27 set, 2016 - 08:02
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A falta de uma lei específica pode pôr em causa o processo judicial relativo ao caso de legionella que afectou mais de 400 pessoas em Vila Franca de Xira.
O “Diário de Notícias” teve acesso ao relatório final de investigação da Polícia Judiciária, segundo o qual os principais suspeitos podem não ser acusados do “crime de poluição”, mas apenas de infracções de regras e dano em instalações.
Se, no primeiro caso, a lei prevê pena até seis anos de prisão, no segundo a sentença fica-se pelos três anos de prisão, no máximo, ou pena de multa.
Segundo o relatório da judiciária, a disseminação da bactéria através das torres de refrigeração industrial, "mesmo causando perigo para a vida ou integridade física", poderá "não constituir crime de poluição com perigo comum", uma vez que não existe legislação específica – apenas recomendações, uma espécie de manual de boas práticas, sem força de lei.
Em Portugal, diz o relatório, "a monitorização das concentrações da bactéria legionella não se encontra contemplada na legislação específica para a actividade industrial”.
O surto, conclui assim a PJ, foi um conjunto de infelizes omissões coincidentes no tempo com terríveis consequências para centenas de pessoas.
A Adubos de Portugal e a General Electric, que tinha a função de monitorizar as torres, são arguidas no processo, mas, perante tal lacuna legal, fica agora por se saber se serão acusadas.
A decisão cabe ao Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa (DIAP).
Indemnização deverá ser sempre devida
Em declarações à Renascença, o presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira não se mostra surpreendido com as conclusões do relatório da Polícia Judiciária, mas sublinha que os direitos das vítimas têm de ser salvaguardados.
“Não me surpreende, na medida em que o que temos sempre vindo a dizer desde que o surto apareceu é que deveríamos aproveitar esta fatalidade para alterar a lei para que a mesma possa evitar situações futuras”, começa por dizer.
“De qualquer modo, na minha opinião, isso não é factor para que as pessoas que foram vítimas, algumas mortais, e as suas famílias não sejam indemnizadas”, adianta.
Alberto Mesquita destaca ainda que “não é por uma lacuna da lei que as empresas não têm de fazer aquilo que lhes é exigível que façam”, como “a manutenção, monitorização dos seus equipamentos para que se evite estas situações de poluição”.
Além disso, acrescenta, o Estado tem que produzir legislação específica para fiscalizar as empresas e monitorizar a bactéria – “como, aliás, Espanha fez na sequência de problemas que aconteceram”.
“Quanto mais a lei for permissiva, mais dificuldade esta fiscalização de poderá fazer com a eficácia necessária”, sublinha o autarca.
O caso de legionella em Vila Franca de Xira remonta a 2014. Doze pessoas morreram e 375 foram infectadas pelo surto de legionella em Vila Franca de Xira.
De acordo com o balanço feito na altura, as vítimas mortais tinham entre 43 e 89 anos e a taxa de letalidade foi de 3,2%.
O caso, com início a 7 de Novembro, constituiu o terceiro surto com mais vítimas em todo o mundo e foi controlado em duas semanas.
Passado um ano, tinham dado entrada no Ministério Público 211 queixas de lesados directos e de familiares das vítimas.
A doença do legionário é provocada pela bactéria 'legionella pneumophila' e contrai-se por inalação de gotículas de vapor de água contaminada de dimensões tão pequenas (aerossóis) que transportam a bactéria para os pulmões, depositando-a nos alvéolos pulmonares.
[Notícia actualizada às 10h20]