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Marc Roche

Salgado "ameaça entrar para o Panteão dos grandes crimes" da finança

05 mar, 2015 - 15:51 • João Carlos Malta

Há banqueiros elegantes que são "gangsters". É o que defende Marc Roche, jornalista especialista em mercados financeiros. A edição portuguesa do seu novo livro, "Banksters", põe Salgado na mira: caso BES é comparável ao que envolveu Madoff.

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"Insuspeitável, o oligarca português imaginou-se acima das leis e das regras". "Aquele a quem chamavam 'o Dono Disto Tudo' manobrava na retaguarda graças à sua habilidade e enorme lista de contactos. É Marc Roche, correspondente na "City", o centro financeiro de Londres, de vários jornais com o "Le Monde", o "Le Point" ou o "Le Soir" sobre Ricardo Salgado.

O líder do clã Espírito Santo ameaça entrar para o "Panteão dos grandes crimes cometidos por corruptos da finança", em que pontificam nomes como Bernard Madoff, escreve Roche no livro "Banksters", editado em Portugal em Fevereiro.

"Banksters" (uma contracção entre "bankers", banqueiros, e "gangsters") é o novo livro do autor de "O Banco - Como a Goldman Sachs Dirige o Mundo".

Marc Roche decidiu incluir para o mercado português um capítulo sobre o escândalo no BES sob o título: "Até o Espírito Santo precisa de ser controlado".

O jornalista francês, que estará em Lisboa na próxima semana a convite da editora Esfera dos Livros, crê que a "desgraça do BES" é uma síntese de "Banksters" e em si justifica o título do livro.

O grupo português é um caso que exemplifica "como os meios financeiros canibalizaram a política, com todos os conflitos de interesse daí decorrentes". "Voltam a deparar-se-nos ligações tóxicas entre a finança e política".

Fuld, Goodwin, Prot, Salgado
Referindo-se às irregularidades cometidas pela administração do BES, diz que há um sentimento que é transversal a todos os "banksters": a impunidade.

O Roche compara Salgado aos protagonistas de outros grandes escândalos financeiros dos últimos 15 anos: Dick Fuld (Lehman Brothers), Fred Goodwin (Royal Bank of Scotland), ou Baudouin Prot (BNP Paribas).

"Ricardo Salgado e os seus prejudicaram todo o crédito readquirido por Portugal junto dos mercados financeiros desde o seu resgate pela troika… após três anos de sacrifícios", refere.

A revolta dos pequenos investidores do BES também não é esquecida, mas Marc Roche pensa que está "condenada a não ter consequências".

Porquê? "O poder desta rede de influências junto dos governos não tem quaisquer contrapesos que lhe sirvam de compensação. Os novos actores, como as ONG [organizações não governamentais], os jornalistas financeiros ou as associações de pequenos accionistas não dispõem dos meios suficientes para sequer arranhar esse duopólio política-finança", responde.

Por que não se demitiu Carlos Costa?
Em "Banksters" há ainda um olhar sobre a regulação e uma crítica feroz ao Banco de Portugal, "que é suposto controlar as empresas financeiras do país", mas que "não se apercebeu de nada de especial".

O caso, segundo Roche, levanta sombras sobre a supervisão bancária nacional. O jornalista pergunta se o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, não se devia ter demitido. Questão a que responde com uma generalização que advém de outros casos.

"A crise financeira dos 'subprimes', bem como a tempestade da crise do euro, demostraram que os supervisores acabam sempre por se safar". E continua: "Se a maioria dos banqueiros implicados nos escândalos perdeu o seu emprego (para depois se reciclarem na área da finança), nada disso aconteceu aos altos funcionários encarregados da regulação".

"Pouco falta para se dizer que foram eles que salvaram a economia europeia", remata.

Em relação às consequências judiciais, que esta quinta-feira, tiveram os primeiros passos (com o envio da auditoria forense ao BES para a Procuradoria-Geral da República), Marc Roche repete: a impunidade é o sentimento dominante entre os "banksters".

Sentem-se intocáveis, "mesmo quando a linha vermelha é alegremente ultrapassada para aumentar o seu prémio de fim do ano" .

Uma ilusão "elegante em excesso"
O autor enquadra a introdução que destinou a edição portuguesa de "Banksters" com um episódio em que conheceu um responsável pelo BES em Londres.

Descreve-o como alguém com um "francês impecável", "urbano, sedutor" e com "um fato quase elegante em excesso". "Convincente", em resumo.

Na breve conversa, este gestor, a rondar os 50 anos, teceu loas ao BES e à capacidade de gestão do clã familiar. Ficou marcado novo encontro entre os dois. Os factos que precipitaram a queda do BES levaram a que o encontro nunca acontecesse.

"O cenário pintado pelo meu interlocutor não passava de uma ilusão… O Espírito Santo ruiu como um castelo de cartas", escreve Roche.

O BES simboliza no "corpo, na alma e no resto" os disfuncionamentos de uma finança que, não obstante a nova arquitectura mundial de gestão, "é uma verdadeira bomba-relógio", conclui.

"Nesta superprodução lusitana digna de Hollywood, que tem por quadro não apenas Portugal, mas a Espanha, Angola, Suíça, Estados Unidos (Miami), Panamá, Dubai, Luxemburgo, Moçambique e o Brasil, o papel central é desempenhado por 'Banksters'". 
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