09 jan, 2017 - 09:56
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Mário Soares “foi um homem corajoso, que lutou pela democracia e pela liberdade em Portugal”, afirma Rui Machete, várias vezes ministro pelo PSD e vice-primeiro-ministro do governo de bloco central liderado por Soares.
“Uns gostam mais dele, outros menos. Foi meu adversário político, como de outros militantes do PSD, mas há que reconhecer as suas qualidades, a sua lucidez, a sua cultura, a sua boa disposição e a sua coragem”, começou por dizer na Renascença.
Mário Soares não foi o único a lutar pela liberdade e a democracia, reconhece o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, “mas ele foi das figuras verdadeiramente importante”.
Convidado do programa Carla Rocha – Manhã da Renascença, dedicado às cerimónias fúnebres do antigo chefe de Estado, que morreu no sábado aos 92 anos, Rui Machete lembrou a determinação do fundador do PS depois da derrota socialista nas legislativas de 1985, quando Cavaco Silva chegou a primeiro-ministro.
“No dia 6 de Outubro de 1985, tive de ir à residência do primeiro-ministro e até evitei referir-me ao problema – a derrota do Dr. Almeida Santos foi muito pesada para um político brilhante e experiente. Mas ele puxou a conversa e eu disse que tinha sido uma grande derrota para o Dr. Almeida Santos”, recorda.
“Uma grande derrota para o Dr. Almeida Santos? Foi uma grande derrota para mim! Mas eu não vou desistir”, afirmou Mário Soares.
“Na altura, tinha 7% nas sondagens para concorrer à Presidência da República”, destaca Rui Machete, segundo o qual até a mulher, Maria de Jesus Barroso, para quem “já era tempo de ir para casa cuidar dos netos, dizia ‘agora tu não desistes’. Não desistiu e ganhou as eleições”.
“Isso mostra a resiliência do político, a perseverança e a coragem”, resume o social-democrata.
Estas eleições deram início a 10 anos de Soares no Palácio de Belém.
“Foi um bom primeiro-ministro”
Rui Machete foi ministro no governo do bloco central liderado por Mário Soares, entre 1983 e 85, onde chegou a ser vice-primeiro-ministro. Recorda um homem equilibrado.
“Ele foi um bom primeiro-ministro. Era um homem equilibrado, no sentido de que não distinguia entre os ministros socialistas e os do Partido Social-democrata. Liderou com grande imparcialidade em que as pessoas se sentiam confortáveis em serem ministros”, considera.
Apesar de “uma ou outra divergência”, Machete diz que sempre se deram “muito bem nessa fase”.
“Foi um Governo bastante coeso e que enfrentou um período muito difícil, de austeridade bastante séria”, acrescenta, lembrando que foram as medidas de austeridade aplicadas nessa altura que custaram as eleições seguintes ao PS.
“Um social-democrata a fazer política”
Há quem acuse Mário Soares de ter metido o socialismo na gaveta. Rui Machete discorda – “acho que isso não aconteceu propriamente” – mas considera que o fundador do PS “foi um social-democrata a fazer política”.
Mas foi antes, nos quentes anos 70, que Rui Machete considera que a acção política de Mário Soares foi “mais relevante”, nomeadamente enquanto secretário-geral do Partido Socialista.
“Estivemos à beira de uma ditadura de esquerda, de acentuação comunista e até à beira de uma guerra civil. E ele foi, inegavelmente, uma das figuras mais relevantes para que isso fosse evitado e para que a democracia se estabilizasse em Portugal”, defende o ex-ministro na Renascença.
Na fase final da sua vida, “liberto das responsabilidades governativas”, Mário Soares ter-se-á sentido “mais liberto” para “fazer o gosto ao dedo no sentido ideológico”.
A eurodeputada Ana Gomes considera mesmo que Mário Soares abriu caminho à actual solução governativa de convergência à esquerda.