29 jun, 2018 - 17:08 • Marina Pimentel
“Há processos de crime económico, de muito relevante interesse público, que estão parados na Polícia Judiciária por falta de inspetores e de programas informáticos.” A denúncia é feita por António Ventinhas, presidente do Sindicato dos Magistrados Públicos, no programa Em Nome da Lei da Renascença.
Já o presidente da Associação Sindical dos Juízes alerta para outro tipo de problema, também ligado sobretudo ao chamado crime de colarinho branco. Manuel Soares diz que acontece "com demasiada frequência” as pessoas em Portugal cumprirem penas muito depois da prática dos factos e da condenação, porque usam de todos os expedientes de recurso que a lei põe à sua disposição. Cita o caso do atual presidente da câmara de Oeiras, que foi condenado em 2009 e que só foi para a cadeia em 2013.
Manuel Soares explica que, em Portugal, todos os recursos, mesmo para o Constitucional, têm efeito suspensivo do cumprimento da pena e que portanto “podemos ter arguidos que cumprem a pena oito e nove anos depois de terem sido condenados, mesmo não abusando dos seus direitos de defesa", explica. "Basta percorrerem as capelinhas todas.”
Na Grécia, quando a condenação é confirmada, a pena é logo cumprida. E em países como a Alemanha, os recursos para o Tribunal Constitucional não têm efeito suspensivo. Manuel Soares diz contudo que, na maior parte dos países europeus, o sistema é semelhante ao nosso.
O advogado Paulo Sá e Cunha concorda que em muitos casos o cumprimento da pena só ocorre largos anos após a condenação mas defende que essa circunstância “não pode levar-nos a pôr em causa o nosso quadro de direitos fundamentais, entre os quais a presunção de inocência”.
O jurista da Associação de Advogados Penalistas admite, no entanto, que “possa haver um problema com os recursos para o Tribunal Constitucional" e argumenta que "é a própria lei fundamental que impõe que o recurso sobre eventuais inconstitucionalidades relativas ao caso concreto tenha efeito suspensivo do cumprimento da pena”.
Paulo Sá e Cunha defende que não há excesso de garantias, “quando estão em causa direitos fundamentais, como o da liberdade”. O advogado penalista subscreve a ideia de que “é preciso promover a celeridade do processo penal" mas adverte que “não pode ser à custa da erosão dos direitos dos arguidos”.
Também questiona o tempo que os inquéritos demoram a estar concluídos em Portugal, sobretudo na área do crime económico, e diz que” há pessoas que há anos foram constituídas arguidas, não tendo sequer sido interrogadas”. Dá como exemplo o processo “Monte Branco” .
O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público defende que se deve atuar face ao facto de os recursos para o Tribunal Constitucional suspenderem o cumprimento da pena, uma vez não se trata de um recurso ordinário. Mas apenas se averiguam eventuais inconstitucionalidades na aplicação ou na interpretação da lei. Já António Ventinhas diz que “o Tribunal Constitucional está atualmente a ser usado com uma terceira via de recurso, o que representa uma perversão do que é a sua missão”.
São declarações ao programa Em Nome da Lei, para ouvir este sábado. A edição debate, sobretudo, se quem é condenado deve ser preso assim que a condenação é confirmada pela segunda instância, tal como aconteceu no Brasil com o antigo Presidente Lula da Silva.