13 fev, 2017 - 18:50 • Susana Madureira Martins
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Numa espécie de habitual canto da sereia, a ver o que dá, o procurador do Ministério Público José Espada Niza avisou: os arguidos que quiserem colaborar serão compensados pelo direito premial. Manuel Jarmela Palos, ex-director nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF,) foi o único que aceitou falar já esta segunda-feira, primeiro dia de julgamento. O juiz-presidente, Francisco Henriques, perguntou e ele disse que sim, “disponível”.
Sentado e de microfone à frente, Manuel Jarmela Palos agarrou no papel e começou a ler uma declaração de inocência. Alto! Nem pensar, disse o juiz-presidente: “Ler uma declaração não. Pode consultar elementos, agora vir para aqui recitar declarações escritas é que não; isto quer-se uma certa espontaneidade.” Palos agradeceu a oportunidade de poder falar e arrancou para uma conversa com os juízes sobre o que considera ser “a verdade dos factos”.
O ex-director nacional do SEF declarou-se inocente de todas as acusações, garante que não despachou com maior celeridade as autorizações de residência que constam deste processo face a outras autorizações.
Então, agora, sobre a relação com António Figueiredo, outro dos arguidos e ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado (IRN)? “Nunca fui a casa dele”, garante Palos, “almocei uma vez sozinho com ele”. E continuou o cruzamento de relações sobre quem se dá com quem, como conheceu e quando.
Miguel, divorciado, advogado, natural de Braga
“Sou da freguesia da Sé”, disse Miguel Macedo ao juiz-presidente. Estado civil? “Divorciado”. Deu o nome do pai e da mãe e, quando lhe foi perguntado, declarou que não quer prestar declarações ao tribunal e que só o fará “quando forem apresentados os factos” pela acusação. E mais nada disse o ex-ministro da Administração Interna, que se demitiu do cargo na sequência deste processo dos vistos dourados.
Castanheira Neves, advogado que defende Macedo, garante que o arguido “não actuou contra o direito” e que “os crimes que lhe são imputados não se verificaram”. O ex-ministro estava dispensado pelo juiz, mas manteve-se sentado toda a sessão ao lado de Lalanda e Castro, outro dos arguidos, a ouvir a prestação de Manuel Jarmela Palos.
As bruxas de Salem
O que tem a ver o processo dos vistos dourados com o processo do século XVII no Estado norte-americano de Massachusetts que condenou mulheres de Salem por bruxaria? Para Saragoça da Matta tem tudo.
O advogado representa o empresário Lalanda e Castro e alertou o tribunal: o juiz que condenou aquelas mulheres reconheceu, mais tarde, nas suas memórias, que tinha errado a sentença porque actuou em função do que a sociedade esperava. Sinal de que o advogado espera que o mediatismo deste processo não condene à partida o arguido que defende.
Paulo Lalanda e Castro é um nome que cruza vários processos em curso na justiça portuguesa. Para além dos vistos dourados, o nome deste antigo gestor farmacêutico (era presidente da filial portuguesa da Octapharma) aparece no processo Marquês e é arguido no caso que envolve também Luís Cunha Ribeiro, antigo presidente do INEM e da Administração Regional de Saúde de Lisboa por suspeitas de corrupção activa e branqueamento de capitais que envolvem o negócio do plasma sanguíneo.
“Um dos melhores funcionários da administração pública”
António Figueiredo é o principal arguido deste processo dos vistos dourados. O ex-presidente do Instituto de Registo e Notariado não falou nesta primeira sessão do julgamento porque, segundo o advogado Rogério Alves, quer ouvir primeiro os factos apresentados pela acusação. A defesa pretende provar que “os factos não têm a coloração criminal que a acusação lhes quer dar”.
O advogado, nestas alegações iniciais, referiu-se a Figueiredo como “indiscutivelmente um dos melhores funcionários da administração pública” que foi “desfigurado na sua honra, esmagado, sem emprego e com os bens arrestados”. De António Figueiredo nem uma palavra, mas Rogério Alves garante que a prova da acusação “é cada vez mais fraquinha”.
A China é muito grande
Zhu Xiandong é um dos 21 arguidos no processo dos vistos dourados. Tal como todos os outros arguidos, e como é habitual, passou pelo processo de identificação. Ficámos sem dúvidas que Zhu é da China. Foi o que disse ao juiz-presidente que lhe atirou: “mas a China é grande!”. Afinal, Zhu é de Chinjiang. “Isso é o quê? Uma província?”, atirou-lhe o juiz-presidente. Sim: é uma província chinesa. E não, Zhu não quer falar ao tribunal. Disse ele e a intérprete que o traduziu.
Abrimos e fechamos com José Espada Niza. O procurador da República lamenta “o pacto de silêncio entre os arguidos”, que dificulta o processo, garantindo que “o Ministério Público não irá comportar-se como um caçador de arguidos, mas como baluarte da justiça e da legalidade”.
As próximas sessões do julgamento dos vistos dourados estão marcadas para terça e quarta-feira.