15 • Maria João Cunha , enviada especial a Londres
Terminou o funeral da Rainha Isabel II e viemos fazer o que os ingleses fazem num feriado nacional e, bom, dias da semana depois das 16h00 também: beber um "pint" (o mesmo é dizer uma cerveja "fora do tamanho", numa tradução literal).
No pub “Princess of Wales”, na zona de Embankment, em Londres, retransmite-se o funeral na televisão. Quase ninguém quer falar, afinal já se beberam uns copos, mas um grupo que abordamos sugere-nos as amigas do lado, são escocesas.
Nicola é a mais jovem. Vive em Cambridge mas é de Glasgow. Aos primeiros três segundos de entrevista já não consegue controlar a emoção de recordar a "mais incrível experiência de sempre".
A mãe Mary vem em socorro da filha, também de copo na mão. Diz que a Rainha é maravilhosa e que nunca haverá ninguém como ela.
A conversa evolui para o óbvio. Mas os escoceses não estão descontentes e não querem independência? A resposta enche o bar, um redondo "noooo" e um sorriso de quem já esperava esta conversa.
Nicola diz que a Rainha Isabel II é a pessoa mais icónica na Escócia e que não foi ao acaso que ela morreu em Balmoral, o castelo de que mais gostava e onde passava boa parte do tempo com os seus cães e a guiar o seu jipe pela propriedade.
Grace interrompe a conversa para pedir mais duas libras para a próxima bebida. E não resiste a juntar-se ao painel de comentadoras.
Todas me juram que a Escócia nunca será independente.
Nicola diz que quando votaram no referendo "garantiram que seria uma só vez". A escocesa é peremptória: não há, por isso, espaço para uma nova oportunidade.
A mãe assegura também que no seu tempo de vida não acontecerá. Nicky corrige e vai mais longe: “ever”. Um rotundo jamais.
E Carlos III? Nicola adora-o. Mas Grace, mais velha, discorda. Nicola defende que o rei deve ter tempo para fazer o luto.
Perguntamos como será Carlos, o rei. Mary acredita que não vai reinar durante muito tempo e que vai abdicar em favor do filho William. Além disso, é divorciado e isso "não é aceitável no Reino Unido". Então, Camila não devia ser rainha consorte?, pergunto. Mary diz que não. Para ela é a vez de William e Kate que, "by the way", são "adoráveis" . E neste ponto todas concordam muito e rasgam ainda mais os sorrisos.
"Toda a gente adora William e Kate. Toda a gente os quer, mas não agora. A economia esta horrível em todo o mundo, mas William vai resolver quando chegar a sua vez", garante Nicky.
E volta a perguntar-me de que país sou. Espanha? É a terceira vez que surge a pergunta e as parceiras de entrevista riem-se da confusão de Nicky. Explico que Portugal não tem monarquia há mais de 100 anos, o que parece absurdo a esta escocesa.
E é então que Grace nos explica que a princesa Diana ensinou os seus filhos a serem mais próximos do povo. "Não digo que Carlos não leve isto em diante. Mas gostavam de começar um trabalho aos 74?", indaga. A pergunta faz ricochete: "gostavam?" "Noooo", riem-se. e o volume do bar ganha mais uns decibéis e umas gargalhadas. "Então está na hora de deixar os mais novos tomar conta da monarquia", diz a muito assertiva Grace.
Enquanto conversamos repetem na televisão os dois minutos de silêncio do funeral - um dos momentos mais impactantes das cerimónias funebres da rainha Isabel II - e só as três escocesas animam o pub nesse momento.
Os cânticos da cerimónia religiosa disputam espaço com as conversas e as bebidas continuam a rodar, enquanto vamos perscrutando o futuro de um reino que ainda se quer unido no fundo de um copo de “pint”.