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Ricardo Trigo: Há zonas de degelo onde "não há nada que a gente já possa fazer"

21 abr, 2023 - 19:25 • Pedro Mesquita com Redação

Por agora avançam alguns projetos-piloto, muito pouco funcionais, em que o CO2 produzido nas fábricas é enviado para debaixo de terra. Mas o especialista indica que a escala é ainda muito reduzida para ter qualquer tipo de impacto.

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Entrevista ao climatologista Ricardo Trigo, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
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As Nações Unidas alertam que os glaciares estão a derreter a uma velocidade dramática, e as alterações climáticas voltaram a atingir níveis recorde. São dados, preocupantes avançados no relatório anual da Organização Meteorológica Mundial que deixa ainda um aviso: "O degelo não pode ser parado, a menos que seja criada uma forma de remover o CO2 da atmosfera".

Que solução artificial poderia ser essa? Foi a questão que a Renascença colocou ao climatologista Ricardo Trigo, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Por agora avançam alguns projetos-piloto, muito pouco funcionais, em que o CO2 produzido nas fábricas é enviado para debaixo de terra. Melhor mesmo, diz, seria "plantar" extensas florestas eletrónicas por todo o planeta.

Os novos dados das Nações Unidas são preocupantes?

Em relação ao àquilo que sabíamos há dez anos, é bastante mais preocupante. Se for em relação ao “State of the art” dos últimos 23 anos, é mais do mesmo. Significa o quê? Significa que grande parte das calotas polares, nomeadamente Gronelândia e parte da Antártida, as taxas de derretimento estão a ser mais elevadas, mais rápidas do que eram há uns anos. Por outro lado, o próprio aquecimento da Terra é muito diferenciado, é muito maior nos polos do que no resto do planeta. Há zonas do Ártico que estão a aquecer quatro vezes mais rápido que o resto do planeta. Ora, se o planeta já aqueceu cerca de 1°, 1° 1,1 1,2 desde o início da revolução industrial, significa que há zonas do Ártico em particular que já aqueceu 5°.

O relatório da Organização Meteorológica Mundial refere, nomeadamente, que o gelo marinho Antártico está no nível mais baixo de sempre e alguns glaciares europeus estão literalmente a derreter a uma velocidade recorde.

É, mas convém não confundir. Todo o gelo que está a flutuar, mesmo que desapareça, não contribui para o aumento do nível médio do mar. É princípio básico de Arquimedes. O que sobe o nível médio do mar, é o gelo que está em Terra e, ao derreter, vai para o mar e faz subir o nível médio do mar.

Nesse sentido, a razão pela qual o mar está a subir cada vez mais rapidamente tem a ver com a expansão térmica. A água aquece, expande, aumenta de volume e tem a ver com a Gronelândia e partes da Antártida estarem a derreter a taxas crescentes.

O nível do mar subir 27 centimetros, para o comum dos cidadãos, parece coisa nenhuma. Mas, isto é uma subida assinalável.

É, porque é da mesma ordem de grandeza do que subiu no último século. As pessoas não podem pensar que estão na praia e omar está sempre com o mesmo nível. Têm de imaginar que as marés, as ondas, as depressões, em cima disso tudo, nas piores situações.

Há uma espécie de obsessão com com o que vai acontecer até ao final do século XXI e não há nada de especial a acontecer em 2100. Muito provavelmente, grande parte do pior do que vai acontecer será nos séculos a seguir e aí estamos a falar de metros que vão subir, porque há zonas, particularmente a Antártida, mas também algumas da Gronelândia que não há nada que a gente já possa fazer.

A menos que seja criada uma forma de remover o CO2 da atmosfera, não será possível travar este avanço. Que forma podia ser essa?

Isso nem é a pergunta de um milhão dólares, é de mil milhões de dólares. Ninguém sabe responder a isso.

Ou seja, não há sequer nenhuma ideia?

Há, mas estão muito Longe de serem funcionais.

Há projetos piloto na Noruega e nos Estados Unidos, de, à saída de fábricas, enviar o seu CO2 produzido para debaixo da Terra e não permitir que acumule mais na atmosfera, mas estamos a falar à escala de um milésimo do que era necessário.

Teria de ser a uma escala muito maior. Tem que ser mesmo uma espécie de árvores eletrónicas aos milhões.

Será sempre uma solução artificial.

Será sempre artifical que, se não se recorrer a formas dessas de remoção ativa, não se vai conseguir lidar com alguns desses problemas mais agressivos.

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