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Portugal condenado por negligência. “Temos de investir muito mais na saúde mental”

27 mai, 2017 - 14:36

António Carvalho tinha 35 anos quando se atirou para debaixo de um comboio. Era doente do hospital Sobral Cid. A família não se conformou e foi até às últimas instâncias.

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O Tribunal dos Direitos do Homem condenou o Estado português por ter sido negligente no dever de vigilância sobre um doente psiquiátrico, criando a oportunidade para ele se suicidar.

A condenação ocorre 17 anos depois dos factos e contraria todas as decisões dos tribunais portugueses, que sempre entenderam não haver responsabilidade do hospital Sobral Cid, em Coimbra, onde o homem estava internado.

A ausência de António José Carvalho, 35 anos, foi notada ao jantar, na altura em que se percebeu que havia um tabuleiro a mais.

“O controlo dentro do hospital Sobral Cid é feita à hora do jantar pelos tabuleiros. Acho isto, no século XXI, completamente hilariante. Vai-se contar os tabuleiros e se faltar alguém é que se tomam providências”, conta a irmã de António, Maria João Carvalho, no programa da Renascença Em Nome da Lei.

“No caso do meu irmão, quando cheguei às oito da noite, o hospital ainda não tinha conhecimento do se estava a passar ou, se tinha, não passou esse conhecimento para a família”, acrescenta.

António José Carvalho atirou-se para debaixo de um comboio aos 35 anos, depois de ter abandonado o hospital psiquiátrico onde tinha sido internado. Apesar de já ter tentado suicidar-se duas vezes antes, ninguém impediu a sua saída.

A família veio a descobrir mais tarde que este doente nem sequer tinha sido medicado. E só 24 horas depois soube do sucedido, apesar de toda a insistência. A notícia chegou por telegrama.

Os factos andaram pelos tribunais portugueses durante vários anos. O Tribunal Administrativo de Coimbra demorou oito anos a proferir uma sentença que ilibava de responsabilidades ao hospital.

A família recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, mas este confirma a decisão da primeira instância. Esgotados os meios de recurso nacionais, a mãe de António Carvalho apela ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que acaba por condenar o Estado português por negligência no dever de vigilância sobre um doente psiquiátrico.

A saúde mental precisa de mais

O psiquiatra Fernando Vieira, também convidado do Em Nome da Lei deste sábado, adverte que, apesar das falhas do hospital Sobral Cid na vigilância, um hospital não pode impedir um doente de sair, “a menos que accione o internamento compulsivo, que tem de ser imediatamente comunicado à instância judicial”.

André Dias Pereira, por seu lado, membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, critica os tempos nem a decisão dos tribunais portugueses e considera que a decisão do tribunal de Estrasburgo faz justiça.

Agora, o importante é tirar lições do caso.

“Primeira: todos nós – sociedade, Estado, Ministério da Saúde – temos de investir muito muito mais na saúde mental. Se forem ver os orçamentos, são uma vergonha. Temos de ter orçamento para [haver sistemas modernos de controlo de entradas dos doentes].

Segunda: os tribunais administrativos têm atrasos. Então, é preciso que quem de direito actue aí.

Terceira ideia: misturar a responsabilidade médica, tão complexa, com os outros problemas de Direito Administrativo, que são concursos, contratos públicos, coisas completamente diferentes, não é o bom caminho e cada caso mostra isso”, aponta.

O programa Em Nome da Lei é transmitido aos sábados, entre as 12h00 e as 13h00.

Comentários
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  • Jose
    27 mai, 2017 Setubal 23:40
    Teve de ser o Tribunal Europeu a fazer o que devíamos ser nós a fazer. 17 anos à espera é muito. O que esta família sofreu à espera de justiça. Portugal é um país atrasado onde a corrupção é quem manda. Somos o lixo da Europa.
  • Filipe
    27 mai, 2017 évora 19:20
    Os Justiceiros e Justiceiras que alegadamente gerem as leis aprovadas na assembleia da república , entendem que mais vale prender sem provas doentes do foro psíquico para daí lhes dar um ensinamento de vida dentro das cadeias podres em Portugal . Tudo se pode tratar em sítios próprios , mas o "SOS" da TVI mostra a brutalidade contra gente doente todos os dias , dá dinheiro a advogados e promove gente indigna em Portugal .
  • José Seco
    27 mai, 2017 Lisboa 18:59
    Não. Portugal recebeu fundos e tem verbas para fazer muito pela saúde mental mas as mesmas são metidas ao bolso por gestores e outros pulhas! A corrupção em Portugal é geral! O país não tem ponta por onde se pegue!
  • teresa
    27 mai, 2017 18:21
    O doente mental que necessite de um hospital psiquiatrico permanentemente hoje em dia não tem esse serviço. Os doentes andam ao deus dará pelas ruas, pois as familias não podem apoiar estes doentes de modo permanente.
  • Luis
    27 mai, 2017 Lisboa 18:15
    Os doentes mentais foram expulsos dos hospitais sem que fosse criada alternativa. Provavelmente muitos dos sem abrigo são esses doentes mentais. Lembro-me de ter ido a um seminário, onde uma assistente social pôs a questão do que ia acontecer aos doentes mentais, e lembro-me que ela foi praticamente insultada pelo responsável desta situação que afirmou que ela não sabia de nada e não tinha de se estar a meter!
  • JOSÉ MANUEL SOARES
    27 mai, 2017 SÃO CRISTÓVÃO DE LAFÕES, VISEU 17:44
    Exmos Senhores; Sofro de depressão crónica bipolar (Doente Mental), desde 2002. Já estive internado por duas vezes em Hospital Amadora Sintra. Fui reencaminhado pelo antigo Hospital Miguel Bombarda em Lisboa, onde fui bem medicado. Trabalhava e morava no Algarve. Derivado a ter ficado desempregado em 2009, fui forçado a pedir abrigo aos meus Pais que residiam no Concelho de São Pedro do Sul, Distrito de Viseu. Desde 2010 que ando a ser seguido em Psiquiatria no Hospital de Abraveses em Viseu. Meus Pais faleceram no ano de 2013. O meus estado de saúde mental, agravou-se. Há oito anos que tomo sempre a mesma medicação. Já solicitei à médica para se fazer uma alteração da mesma. Não concordou porque achou que estava bem medicado. No decorrer de estes 8 anos, já tentei o suicídio com medicamentos e duas vezes por mutilação dos pulsos. Não me encontro bem psicologicamente. Nunca mais consegui arranjar trabalho e também não me encontro em condições de o fazer. Vivia do subsídio de RSI. A S. Social quis cortar-me o subsídio. Eu fui obrigado a pedir uma reforma de velhice de 229,50€ mês, com uma penalização muito significativa. Era de classe média alta e passei a ser pobre. Já recorri a várias instituições com a intenção de obter apoio à medicação, alimentação, outros. Todas as portas se fecharam. Vivo sózinho. Apelo a quem de direito, que me ajude, nesta situação de angústia. Obrigado. Com os meus cumprimentos
  • Carlos Reis
    27 mai, 2017 Coimbra 17:08
    E depois dizem que a justiça portuguesa funciona bem.
  • pitô
    27 mai, 2017 andorra 17:04
    Dizia Júlio de Matos: Temos aqui dentro muitos doidos, mas a maioria anda lá fora.

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