27 out, 2023 - 15:20 • Redação
Pode estar prestes a surgir uma nova forma de tratar a dependência da cocaína e do seu derivativo, o crack: uma vacina. Um grupo de cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no Brasil, está a desenvolver o novo tratamento, e já venceu um prémio pelo projeto.
Chamada "Calixcoca", a vacina está a mostrar resultados promissores na fase de ensaios em animais. O tratamento despoleta uma resposta imunitária que impede a cocaína e o crack de chegar ao cérebro, o que os investigadores esperam que ajude os consumidores destas drogas a quebrar o ciclo da dependência.
Se o tratamento for aprovado, será a primeira vez que é a possível tratar a dependência de cocaína com uma vacina, disse o psiquiatra Frederico Garcia, coordenador da equipa de cientistas que está a desenvolver o tratamento na Universidade Federal de Minas Gerais.
O projeto foi recentemente premiado nos prémios europeus de inovação na saúde para a medicina latino-americana. O prémio foi de 500 mil euros.
A vacina funciona como muitas outras: ativa o sistema imunitário de quem a recebe, o que faz o corpo produzir anticorpos que se ligam às moléculas de cocaína na corrente sanguínea. Isso torna-as demasiado grandes para entrar na via mesolímbica - também conhecida por "centro de recompensa" -, onde a droga estimula a criação de níveis altos de dopamina.
Já foram levados a cabo alguns estudos semelhantes nos Estados Unidos - o maior consumidor de cocaína do mundo, de acordo com as Nações Unidas. Mas estes estudos foram interrompidos quando os ensaios clínicos não conseguiram demonstrar resultados suficientes, de acordo com Frederico Garcia.
A Calixcoca, por sua vez, já se tem provado eficaz nos ensaios em animais, produzindo níveis significativos de anticorpos contra a cocaína, ao mesmo tempo que resulta em poucos efeitos secundários.
A vacina também protegeu os fetos contra a cocaína, o que sugere que também pode ser usada para proteger os bebés de toxicodependentes grávidas.
A vacina deve agora chegar à última fase de ensaios clínicos, os testes em seres humanos.
"Não há um tratamento específico registado para a dependência de cocaína e crack. Atualmente utilizamos uma combinação de acompanhamento psicológico, assistência social e reabilitação quando necessária", disse Frederico Garcia.
A Calixcoca pode acrescentar uma ferramenta importante ao atual regime, ajudando os pacientes em fases críticas da recuperação, como à saída da reabilitação.
A vacina é ainda composta por químicos desenhados em laboratório, em vez de ingredientes biológicos. Essa diferença significa que a produção da Calixcoca seria menos cara do que outras vacinas, e que esta não teria que ser armazenada a baixas temperaturas - algo que complica a cadeia de distribuição em muitos países.
Mas esta vacina não vai ser uma "panaceia" que pode ser administrada a qualquer um, disse Garcia. Segundo o responsável, o grupo-alvo exato vai depender do resultado dos ensaios clínicos mas, teoricamente, o tratamento será dirigido a toxicodependentes em recuperação "que não estão a usar a droga e querem permanecer assim".