27 jan, 2018 - 09:38 • Ana Carrilho
Em Portugal existe um consumo exagerado de benzodiazepinas, popularmente conhecidos como “calmantes”, alerta o presidente da Associação Portuguesa do Sono, Joaquim Moita.
Em entrevista à Renascença, Joaquim Moita sublinha que estes fármacos podem ser úteis, mas apenas em casos de insónias transitórias, provocadas, por exemplo, por situações de stress ou doenças que perturbam o sono (caso da pneumonia).
Mas, a partir de uma certa altura – cerca de dois meses depois do início da medicação – podem começar a criar dependência e “a ideia de que sem as benzodiazepinas a pessoa não consegue dormir”.
Além disso, induz o aumento da dose. Ainda assim, o doente acaba por continuar a ter um sono leve, perturbado e não repousante, diz o especialista.
Razões que levam Joaquim Moita a alertar para as “soluções milagrosas”, em comprimidos ou sprays, anunciadas na comunicação social. “Só resultam em insónias de curta duração, depois fazem mais mal que bem”.
Por outro lado, os estudos mostram que o uso prolongado de benzodiazepinas pode provocar doenças do foro neurológico – nomeadamente demências – e quedas, sobretudo em pessoas mais idosas.
A insónia crónica é um problema grave de saúde pública que afecta 9% da população portuguesa, frisa Joaquim Moita nesta entrevista à Renascença.
Ressona? Se calhar sofre do Síndrome de Apneia do Sono
Outro problema é o Síndrome de Apneia do Sono (SAS). Um estudo europeu revela que metade dos homens e um quarto das mulheres têm ou vão ter, futuramente, SAS.
Joaquim Moita afirma que as pessoas já vão reconhecendo os sintomas: ressonar, apneias durante o sono e sonolência no dia seguinte. “A pessoa que tem apneia não descansa, não tem um sono eficaz, mostra problemas de concentração, falhas de memória e pode ser a causa de acidentes de trabalho e rodoviários. É outro grave problema de saúde pública.”
O SAS está associado às doenças cardíacas e cerebrovasculares e a maioria dos doentes ter hipertensão arterial. Os doentes com Síndrome de Apneia do Sono têm maior risco de desenvolver arritmias e doenças coronárias, assim como diabetes ou sofrerem Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC), além de depressões. Ou seja, tem custos indirectos na saúde muito elevados.
Os adultos dormem pouco e as crianças, ainda menos
Os portugueses dormem pouco e mal. A maioria anda longe das sete a nove horas diárias de sono, com um mínimo de seis e um máximo de dez, revela Joaquim Moita. As crianças e adolescentes deviam dormir dez ou 11 horas, indispensáveis ao bom desenvolvimento físico, psicológico e social. “Mas isso não acontece”, frisa o especialista que não hesita em criticar o preconceito dos pais e sociedade em relação à importância do sono.
“A escola começa muito cedo e as crianças e jovens adormecem, em geral, muito tarde. Ainda por cima, em grande parte dos casos, vão para a cama sob o estímulo da televisão, smartphone ou computador.”
Joaquim Moita explica que são aparelhos que emitem uma radiação azul, “muito boa do ponto de vista da eficiência energética, mas que tem um efeito biológico perverso.
Bloqueia o aparecimento da melatonina – hormona do sono – e assim, o adormecimento, em vez de ocorrer às 22h00 só acontece mais tarde”.
O médico explica que a radiação azul, presente no sol da manhã, não faz sentido que esteja presente quando vamos dormir. “É particularmente grave nos jovens. Acaba por determinar o mau desempenho escolar, a irritabilidade, a hiperactividade”.
Estas são algumas das questões que vão ser abordadas no Simpósio “O Essencial da Medicina do Sono para a Medicina Geral e Familiar”, agendado para 23 de Março, em Coimbra. É organizado Associação Portuguesa do Sono e Comissão de Trabalho de patologia Respiratória do Sono da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.
O objectivo é familiarizar os clínicos, nomeadamente de Medicina Geral e Familiar, para estes sintomas e doenças associadas. E de os alertar para os riscos da prescrição excessiva de calmantes. Por isso, também vão ser apresentadas formas mais modernas de tratamento, a nível farmacológico e de psicoterapia.