26 out, 2017 - 16:44
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O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) diz que “crenças pessoais”, “estados de alma” ou “formulações da linguagem de subjectividade excessiva” não são “prestáveis como argumentação e não contribuem para a qualidade da jurisprudência”. Mas António Henriques Gaspar também considera que “a intensidade e a violência das críticas não é um bom serviço para o funcionamento da justiça, nem para a defesa das vítimas".
Na tomada de posse do novo presidente do Tribunal da Relação do Porto, Nuno Ataíde das Neves, e sem querer falar de qualquer caso em concreto, Henriques Gaspar acabou por comentar o acórdão polémico no qual o juiz relator faz censura moral a uma mulher vítima de violência doméstica, minimizando este crime pelo facto de esta ter cometido adultério, o que tem sido alvo de várias críticas ao longo dos últimos dias.
“As considerações marginais, quando não mesmo destituídas de qualquer sentido, desviam a atenção do rigor da substância, induz em incompreensões ou violência crítica e apagam qualquer hipótese de ler a justiça das decisões”, disse Henriques Gaspar.
No entanto, o presidente do STJ alertou que “a violência das críticas” feitas nos últimos dias àquele acórdão da Relação do Porto não é bom serviço nem para a justiça “nem para a defesa das vítimas”.
Durante o seu discurso, Henriques Gaspar, e sublinhando não poder falar deste caso em concreto, assinalou que “para construir a confiança a justiça deve comunicar, e comunica, através dos actos escritos, as decisões dos tribunais”, realçando, porém, que esta comunicação “exige sobriedade e vigilância semântica”.
O Conselho Superior de Magistratura instaurou um inquérito ao juiz relator do acórdão, Neto de Moura, e as questões nele suscitadas deverão ser apreciadas pelo plenário do Conselho, na reunião de 5 de Dezembro.
No polémico acórdão, datado de 11 de Outubro, o juiz relator invoca a Bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher em causa por parte do marido e do amante, que foram condenados a pena suspensa na primeira instância.
O secretário da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) lamentou o recurso à Bíblia na fundamentação do acórdão.
O novo presidente do Tribunal da Relação do Porto foi empossado esta quinta-feira, no Palácio da Justiça daquela cidade, para um mandato de cinco anos. Sucede a Henrique Araújo, que exercia as funções desde Junho de 2015 e que, entretanto, passou a integrar o corpo de juízes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.