28 jun, 2023 - 22:28 • Pedro Mesquita
O Conselho Europeu, que começa esta quinta-feira, em Bruxelas, deverá ficar sobretudo marcado pela troca de informações, à porta fechada, sobre a tensão na Rússia. Sem surpresa, embora não conste da agenda oficial. É a primeira vez que os líderes da União se reúnem - olhos nos olhos - desde que Prigozhin afrontou Vladimir Putin, e os acontecimentos do último fim de semana ainda não são nada claros.
Os líderes europeus têm almoço marcado com Jens Stoltenberg, o secretário-geral da NATO. E depois, já no Conselho, será de esperar pela partilha de outros detalhes apurados pelos serviços de informação ocidentais. Dados relevantes para a tomada de decisões, neste quadro suplementar de incerteza. É esta a expectativa do eurodeputado Paulo Rangel.
"Vai haver certamente um conjunto de diligências, que não vão ser públicas, no sentido de perceber como reforçar a segurança da União Europeia num contexto em que a incerteza e os riscos aumentaram gravemente nos últimos dias”, afirma o social-democrata.
É preciso saber antecipadamente o que fazer, por exemplo, se Putin elevar a guerra na Ucrânia ao patamar do nuclear, lembra Paulo Rangel.
“Se houver um ataque à central nuclear de Zaporizhzhia, com efeitos tipo Chernobyl, isto deve ser visto como um ataque apenas à Ucrânia? É uma questão que se põe. Há notícia do estacionamento de um grupo de mercenários como na Bielorrússia. Ora, Vilnius - a capital da Lituânia - está juntinho à fronteira da Bielorrússia e nós vamos ter uma cimeira da NATO de alto nível em Vilnius. Para mim, este vai ser o tema do Conselho Europeu.”
Mas há outro tema forte, em carteira, capaz de prolongar o debate já esta quinta-feira, e dificultar a aprovação das conclusões finais do Conselho Europeu: as migrações.
As clivagens são fortes sobre o assunto, na União Europeia, apesar do acordo de princípio sobre as políticas de asilo.
Sabe-se, agora, que há um grupo de 12 países europeus que defendem a adoção de “soluções inovadoras” para os candidatos a asilo. Os detalhes da proposta ainda não se conhecem, mas ao que a Renascença apurou, Portugal é um dos países a quem a ideia não agrada. E, depois, há alguns Estados que defendem o financiamento europeu para a construção de muros.
Na leitura do socialista Pedro Silva Pereira, vice-presidente do Parlamento Europeu, a resposta-chave deve ser “partilha”, e não “barreiras”.
“A partilha deve incluir a disponibilidade dos países, mesmo que não estejam na linha da frente, para acolhem refugiados. Quando isso não é possível, ou não corresponde à política interna de alguns Estados, eles têm que assumir também uma quota-parte da responsabilidade, que pode ter um conteúdo financeiro. É isso que consta do acordo sobre asilo. Agora, o outro problema que se discute é se o rigor nas fronteiras, traduzido em infraestruturas como muros ou vedações, deve ser financiado com fundos europeus. Nesse ponto, a presidente da Comissão Europeia tem sido muito clara a dizer que não e, portanto, o financiamento de muros, ao estilo Trump, não é uma política europeia, portanto, não deve ser financiado com fundos europeus”, diz Pedro Silva Pereira.
O social-democrata Paulo Rangel também rejeita, por regra, o financiamento europeu para a construção de muros, mas recorda a tragédia - há um ano – em Ceuta e Melilla, para acusar os socialistas de apostarem na demagogia.
“Nós somos contra os muros e somos, até, contra o financiamento europeu dos muros. Mas isto não quer dizer que, numa situação ou noutra, muito pontual, e eu estou a pensar em Ceuta e Melilla, por exemplo, onde houve um massacre de pessoas há um ano atrás, feito por ordem do senhor Sanches que é, ao contrário do que dizem em Portugal, ainda hoje, o socialista mais importante na União Europeia, juntamente com Olaf Scholz. Sinceramente, eu acho que não podemos vir com demagogias.”
Será ainda de admitir que neste Conselho Europeu se fale de taxas de juro, dado que a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, continua a apontar para cima.
Há países mais sensíveis do que outros nesta matéria, reconhece o socialista Pedro Silva Pereira. Apesar da independência do BCE, está a intensificar-se, diz, a pressão para que seja quebrada a espiral de subida do preço do dinheiro.
“Eu penso que essa pressão vai ser cada vez maior. As evidências mostram que, por um lado, as causas da inflação não estão tanto relacionadas com as dinâmicas da procura da economia, como é normal. E, por outro lado, também com os próprios indicadores de inflação.”
Pelo sim, pelo não, Lagarde procura jogar pelo seguro, mas não há mal que sempre dure, acrescenta Pedro Silva Pereira: “O Banco Central Europeu foi muito criticado por alguns, no setor financeiro, por ter mantido uma política expansionista até relativamente tarde. E agora não quer abandonar a política restritiva de demasiado cedo. E, portanto, quer ter informações absolutamente seguras de que a inflação está numa trajetória convergente com as metas que têm que cumprir. Acho que é sobretudo essa a preocupação que tem dominado, mas não há mal que sempre dure”.
Independentemente das pressões, Paulo Rangel não acredita que deste Conselho Europeu saiam recados para Lagarde, apesar de também ele considerar que já era tempo de acabar com a subida de juros.
“Penso que os passos que foram dados porventura já serão mais do que suficientes. Não era preciso mais. Agora, há uma coisa que eu tenho a certeza: justamente porque o Banco Central Europeu goza de uma Independência total, os países que rejeitam uma inflexão nessa política de subida ainda possível dos juros, vão invocar a Independência para dizer que nada se pode fazer. Portanto, as pressões não vão ter resultado."
Segurança e defesa, bem como a política europeia das migrações serão estes, como se percebe os temas fortes do Conselho Europeu, que também vai abordar o relacionamento estratégico com a China.