29 mai, 2017 - 21:47 • Paulo Ribeiro Pinto [entrevista] e Catarina Santos [vídeo]
A posição do Presidente norte-americano, Donald Trump, sobre as alterações climáticas é "chocante" e "decepcionante", afirma Rajendra Pachauri em entrevista à Renascença nas conferências do Estoril. O vencedor do prémio Nobel da Paz em 2007, em nome do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas, considera que o mundo tem "dois ou três anos" para tomar medidas efectivas para combater as alterações climáticas.
Dez anos depois de ganhar o Prémio Nobel o que está complicar a alteração do comportamento das pessoas em relação às alterações climáticas?
Francamente, pouco tem mudado nos últimos dez anos. Sim, há uma maior consciência e é por isso que, pelo menos, temos o Acordo de Paris, que não teria acontecido a menos que os líderes mundiais estivessem convencidos de que alguma coisa teria que ser feita. Mas, se olhar para o que se tem sido feito, não é suficiente. Nós temos de fazer muito mais, porque as consequências das alterações climáticas estão a agravar-se progressivamente. Eu penso que temos de garantir que mesmo o Acordo de Paris pretende mais acção do que a que temos até agora. Estes compromissos não são suficientes. Nós temos que intensificar as acções nos países.
Acredita que o Acordo de Paris vai ser implementado pelos governos?
Sim, eu acredito que o Acordo de Paris está lá e manter-se-á em vigor, mas a sua eficácia depende daquilo que os governos estão preparados para fazer. Se os governos não elevarem o seu nível de ambição, o Acordo de Paris não terá eficácia, porque o Acordo só é um ponto de partida e uma oportunidade de fazer as coisas. No entanto, não há requisitos para os governos, eles decidem voluntariamente quanto vão fazer. Eu penso que a única forma de vermos acção suficiente é se a juventude mundial tomar a liderança desta batalha. É isso que eu estou a tentar fazer, eu estou a tentar mobilizar as pessoas jovens de todo o mundo.
Aconselhou os jovens aqui no Estoril a perguntarem e lutarem mais com as instituições e o Governo. Que conselhos lhe daria?
O que lhes digo é que comecem a agir nas suas instituições. Todas as escolas e universidades deviam tornar-se electricamente suficientes. Isso não é um luxo, é algo que conseguimos fazer agora por um custo negativo, uma vez que, como os custos da nova energia tecnológica desceram tanto, é melhor usar as energias suficientes que as baseadas em combustíveis fósseis. Eu penso que se todas as instituições do mundo se tornarem um exemplo de acção responsável, os estudantes tomam conta do assunto e trabalham com as autoridades das escolas e universidades e isso terá um grande impacto na sociedade. Por isso, é isso que lhes estou a pedir para fazer, porque assim eles também conseguem dizer aos seus líderes o que estão a fazer e são capazes de questiona-los por que razão não acontece em todo o país.
Como olha para a posição da nova Administração norte-americana em relação às alterações climáticas? Os EUA deviam liderar?
A única coisa que posso dizer é que é chocante. É muito decepcionante que o líder da mais poderosa nação do mundo e o país que, historicamente, foi responsável pela maioria das emissões de gases com efeito de estufa negue as alterações climáticas. Todos os governos norte-americanos, sucessivamente, aprovaram as conclusões do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas. E essa é a força do Painel Intergovernamental. É um esforço científico, mas requer a aprovação de todos os governos do mundo. E se ele [Donald Trump] se prepara para fechar os olhos, apenas posso dizer que é um choque e uma infelicidade.
A União Europeia ou mesmo a China podem liderar esta luta contra as alterações climáticas?
A Europa, a China, a Índia e outros países, como o Japão, podem fazer muito. Eu diria que se os Estados Unidos não querem fazer nada, deixem os outros países avançar. Por que devem esperar pelos EUA? Temos lideranças responsáveis, temos líderes que entendem que o bem-estar do seu povo dependente de agir contra as alterações climáticas. Caso contrário, os jovens vão enfrentar uma grave crise daqui a algumas décadas. É isto que queremos deixar aos jovens deste mundo? Certamente, não e, por isso, acho muito importante que os líderes das outras nações tomem a iniciativa e avancem.
E eu acho que eles serão muito ajudados se os jovens em todos dos países agirem e mostrem o caminho e que podemos ter um estilo de vida diferente, na forma como utilizamos a energia e na redução do desperdício, porque tornámo-nos numa sociedade com muito desperdício. A sociedade humana está a desperciçar tanto. Repare no problema dos resíduos sólidos nas nossas cidades. Nós não temos que gerar todo este lixo. Não temos que usar tanto plástico. O importante é que os jovens assumem a vanguarda e digam: 'basta, não vamos deixar que isto continue a acontecer".
Passar essa mensagem às novas gerações é um dos poderes de um prémio Nobel?
Acho que não, é a minha convicção pessoal, porque eu estou na área das alterações climáticas há três décadas e estou convencido que os governos, por si só, não vão fazer o suficiente. Passam 25 anos desde a criação da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, o que alcançámos? Temos o Acordo de Paris, isso dá-nos uma oportunidade, mas não resultados e acho muito importante encontrarmos um novo caminho, e há muitos anos tenho vindo a pensar que os jovens são esse caminho. Eles têm que assumir a liderança.
O Acordo de Paris é a nossa última oportunidade de fazer algo importante para o futuro?
É mesmo a última oportunidade e acredito que o mundo tem dois ou três anos para começar a tomar medidas efectivas. Se falharmos esta oportunidade não vamos conseguir fazer nada no futuro. Porque o tipo de tecnologias e acções que teremos de tomar serão praticamente impossíveis. É mais sensato da nossa parte começar já a tomar medidas concretas, sem mais atrasos, e com um sentido de determinação.