24 abr, 2017 - 16:31 • Olímpia Mairos
Chaves possui as maiores termas medicinais romanas da Península Ibérica, que foram descobertas “por acaso”, quando a autarquia se preparava para construir um parque de estacionamento. Um legado “importantíssimo” que vai dar lugar ao primeiro museu termal romano de Portugal.
O projecto de execução e o concurso para adjudicação da musealização já foi aprovado pela autarquia e está orçado em um 1,1 milhões de euros. Prevê a reactivação do sistema hidráulico de abastecimento de águas termais, condutas, tanques e piscinas.
Está também prevista a execução de camarins, redes de iluminação, telecomunicações, hidráulicas, sistema de AVAC (aquecimento, ventilação e ar condicionado), melhoria da eficiência energética e ambiental, bem como musealização e promoção da estrutura arqueológica.
No interior do edifício, a intervenção contempla a colocação de maquetes com a reconstituição das ruínas, uma mesa táctil interactiva e exposição de artefactos, dando a conhecer a evolução e as vicissitudes do local, desde a construção do primeiro balneário até à actualidade.
A circulação ao nível das estruturas arqueológicas também foi pensada, permitindo a realização de visitas guiadas, actuações e espectáculos.
As termas romanas de Chaves são, segundo o arqueólogo do município, Sérgio Carneiro, “um sítio raro em todo o Império Romano e absolutamente único na Península Ibérica”.
Um edifício de “dimensões monumentais” que ruiu após um sismo registado nos finais do século IV e que ficou “congelado no tempo” até ser descoberto cerca de 17 séculos depois.
Durante as escavações, no local, foram “encontrados vestígios e analisados dados que confirmam a ocorrência desse sismo”, o que leva o arqueólogo a afirmar que se “tratou de uma situação algo parecida à de Pompeia”, cidade romana atingida e destruída pela erupção de um vulcão.
Para além das estruturas, as muralhas, as duas grandes piscinas e as sete pequenas piscinas individuais, foram descobertos vários objectos de uso pessoal, como adornos, anéis, pulseiras e metais que “estão em condições absolutamente incomuns” pelo facto de “as terras terem ficado húmidas e seladas durante todo este tempo”.
O espólio descoberto, como os objectos de metal e madeira, ficarão expostos no Museu da Região Flaviense, ficando os dois edifícios a funcionar em complementaridade.
O projecto de conservação e musealização das Termas Romanas faz parte de uma candidatura ao “Património Cultural”, que o município submeteu e aguarda aprovação, no âmbito do Programa Operacional Regional Norte 2014-2020 (NORTE 2020).
O achado e o edifício que o alberga
As termas romanas foram descobertas em 2006, quando “a autarquia planeava construir no local, situado no centro histórico da cidade, um parque de estacionamento subterrâneo. Durante os trabalhos de sondagem, deparou-se com os vestígios de uma muralha seiscentista e de um complexo termal romano, o que travou de imediato a continuação do projecto”, recorda o presidente da autarquia.
No âmbito do projecto de conservação e musealização do antigo balneário das Termas Medicinais Romanas, que deverá estar concluído em 2018, a praça que tem merecido críticas vai sofrer uma intervenção que contemplará “pequenas acções que devolvam ao espaço um carácter humano, confortável e enquadrado no tecido urbano da cidade”.
Os limites da praça serão redefinidos, através da construção de pequenos muros, bem como da zona de acesso ao tribunal, além da construção de uma cobertura, no limite norte da praça, a qual irá permitir o sombreamento daquele espaço, que será munido de bancos.
A cobertura será preenchida com painéis fotovoltaicos que darão energia eléctrica para o museu, permitindo assim uma poupança na factura da electricidade.
“As pessoas reagem à alteração do imaginário que têm do espaço”
Para preservar o achado histórico foi, entretanto, construído um edifício que o presidente da autarquia, António Cabeleira, acredita “transformar-se num ex-líbris complementar à ponte romana de Trajano e atrair à cidade flaviense, muitos turistas e especialistas das áreas da arqueologia e da hidrologia”.
Não é o que pensa parte da população flaviense, que tece duras críticas ao edifício que cobre o balneário e que foi projectado pelos arquitectos e irmãos Cândido Lopes e Nicolau Lopes.
José Silva, 54 anos, dirige o seu olhar para o edifício enquanto atira: “Isto é um mamarracho, veio destruir a praça, tirar visibilidade ao Palácio da Justiça. Não tem jeito nenhum.”
Maria Mesquita, 75 anos, afina pelo mesmo diapasão e critica: "A parte de cima mais parece um cemitério. Mesmo onde agora puseram umas plantas, tem a forma dos jazigos”, diz a septuagenária.
Também Paulo Soares, 24 anos, não gosta do edifício que “só serviu para enterrar dinheiro”.
“É uma vergonha. Gastam o que têm e não têm para desvirtuar uma cidade histórica”, diz o estudante de engenharia civil.
O presidente da autarquia explica que, “para preservar o balneário, era necessário cobri-lo e, ao fazermos isso, fechou-se a praça”.
O autarca “admite” e “aceita” que a solução encontrada para a fachada não seja de consenso, mas afirma que “em termos de volumetria não havia muito a fazer em função do achado arqueológico”.
Na visão do presidente António Cabeleira “as pessoas reagem à alteração do imaginário que têm do espaço”.
“As pessoas estavam habituadas a ver o espaço de uma determinada maneira e como o espaço foi radicalmente alterado, alterou o imaginário das pessoas e estas reagem”, considera.
O autarca não tem dúvidas que “Chaves ganha mais um espaço que vai atrair turistas porque é unânime para todos os que visitam o achado que se trata de uma coisa extraordinária e que é preciso que essa coisa extraordinária seja colocada ao serviço da comunidade e de quem nos visita”.