05 mar, 2018 - 15:09 • Teresa Almeida
O professor universitário Manuel Tão, especialista em ferrovia, diz que "nada do que está a ser anunciado para a ferrovia portuguesa vai solucionar" os problemas que susistem.
“Quase que era preciso termos uma máquina do tempo para solucionarmos o nosso problema. Nada do que está a ser anunciado para a ferrovia portuguesa vai solucionar o nosso problema”, diz à Renascença o professor da Universidade do Algarve.
Manuel Tão sustenta que o plano Ferrovia 2020, anunciado pelo Governo e no valor de dois mil milhões de euros, “está ultrapassado" desde logo pela "ausência do conceito de rede".
"O plano não atende à necessidade de voltarmos a ter uma rede ferroviária, porque se concentra num eixo que vai de Braga a Faro, com um ou outro corredor transversal", argumenta.
Outra falha detectada por Manuel Tão é o facto de o Ferrovia 2020 "não contemplar qualquer tipo de integração do sistema ferroviário português nas redes transeuropeias", a que se junta o problema de "não estar articulado com qualquer tipo de valorização do território e de valorização do interior”.
Na perspectiva do especialista, o Governo limitou-se, neste "2020", a mudar o nome à estratégia do Governo anterior, "não acrescentando mais-valia nos mais de dois mil milhões de euros que vão ser gastos em mil quilómetros de linha”. Assim, "falta estratégia que nos ligue à Europa, que nos aumente a competitividade económica e que dê ao interior do país a esperança que lhe falta".
O erro da aposta nas autoestradas
O especialista da Universidade do Algarve sublinha que, em matéria de ferrovia, Portugal está muito atrasado em relação ao resto da Europa porque cometeu um erro há 30 anos: "Foi investir nas autoestradas, modelo que está esgotado e ultrapassado, deixando para trás uma rede ferroviária sem qualquer tipo de competitividade.”
Para um país ser competitivo, “é preciso voltar a centrar o investimento na ferrovia”, sustenta o especialista, sublinhando que "o plano gizado em 2006 estava no bom caminho, com linhas estratégicas muito bem feitas. Por isso, "é da estratégia ferroviária de 2006 que devíamos retirar as ideias, é uma boa base para se dar a verdadeira cambalhota que este desígnio precisa e recuperar as ultimas três décadas perdidas no caminho de ferro em Portugal”.
Nova linha entre Lisboa e Porto
Manuel Tão defende a urgência de criar uma nova linha entre Lisboa e Porto, porque “a atual está esgotada, tal como se esgotou a Estrada Nacional 1".
"Uma nova linha de alta velocidade, entre estas duas cidades, não é uma questão de saber se vai ser construída, é de saber quando”, sentencia, porque “não podemos pensar no crescimento, por exemplo, do turismo, tendo uma relação ferroviária ibérica entre capitais que demora o mesmo tempo de há 100 anos".
"São cosias que já não se compadecem com uma economia que diz que quer ser competitiva”, nota.
Outro dos problemas que este especialista vê na nova estratégia é a falta de investimento no interior do país, apontando o exemplo de cidades como Viseu, Vila Real, Bragança e Estremoz, que perderam as linhas de comboio. “Foi um encerramento brutal, são cidades que viram as suas ligações encerradas e, por isso, é difícil falar, nestas regiões, de uma economia competitiva."
Manuel Tão lembra que dentro de "um ano ou ano e meio", surgirá um problema "para o qual não estamos preparados", que é o da liberalização do sector ferroviário. "Passarão a existir vários operadores também no setor dos passageiros, podemos, por exemplo passar a ter os espanhóis a querer explorar as nossas ligações e a premência de investimentos que já deveriam ter sido realizados há muito tempo vai-nos criar um grande problema”, diz.
Para Manuel Tao o que o governo fez foi pegar na estratégia do anterior governo e mudar-lhe o nome, “não acrescentando mais valia nos mais de dois mil milhões de euros que vão ser gastos em mil quilómetros de linha”. Para este especialista, "falta estratégia que nos ligue à Europa, que nos aumente a competitividade económica e que dê ao interior do país, a esperança que lhe falta".