27 set, 2018 - 13:07
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A imagem das Forças Armadas está a ser afetada pelo caso das armas de Tancos. O major general Raul Cunha questiona as circunstâncias de todo o processo e chama a atenção para várias coincidências.
“É uma coincidência que a Polícia Judiciária se tenha empenhado, de certa maneira, em denegrir uma força policial com a qual devia colaborar [a Polícia Judiciária Militar] e acho que é uma coincidência estranha que o próprio diretor da Polícia Judiciária Militar atual, que fez todo este trabalho, até era a pessoa que estava na altura a liderar a investigação no DCIAP [Departamento Central de Investigação e Ação Penal]”, afirma à Renascença.
“É assim. Põem-se os recursos todos que deviam estar a investigar uma série de coisas a investigar uma força congénere”, critica.
Por isso, este militar na reserva, que já foi conselheiro das Nações Unidas e juiz no Tribunal Militar, questiona se, por trás das decisões tomadas, não estará a intenção de extinguir a Polícia Judiciária Militar (PJM).
“A Polícia Judiciária Militar tem que existir. Aliás, nos países mais evoluídos e até mais civilizados, existem até ao nível dos ramos. O Exército mais poderoso do mundo tem uma polícia de investigação criminal ao nível de cada ramo das Forças Armadas, distinta das polícias civis. E colaboram uns com os outros e respeitam-se uns aos outros. Só aqui é que temos esta tendência terceiro-mundista das quintas e o que é investigação criminal é nosso e, de uma assentada, a polícia Judiciária consegue denegrir a investigação criminal da GNR e a Polícia Judiciária Militar. Fantástico”, ironiza.
E vai mais além. Haverá aqui uma situação de vingança?
“Conheço bem o diretor da Polícia Judiciária Militar [coronel Luís Vieira], é um homem de uma integridade a toda a prova, é um escrupuloso cumpridor das regras e por isso ainda mais me admira. Tudo isto parece envolvido numa névoa que não me parece boa, não sei porquê fiquei imediatamente com a sensação de que haveria aqui algum tipo de vingança”, sugere.
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Raul Cunha diz que continua a acreditar na inocência do coronel, até porque recuperar as armas era o mais importante.
“Terá sido uma decisão errada? Talvez. Eu, se calhar, teria atuado da mesma maneira. Por outro lado, penso que a própria Polícia Judiciária Militar terá atuado convicta de que lhe competia estar a lidar com o assunto, com uma certa rapidez e, sobretudo, tentando preservar as coisas”, afirma.
O diretor da PJM é acusado dos crimes de associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder, recetação, detenção de arma proibida e tráfico de armas.
Joana Marques Vidal “estragou o seu mandato”
Em declarações à Renascença, o major Raul Cunha acusa a ainda procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, de conduzir mal a investigação que levou à detenção “com todo o aparato” de oito pessoas.
“Penso que não havia necessidade. Penso que procuradora-geral da República estragou até o seu mandato, que estava prestes a terminar e que decorreu com algum nível. Tudo isto poderia ter sido conduzido com muito mais lisura e de outra maneira”, defende.
Segundo Raul Cunha, a Polícia Judiciária Militar nunca deveria ter sido afastada da investigação ao furto das armas de Tancos.
“O mal começa aí, no meu entender. Durante uns anos tive de lidar com o Código de Justiça Militar e com as leis que estão apensas a esse código e a lei é clara: as investigações de crimes estritamente militares ou de crimes ocorridos no interior das unidades militares é uma investigação reservada à Polícia Judiciária Militar”, afirma.
Na terça-feira, a Polícia Judiciária deteve oito pessoas, quatro delas da PJM, incluindo o seu diretor. Foram ainda detidos três militares da GNR e um outro indivíduo, suspeito de ter roubado as armas.