21 jun, 2016 - 21:03 • Filipe d'Avillez
A Associação dos Juristas Católicos (AJC) divulgou esta terça-feira um comunicado em que saúda o veto de Marcelo Rebelo de Sousa às “barrigas de aluguer” e volta a chamar atenção para alguns dos perigos desta prática.
O Presidente da República vetou a lei proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada com votos favoráveis do PS e de uma facção do PSD. O PCP votou contra. Marcelo pediu que o Parlamento voltasse a discutir a lei e tivesse em consideração algumas das recomendações que tinham sido feitas, por exemplo pela Comissão de Ética para as Ciências da Vida.
A AJC elogia a tomada de posição de Marcelo e alerta para o perigo da “coisificação” da criança, que diz decorrer da prática da gestação de substituição. “Como vem sendo sucessivamente afirmado por pessoas de vários quadrantes ideológicos, a maternidade de substituição representa sempre a ‘coisificação’ da criança e da mulher gestante, reduzidas a objecto de um contrato – daí a expressão ‘barrigas de aluguer’. Por isso, é uma prática intrinsecamente contrária à dignidade humana (e, assim, contrária ao disposto no artigo 67.º, n. 2, e), da Constituição) e nenhum enquadramento jurídico poderá obviar a isso”, dizem os juristas católicos.
A AJC acrescenta que “os problemas que pode suscitar nunca serão resolvidos de forma satisfatória e só a sua proibição em qualquer caso os afasta”, apontando ainda como exemplo as dificuldades suscitadas pela mudança de opinião da grávida, que “frusta, por um lado, as expectativas do casal beneficiário e não se coaduna com a vinculação própria do contrato. Mas, por outro lado, justifica-se tal possibilidade (e porquê limitá-la no tempo?), para evitar o trauma que representa uma imposição de abandono da criança com quem a gestante (a mãe, verdadeiramente) criou laços psicológicos e afectivos tão intensos.”
Outro cenário é dos problemas gerados por crianças com deficiência. “Levando às últimas consequências a lógica da ‘coisificação’ do filho assim ‘encomendado’, são conhecidos casos de recusa, pelo casal beneficiário, da criança recém-nascida portadora de deficiência, ou de exigência de prática de aborto do feto portador de deficiência. Mas ainda que estas situações sejam proibidas, é muito provável que elas surjam à margem da lei, de modo dificilmente controlável, porque se situam em coerência com a lógica de instrumentalização que preside ao contrato.”
O Parlamento irá agora reavaliar a lei e votar uma nova versão que será então enviada novamente para Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente terá então a possibilidade de renovar o veto – partindo do princípio que o Parlamento não se limita a confirmar a lei anterior – e/ou enviar o diploma para o Tribunal Constitucional.