03 fev, 2018 - 00:00 • Manuel António Pereira, presidente da direção da ANDE – Associação Nacional de Dirigentes Escolares
Falar de rankings, o que acontece em cada ano, por esta altura, é quase lugar-comum, para todos quantos estão mais ligados às questões da educação. De facto, é sempre um tema apetecível e estimulante até porque permite a todos apresentar e defender as mais diversas opiniões, sempre fundadas em certezas provenientes de critérios, convicções e pré-conceitos construídos, todas elas válidas mas quase sempre valorizando apenas uma parte, quase sempre a mais visível, qual iceberg.
Os rankings colocam sempre as escolas, públicas e privadas, em comparação e, desde logo, tentam comparar os resultados independentemente da sua diversidade seja ela nacional, regional, física ou humana.
Mesmo com a atual metodologia de “controlo” de alguns fatores fundamentais como a ponderação socioeconómica do perfil social dos alunos, sabemos que isso não é suficiente para que a comparação entre as escolas não seja uma injustiça, na medida em que se tenta comparar o incomparável.
“A realidade é muito mais complexa do que supõe uma simples classificação de escolas por notas em exames nacionais.” Mesmo assim, não deixamos de referir que independentemente das opiniões diversas, cada escola olha para essa listagem ordenada como um instrumento de trabalho importante, tentando sempre perceber claramente a sua posição e as razões de possíveis alterações.
Para os encarregados de educação mais esclarecidos e com capacidade de escolha, o que acontece maioritariamente nas zonas urbanas do litoral, o ranking é uma ferramenta de trabalho importante na medida em que lhes permite fazer opções por escolas, baseadas nos resultados por elas apresentados.
De facto, uma boa parte da polémica à volta dos rankings passa por aqui, até porque o seu espírito está nos antípodas do que é a filosofia subjacente ao perfil do aluno à saída do secundário e dão uma imagem redutora das escolas, atendendo apenas aos resultados dos exames e não a projetos educativos que, em muitos casos são de excelência, mesmo comparados com os privados.
Por outro lado, a escola pública é inclusiva, dá resposta a imperativos constitucionais fundamentais como a obrigatoriedade e a equidade e valoriza claramente a formação global e equilibrada dos alunos independentemente da sua proveniência social, regional ou cultural.
Como referia François Dubet, “escola mais justa não é somente aquela que anula, o mais justamente possível, a reprodução das desigualdades sociais e promove o verdadeiro mérito, é sobretudo aquela que garante o nível de ensino mais elevado ao maior número de alunos e sobretudo, aos alunos mais fracos”.
Um novo modelo de acesso ao ensino superior, absolutamente necessário no nosso país, permitirá diluir diferenças e poderá garantir uma formação mais equilibrada e diversificada dos jovens para que a passagem pelo ensino secundário deixe de ser um tempo de treino para exames de acesso à universidade em função das expectativas de alunos e famílias, e passe a ser um tempo de preparação sólido para a frequência do ensino superior.
É preciso que o ensino secundário consiga realizar essa sua verdadeira função e deixe de ser o que tem vindo a ser, ampliado pela discussão à volta de competições estéreis que culminam em cada ano na publicação de rankings que, no limite, mais não são do que publicidade gratuita para escolas que ferozmente lutam, em cada ano, por lugares cimeiros nessas listas.
Seria bom que essas listas pudessem refletir as verdadeiras aprendizagens dos alunos ao longo da sua passagem pela escola e não refletissem apenas conhecimentos testados numa única prova.
Para a comunidade, para as autarquias, para o Ministério da Educação e para o Governo em geral, os “rankings” também são um instrumento de trabalho fundamental, melhor, deveriam ser. De facto, há todo um país condenado a ocupar os piores lugares do ranking desde que estes existem. Uma espécie de determinismo insano para o qual parece não haver solução.
Os rankings também são uma chamada de atenção para aquele país mais despovoado ou mais abandonado onde, parece, as expectativas não vão além do imediato e onde as opções de futuro por vezes quase nem existem.
Por mais que as escolas diversifiquem estratégias ou implementem percursos alternativos, enquanto não se investir a montante na melhoria das condições de vida, através da criação de emprego ou o incentivo à fixação, pouco mudará.
Resta a providencial estoicidade dos atores educativos que não aceitam esta pena de Sísifo a que parecem terem sido condenados.