15 dez, 2022 - 11:41 • Lusa
O Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos apresentou esta quinta-feira um relatório do seu Gabinete documentando o assassínio de, pelo menos, 441 civis na Ucrânia, que podem constituir crimes de guerra dos invasores russos.
O total civis mortos pelas tropas russas inclui 341 homens, 72 mulheres e 28 crianças (20 rapazes e oito raparigas), segundo a mesma fonte.
"Há fortes indícios que as execuções sumárias documentadas no relatório podem constituir homicídios deliberados, um crime de guerra", enfatizou Volker Türk ao apresentar o documento numa sessão especial do Conselho de Direitos Humanos sobre a Ucrânia.
O relatório, que apresenta em detalhe uma centena destes assassínios, foi preparado após três visitas de campo e concentra-se em particular nas violações cometidas entre 24 de fevereiro e 6 de abril em 102 cidades nas regiões de Kiev, Chernigiv e Sumi.
"Em alguns casos, soldados russos executaram civis em locais de detenção improvisados, enquanto em outras ocasiões o fizeram nas suas casas, quintais, portas ou postos de controlo de segurança no terreno", disse o Alto-Comissário.
As execuções foram realizadas mesmo em casos "em que a vítima mostrou claramente que não representava uma ameaça, por exemplo, levantando as mãos", acrescentou.
Türk também indicou que o facto de 88% dos mortos serem homens e rapazes parece indicar que foram desproporcionalmente escolhidos como vítimas com base no seu género.
O Alto-Comissário também denunciou outras violações de direitos humanos por parte das forças russas, como ataques de veículos armados e tanques a prédios residenciais, que causaram mais mortes de civis.
O relatório indica que o local onde a ONU documentou mais assassínios de civis no período estudado foi a cidade de Bucha, nos arredores de Kiev, onde foram comprovadas as execuções de 73 pessoas (54 homens, 16 mulheres e três crianças - dois rapazes e uma rapariga) entre 4 e 30 de março.
"Num trecho de 150 metros na rua Yablunska, em Bucha, 14 civis (incluindo uma rapariga) foram mortos e os seus corpos foram deixados lá", disse Türk.
Além dos mais de 400 assassínios verificados pelo gabinete da ONU, o organismo investiga através de entrevistas com testemunhas e sobreviventes as denúncias de outros 198, incluindo 105 em Bucha, e continuará as suas investigações nas regiões de Kharkiv e Kherson, segundo o Alto-Comissário.
Não apenas as execuções serão investigadas, mas também outras violações relatadas, incluindo prisões arbitrárias, desaparecimentos forçados, tortura, maus-tratos e violência sexual, acrescentou.
O relatório apresentado hoje é paralelo ao elaborado pela própria missão de investigação da ONU para a Ucrânia, composta por três especialistas e que também denunciou indícios de crimes de guerra russos no país vizinho quando apresentou as suas conclusões preliminares em setembro (a ser atualizado em março de 2023).
Türk lembrou que a invasão russa da Ucrânia deixou 18 milhões de pessoas, quase metade da população nacional, com necessidade urgente de ajuda humanitária, enquanto 7,83 milhões de ucranianos fugiram do país e outros 6,5 milhões estão deslocados internamente.
Dez milhões de ucranianos sofrem cortes de energia enquanto a Rússia ataca com mísseis as suas infraestruturas, incluindo centrais elétricas, e outros milhões não têm acesso ao abastecimento de água ou redes de aquecimento, lembrou.
A esses números, o Alto-Comissário acrescentou que 1,5 milhão de crianças ucranianas subsiste "sob risco de depressão, ansiedade, 'stress' pós-traumático e outras condições mentais", depois de viver uma guerra "marcada por graves violações das leis humanitárias e de direitos humanos internacionais".
Türk expressou o desejo de que as violações dos direitos humanos relatadas sejam devidamente investigadas e que os seus autores sejam responsabilizados por um processo legal justo e independente, "garantindo que todas as denúncias de violações, recentes, mas também iniciadas em 2014, sejam investigadas de forma rápida e transparente", afirmou.
No entanto, Türk expressou dúvidas sobre essa possibilidade, uma vez que as autoridades russas ainda não investigaram nenhum dos abusos relatados, enquanto a Ucrânia "enfrenta problemas de recursos e capacidade para fazê-lo".