14 out, 2017 - 12:49
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O caso Marquês pode ser o último grande caso de criminalidade económica investigado em Portugal.
O alerta é feito pelo presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, António Ventinhas, que diz que, para impedir a investigação dos crimes de colarinho branco, basta uma alteração cirúrgica do Código de Processo Penal, como já ouviu ser defendida por vários políticos.
“Que não haja tentações de que este seja o último grande processo de investigação de criminalidade económico-financeira. Tentações ao nível do legislador e da alteração do Código de Processo Penal”, esclarece.
“Ouço dizer que os prazos de investigação deviam ser perentórios, ou seja, o prazo seria por exemplo de dois anos e se há uma carta para a Suíça para pedir quais eram as contas em que determinada pessoa tinha recebido dinheiro, chega ao fim de dois anos e acaba a investigação.”
“Se quiserem evoluir para um sistema desses, como muitas pessoas defendem, esta será a última grande investigação, porque basta alterar um artigo no Código de Processo Penal”, avisa.
Para António Ventinhas, os factos que constam da acusação a José Sócrates e Ricardo Salgado apontam para uma corrupção generalizada do regime. “A provarem-se todos estes factos estamos perante uma corrupção generalizada do regime. Não só do regime político, mas do sistema financeiro e das ligações entre o sistema financeiro e o político que condicionaram não só um ou outro aspecto, mas a própria sociedade e a vida económica e política em Portugal. Estamos a falar de um problema praticamente do regime democrático.”
Já Maria Fernanda Paula, professora de Direito Penal, considera a afirmação de António Ventinhas muito perigosa e entende que a generalização tem como efeito que a desvalorização da Democracia na opinião pública. “Não podemos dizer que por haver um processo contra um magistrado do Ministério Público, ou contra um juiz, que está em causa todo o sistema da magistratura do Ministério Público ou judicial.”
“O facto de haver políticos acusados no contexto de uma determinada acção governativa concreta, através de factos que presumo estarem muito bem identificados, não há de pôr em causa o regime democrático”, acredita a professora. “É uma afirmação excessiva e sendo excessiva é perigosa porque cria um efeito na opinião pública perigoso, que é a desvalorização da democracia.”
A penalista defende, pelo contrário, que o caso Marquês é um sinal de que a Democracia está forte, porque “só em democracia – e por isso o regime está forte – é que se poderia ter chegado a este tipo de investigação”, envolvendo um ex-primeiro-ministro.
Havia bases para prisão preventiva?
A ex-bastonária da Ordem dos advogados, Elina Fraga diz que basta a notícia da corrupção para se sentir preocupada enquanto cidadã, mas não aceita que o Ministério Público esteja a querer criar na opinião pública a convicção de que a acusação já é uma espécie de pré-julgamento. “O Ministério Público está a assumir, na pessoa do Dr. Ventinhas e de outros representantes do Ministério Público, que com a acusação já há um pré-julgamento feito com robustez e solidez e que se pode interiorizar com a acusação um juízo de censura”.
Já o advogado Magalhães e Silva diz que para a história deste processo importa apurar se em Novembro de 2014 a investigação tinha indícios fundamentos suficientes da pratica dos crimes, para deter preventivamente José Sócrates.
“Teremos de escrutinar – sem que se tire qualquer conclusão sobre as culpas finais – se em Novembro de 2014 havia elementos suficientes para determinar a prisão preventiva de José Sócrates, com as consequências isso teve em termos de exposição mediática ao longo de todo este tempo e com julgamento na opinião pública feito, justo ou injusto, logo veremos, mas feito”.
Cúmplices no sistema
Por fim, o jornalista Fernando Esteves também questiona a prisão preventiva de José Sócrates. Fernando Esteves lançou esta semana um livro sobre o caso, em que diz que essa detenção permitiu ao ex-primeiro-Ministro montar uma estratégia de vitimização. Em “A Sangue Frio”, Fernando Esteves cruza dados da sua investigação pessoal com os que constam da acusação e entre as ideias que defende está a de que Sócrates só agora é acusado porque antes beneficiou da politização do Ministério Público.
O jornalista diz mesmo que José Sócrates tinha dois cúmplices no sistema judicial: o ex-presidente do Supremo Tribunal, Noronha do Nascimento e o ex-procurador-geral da República Pinto Monteiro. As escutas destruídas são a prova disso, considera.
“No caso Face Oculta foram encontradas escutas por parte de um procurador de Aveiro, que concluiu que estaria em marcha um crime de atentado ao Estado de Direito. Alegadamente José Sócrates estaria a tentar tomar conta da comunicação social e, portanto, limitando ou condicionando a liberdade de expressão.”
“Essas escutas, conversas entre Armando Vara e José Sócrates, foram destruídas por Noronha de Nascimento, sob proposta de Pinto Monteiro. Foram cúmplices”, conclui.
Declarações ao programa de informação da Renascença Em Nome da Lei, que este sábado debate a acusação contra José Sócrates e outros 27 arguidos. O Em Nome da Lei é transmitido aos sábados depois do noticiário das 12h.