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Eutanásia. “Sem o sofrimento e a dor, as pessoas querem viver"

08 fev, 2016 - 10:36 • Cristina Branco

Foi a explicação mais ouvida pela Renascença, em reportagem nos cuidados paliativos do IPO do Porto sobre o desejo de morte: com a dor minimizada, “as pessoas querem viver”. Na unidade, a morte é um tema sempre presente.

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“Quando as pessoas dizem 'eu preferia morrer', fazem-no porque estão num sofrimento muito grande”. As palavras são da enfermeira Margarida Alvarenga, da unidade de cuidados paliativos do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto e a explicação é repetida à reportagem da Renascença por diferentes profissionais da unidade

A vontade de viver até que a natureza o permita vence, em muitos casos, aos primeiros sinais de alívio: “Quando as pessoas estão num sofrimento grande, como dores ou falta de ar, é difícil viver assim. Se tiverem uma equipa de saúde que consiga olhar para a pessoa - é mais importante olhar para a pessoa do que olhar para a doença – e perceber de que forma a podemos ajudar a viver o tempo de vida que tem destinado da melhor maneira possível, as pessoas continuam a querer viver”, conta a enfermeira.

A proximidade da morte faz, em muitos casos, repensar a vida e refazer convicções. Susana Moutinho, psicóloga da unidade de paliativos do IPO do Porto, guarda um exemplo claro de um doente que acompanhou: “Era um doente que até fazia parte de uma comissão sobre eutanásia e ele, de facto, em fim de vida, queria viver. E disse-me que escreveu tantas coisas sobre esta temática, mas, confrontando-se com a realidade da sua vida e da morte, ele queria viver.”

Esta especialista em intervenção psicológica em fim de vida afirma que se trata de uma fase em que muitos doentes se reconciliam com a própria vida. “Os doentes falam muito sobre a morte, e a maior parte fala sobre o sofrimento. E o grande medo é o sofrimento. Mas, quando o sofrimento físico está colmatado ou minimizado, as pessoas têm uma melhor qualidade de vida, conseguem ter dignidade no fim de vida, conseguem resolver assuntos pendentes e dar sentido à sua vida. No fundo, deixar um legado, muitas vezes me falam sobre isso”, conta Susana Moutinho.

Esta ideia é também sublinhada pela enfermeira Margarida Alvarenga: os doentes "aprendem" que a vida tem um tempo e muitos querem respeitar esse tempo. “A última fase da vida é a última etapa do crescimento. E, muitas vezes, as pessoas, aqui, fazem coisas que achariam que tinham muito tempo para fazer, mas que, infelizmente, por estarem doentes, têm a noção de que esse grande tempo não existirá e fazem coisas que queriam muito fazer num espaço mais curto de vida”, conta.

E a esperança? Mesmo para quem está nesta fase da vida, é possível manter a esperança, afirma a psicóloga Susana Moutinho. “A esperança de um dia sem dores, a esperança de um dia em que vem a família que está em França vê-los”, exemplifica. Não é uma esperança,” irrealista”, sublinha a especialista, é uma esperança “realista”.

“É uma esperança para aquele dia. Houve pessoas aqui que, no fim de vida, se casaram, que fizeram o baptizado dos filhos, cumpriram objectivos de vida que são, nesta fase, mais difíceis de realizar, mas que foram realizados. As pessoas estão em fim de vida, mas estão vivas. As pessoas estão vivas até morrerem", relata.

Dar qualidade de vida, não prolongar a vida

Há estudos que comprovam que uma rede de cuidados paliativos sólida é decisiva: não para prolongar a vida, mas para dar uma melhor qualidade de vida. É também esta a tese defendida pelo director da unidade de cuidados paliativos do IPO do Porto, José Ferraz.

”O que já se verificou em estudos feitos é que a intervenção atempada dos cuidados paliativos tem um impacto grande no bem-estar das pessoas, mas também, sendo recurso antecipado numa fase mais precoce, as pessoas vivem mais e com tratamentos menos agressivos”, indica o médico.

José Ferraz aponta como fundamental permitir que os doentes “vivam o melhor possível no tempo que lhes resta de vida, seja lá esse tempo qual for”. É evidente que estes doentes têm uma doença grave, afirma José Ferraz, e “que nesta fase, o nosso objectivo não pode ser a cura da doença”, mas “há muito que ainda se pode fazer pelo bem-estar destas pessoas”, conclui.

A frase é batida, mas há lugares onde se aprende que vale a pena repeti-la: viver um dia de cada vez, viver o hoje, sublinha a enfermeira Margarida Alvarenga.

“Aprendemos a valorizar a vida, aprendemos a perceber que o nosso tempo não é eterno. E, quando consciencializamos que temos doentes, pessoas muitas vezes com a nossa idade ou, até, mais novas, cuja vida vai acabar, e a forma como eles lutam e vivem esses dias de vida, é um bom ensinamento para todos nós. Para relativizarmos muitas coisas que, às vezes, valorizamos em excesso e que, se calhar, não têm assim tanta importância como isso. Aprendemos a viver um dia de cada vez. O viver é hoje, não é amanhã, porque o amanhã pode não existir”, diz a enfermeira Alvarenga, há 22 anos nos cuidados paliativos do IPO do Porto, um espaço afastado do edifício principal, mais tranquilo, sem o movimento habitual de um hospital. São 40 camas, número insuficiente para as necessidades.

