31 jan, 2018 - 11:03
Quando um processo judicial envolve um juiz desembargador na qualidade de arguido é o Supremo Tribunal de Justiça que tem competência para o julgar.
“Há um foro especial para o julgamento de magistrados, seja judiciais seja do Ministério Público. Quanto ao Supremo, a competência é julgar juízes conselheiros ou desembargadores. A Relação, por seu turno, é competente para julgar os restantes juízes”, explica o especialista em Direito Penal Rui Pereira, antigo ministro da Administração Interna.
No que toca aos magistrados do Ministério Público, “a competência também se reparte entre ambos os tribunais: o Supremo julga os procuradores-gerais adjuntos e a Relação os procuradores e os procuradores adjuntos”, acrescenta.
Na Manhã da Renascença, Rui Pereira sublinha que “não se trata de uma regalia corporativa para os magistrados, mas sim de uma preocupação para que sejam julgados por colegas superiormente graduados na carreira, tanto quanto possível, para garantir a isenção, a objectividade e a justiça do julgamento”.
A explicação surge na sequência do caso que envolve dois juízes desembargadores – Rui Rangel e a sua ex-mulher, Fátima Galante – e outros nove arguidos, entre os quais um dirigente desportivo.
Os arguidos são suspeitos dos crimes de corrupção, recebimento indevido de vantagens, branqueamento, tráfico de influências e fraude fiscal qualificada. Para todos os arguidos, que nesta fase do processo nem sequer foram acusados, haverá apenas indícios.
Mas, se ficar provado que um juiz viciou uma decisão judicial, o caso pode voltar para trás e haver novo julgamento, “mesmo que as decisões tenham transitado em julgado”. É o que se chama um “recurso extraordinário de revisão” – extraordinário, porque “há um princípio na ordem jurídica segundo o qual ninguém pode ser julgado duplamente pela prática do mesmo crime”.
Quando este tipo de recurso é interposto – “já depois do trânsito em julgado de uma sentença, depois de ela se tornar irrecorrível” – costuma beneficiar o arguido, por surgirem novos meios de prova que demonstram a sua inocência ou qualquer coisa de semelhante”.
Contudo, neste caso em concreto, “em que há ou pode haver corrupção de juízes ou jurados, esse recurso extraordinário pode prejudicar os arguidos”, dado que o Código do Processo Penal entende que o que houve antes não foi um julgamento mas um simulacro de julgamento”, explica Rui Pereira.
Ainda neste caso, não será o arguido a pedir o recurso, mas sim o Ministério Público e pode acontecer que seja contra o arguido.
A operação “Lex” foi lançada na terça-feira, com 33 buscas e a detenção de cinco pessoas. Outras seis foram constituídas arguidas, entre as quais dois juízes desembargadores e um dirigente desportivo do Benfica, Fernando Tavares, que começam a ser ouvidos esta quarta-feira.