22 mai, 2018 - 07:07 • Manuela Pires
“O som é um meio importante de estudo, porque para sabermos o que está no fundo do mar precisamos de som." A frase é de António Silva, que se dedica há 20 anos a investigar a acústica submarina, nomeadamente na área das comunicações acústicas e no desenvolvimento de sistemas de telemetria submarina.
Engenheiro eletrotécnico e de computadores, António Silva é professor na faculdade de ciências e tecnologia da Universidade do Algarve e um dos responsáveis pelo SIPLAB, o laboratório de processamento de sinais onde são construídos equipamentos como os hidrofones, para captar o som do fundo do mar.
Um dos vários projetos em que está envolvido é o Ocean Discovery X Prize. A equipa portuguesa é uma de nove finalistas, ao lado de grupos dos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e Japão. A sua tarefa é recorrer a meios robóticos que vão ser desenvolvidos por investigadores portugueses para fazer medições batimétricas do fundo do mar, de forma a conhecer o seu relevo.
“Atualmente nós não conhecemos nada", refere à Renascença. "O objetivo deste projeto é tentar fazer o mapeamento do fundo do oceano. A equipa que, em 24 horas, conseguir fazer o mapa de uma zona, que ainda não sabemos qual é, vence o prémio de 7 milhões de dólares.”
Captar o som do fundo do mar não é tarefa fácil. Neste tipo de expedições, "um dos problemas que a robótica enfrenta é perder os veículos, há sempre a possiblidade de lançar o veículo à água e ele não voltar", explica António Silva, que há cinco anos coordenou uma campanha científica que quatro equipas da Universidade do Algarve, da Faculdade de Engenharia do Porto, do Instituto de Engenharias de Sistemas e Computadores do Porto e do Centro de Investigação Naval da Marinha Portuguesa.
O objetivo foi usar veículos marinhos robotizados para diferentes operações que envolvem a acústica submarina, “Tivémos algumas surpresas, conseguimos ouvir cachalotes, o que não era de prever, porque eles andam em águas muito profundas e nós estávamos apenas a 100 metros de profundidade, junto à costa. Mas conseguimos ouvir porque estávamos perto do canhão de Setúbal e o som chega muito rapidamente. Os cliques de um cachalote viajam até ao outro lado do mundo, eles podem comunicar a centenas ou milhares de quilómetros.”
Comunicações como a dos cachalotes, importantes à sobrevivência desta e de outras espécies, podem ser travadas por outros ruídos escutados nos oceanos. Foi também por isso que Cristiano Soares fundou a Marsensing, uma empresa nascida na Universidade do Algarve que se especializa em acústica submarina para monitorizar o ruído que tem efeitos nocivos no oceano.
“Um deles é abafar sons biologicamente relevantes, por exemplo as baleias têm alguns comportamentos bioacústicos que têm como fim comunicar com outros pares para acasalamento ou para socializar. Se existir ruído antropogénico em simultâneo, esse raio vai ser diminuído de centenas para dezenas de quilómetros e isso reduz a probabilidade de acasalarem ou de socializarem, o que tem impacto na biodiversidade e bem-estar animal”, refere Cristiano Soares.
Pode, aliás, ser essa a explicação para os arrojamentos de baleias e golfinhos nas praias, adianta. “A comunidade cientifica começou a questionar o porquê e alguns episódios começaram a ser ligados a exercícios militares que envolviam ruído, sons muito potentes”, exemplifica o fundador da Marsensing. No plano nacional, e com este problema em mente, a empresa tem agora em mãos um projeto com o Ministério da Defesa, o SUB ECO, para monitorizar o ruído no mar português.