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  • Alberto Pomar Freire
    15 fev, 2016 Lisboa 18:42
    Meu pai já tinha mais de 70 anos quando lhe foi diagnosticado um carcinoma nas vias urinárias o qual se foi espalhando por todo o corpo. Faleceu em casa rodeado de carinho e do amor de minha mãe. Nunca a hipótese de abreviar a morte passou pela cabeça de meu pai. Foram os cuidados e o carinho e o amor de minha mãe que lhe deram toda aquela vontade de viver e de lutar contra a doença. O amor que meus pais tinham um pelo outro foi para mim uma enorme norma de vida e me leva a não apoiar a eutanásia. Os nossos doentes precisam de cuidados médicos, carinho e muito amor. Não precisam que os matem.
  • João Lopes
    09 fev, 2016 Viseu 07:58
    Morte digna? «Reivindicar o direito ao aborto, ao infanticídio, à eutanásia, e reconhecê-lo legalmente, equivale a atribuir à liberdade humana um significado perverso e iníquo: o significado de um poder absoluto sobre os outros e contra os outros. Mas isto é a morte da verdadeira liberdade»: palavras sábias e humanas de João Paulo II.
  • Mafurra
    08 fev, 2016 Lisboa 17:53
    Nem mais ! Para sofrimento já bastam as dores que a saúde ou outros homens provocam. Acho inconcebível que Deus queira que algum de nós sofra. Não seria o tal ser infinitamente bom, mas sim um sádico.
  • Nelson JP
    08 fev, 2016 Leiria 17:32
    Pois eu também tenho a minha opinião pessoal, anti-eutanásia, mas assim como aqueles que a defendem acham ser um direito seu, eu também vou ter que ter o direito de saber quem são os médicos que estão dispostos a renunciar ao seu juramento de defender a vida. Ou seja, por causa de futura aprovação desta lei, que vai acontecer, os precedentes que se abrem colocam em risco toda a gente. Como noutros países onde já está aprovado e que os mais idosos têm pavor de ir para o hospital, por que na maioria das vezes não saiem de lá com vida... Eu acho que se as pessoas querem morrer terão de se precaver enquanto têm saúde e condições para poderem colocar fim à sua vida pelos próprios meios. A ninguém pode ser dado do direito de tirar a vida a outro, ainda que ele o peça.
  • Daniel
    08 fev, 2016 Lisboa 17:14
    Conto a história do meu avô materno e do meu avô paterno. O meu avô materno há anos que lutava contra problemas no fígado, e há muito que queria por termo a tudo. As dores eram minimizadas e mesmo assim ele estava cansado (sobrevivera a um cancro que os médicos faziam prognóstico de pouco mais de 6 meses de vida, entrou em remissão e viveu mais 12 anos). Houve uma crise na família e o meu avô decidiu por de lado a vontade de falecer por uns tempos, até as coisas estarem resolvidas (e como eu disse, a dor foi sempre minimizada), e quando finalmente ficaram resolvidas ele simplesmente deixou de tomar os medicamentos, tendo falecido uma semana depois. Quanto ao meu avô paterno, ele teve diversos AVC's que o deixaram num estado de confusão enorme a maior parte do tempo, mas nas alturas em que recuperava a lucidez ele próprio queria que tudo acabasse... esperou para ver o primeiro bisneto como prometido, mas não mais. Eu durante muito tempo estive em luta contra mim mesmo, a minha vontade de querer manter o meu avó a todo custo versus o sofrimento do meu avô e o quanto eu o compreendia... eu duvido que para todas as pessoas que sofrem as coisas se resolvem com mais analgésicos, como foi o caso dos meus avós... nem todo o sofrimento é mensurável em dor física, há um desgaste enorme para a pessoa. Os cuidados paliativos são excelentes e humanos mas não são solução, são um remediar de uma situação, tal como a eutanásia. Deve de ser tudo ponderado, mas no final é uma decisão pessoal.
  • Rui Faria
    08 fev, 2016 Porto 17:14
    É sem dúvida um assunto pertinente mas num país em constante ameaça de "banca rota" este partido em nada contribui para a resolução económica dos problemas, só se preocupando com temas mediáticos e que abafam a incapacidade do partido e das suas gentes em resolver os problemas mais prementes.
  • fanã
    08 fev, 2016 aveiro 16:19
    Este.. " tema"... mil vezes debatido, mediatizado, analisado, comentado. Revela, cada vez que é lançado, a mesma e grande complexidade. Cada pessoa demonstra, não a "solução", mas sim a simples opinião pessoal .... No fundo o que interessa, é se é legitimo ou não para quem sofre sem perspectivas de recuperação, de poder decidir de por fim a um sofrimento pessoal e indirectamente dos familiares e próximos, quando a lenta degradação do nosso ser oferece, aos olhos de todos um insustentável espectáculo de dor e sofrimento, e que nenhuma terapêutica pode actuar para devolver ou manter uma imagem digna da nossa pessoa. Além do sofrimento físico , é o sofrimento psicológico que se acresce, em que os minutos parecem horas, horas dias, dias anos. Pessoalmente não quero, nestas situações extremas ser sedatado e analgesiado, ao ponto de não poder decidir de morrer com a dignidade a qual tenho direito!....
  • Maria Meireles
    08 fev, 2016 Valongo 12:27
    "...A vontade de viver até que a natureza o permita vence." ; "...verificou em estudos feitos é que a intervenção atempada dos cuidados paliativos tem um impacto grande no bem-estar das pessoas." e ..."Dar qualidade de vida."
  • lua
    08 fev, 2016 ovar 11:30
    SIM ! DEIXEI-NOS MORRER EM PAZ. NÃO SOMOS vegetais! Quando o sofrimento e a doença nos minam, deixem-nos ir sem mais sofrimento. O livre arbítrio é o que nos distingue. Devemos ainda com saúde escolher, se nos encontrar-mos em situação de legume e quisermos por fim a esse estado vegetal. SIM QUE SEJA BEM VINDA A EUTANÁSIA , é o que QUERO PARA MIM.

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