12 out, 2018 - 21:57 • Joana Gonçalves
Numa história já comparada a uma sitcom, muito tem sido dito e desmentido. Ao longo destes 15 meses, marcados por avanços, recuos e muitas contradições, estas são as 5 questões que ainda estão por responder.
Tancos: O que sabe afinal Azeredo Lopes?
A 29 de junho de 2017 era anunciado o desaparecimento de material militar dos Paióis de Tancos. Cinco dias depois, a 4 de julho, a investigação é entregue à Polícia Judiciária em colaboração com a Polícia Judiciária Militar.
No dia 18 de Outubro, já depois de o agora cessante ministro da defesa ter afirmado que “no limite, pode não ter havido furto”, o material de guerra é encontrado na zona da Chamusca e recuperado pela PJ Militar e GNR de Loulé.
Estava então traçado o início de uma história que acabaria por resultar na detenção do diretor da PJ militar, coronel Luís Vieira, três militares da GNR de Loulé, três membros da PJM e ainda um civil, o ex-fuzileiro João Paulino, principal suspeito do furto.
Numa investigação comandada pela Polícia Judiciária civil surgem as primeiras provas do encobrimento do(s) autor(es) do roubo de Tancos e de uma encenação da operação de “resgate” do material militar então encontrado.
Cinco dias mais tarde é também detido o ex-porta-voz da PJ militar, major Vasco Brazão, que no dia seguinte revela ao juiz de instrução que não só terá participado no processo de encobrimento do alegado autor do furto, como terá também informado o Ministério da Defesa de toda a operação. Uma informação que terá sido transmitida ao executivo, no mês seguinte ao aparecimento do material militar na Chamusca, em novembro do ano passado.
Azeredo Lopes negou ter qualquer conhecimento “direto ou indireto” sobre a operação e voltou a reforça-lo na carta de demissão que esta sexta-feira enviou a António Costa. Já o tenente-geral Martins Pereira, chefe de gabinete do então ministro da Defesa, confirmou, numa primeira versão, ter recebido o documento que alegadamente dá conta de todo o processo, mas garantiu que não lhe ter sido "possível descortinar qualquer facto que indiciasse qualquer irregularidade ou indicação de encobrimento de eventuais culpados do furto de Tancos".
Desmentido por Vasco Brazão, que entretanto pediu para ser, de novo, ouvido pelo DCIAP, para que fosse entregue uma cópia do documento original, Martins Pereria veio então corrigir as primeiras declarações e anunciou a entrega do memorando ao DCIAP. Por enquanto fica dúvida face ao conteúdo dos dois documentos.
Entretanto, também o ex-diretor da PJM, um dos oito arguidos deste caso, apresentou uma versão diferente dos factos. De acordo com o coronel Luís Vieira, a reunião no Ministério da Defesa aconteceu, mas não terá sido entregue nenhum documento ao chefe de gabinete de Azeredo Lopes.
Três testemunhas, duas versões. Resta saber se o ex-ministro da Defesa sabia ou não da operação e, se se confirmar esse alegado conhecimento, que consequências jurídicas enfrentará.
Quem são os autores do furto?
A operação “Húbris”, tem nove arguidos: o diretor e o ex-porta-voz da PJ militar, três militares da GNR de Loulé, três membros da PJM e um ex-fuzileiro.
Até ao momento sabe-se que o principal suspeito do furto é o único civil envolvido no processo, João Paulino. Os restantes arguidos são suspeitos de encobrimento do alegado culpado e de encenação da operação de recuperação do material militar, em outubro de 2017.
Entre o material furtado estariam granadas, explosivos e uma grande quantidade de munições. É compreensível, por isso, que se questione como é que um homem terá conseguido, sozinho, retirar todo este material de uma instalação militar vigiada.
Quem deve ser responsabilizado pela falta de segurança nos Paióis?
Uma questão de segurança nacional. É desta forma que tem sido frequentemente apelidado o polémico caso do assalto aos Paióis de Tancos.
Envolvimento de militares ou uma grave falha de vigilância? A questão marcou durante meses a opinião pública. Agora sabe-se que a segunda opção é factual, mas deve descartar-se a primeira?
No início deste ano o Exército deu por terminados os processos disciplinares abertos meses antes. Foram castigados quatro militares. De acordo com o jornal Público, a pena mais grave foi aplicada a um sargento que enfrentou proibição de saída da unidade por 15 dias.
Nenhum destes quatro militares foi diretamente responsabilizado pelo desaparecimento das armas. Hoje demitiu-se o ministro da Defesa, que nega qualquer conhecimento da operação.
O ex-diretor da PJM, coronel Luís Vieira, está em prisão preventiva e o major Vasco Brazão, em prisão domiciliária. Os restantes seis arguidos estão em liberdade, sujeitos a termo de identidade e residência, suspensão do exercício de funções e proibição de contacto com os coarguidos ou quaisquer militares das Forças Armadas, GNR e elementos Polícia Judiciária Militar.
A investigação, que agora decorre no Ministério Público, procura dar resposta ao episódio do aparecimento do material militar. Fica por esclarecer quem deverá ser responsabilizado pelo desaparecimento, que originou esta novela.
E o material?
Parece que passou para segundo plano.
A 2 de julho de 2017, três dias depois do desaparecimento do armamento dos Paióis de Tancos, o jornal El Español publicava uma lista material desaparecido: centenas de granadas, dezenas de explosivos, quase milhar e meio de balas de calibre 9mm e perto de meia centena de granadas antitanque.
No mesmo dia, o Exército confirma o inventário.
A 18 de outubro o material é encontrado na Chamusca. Na altura, o Exército mencionou uma chamada anónima que teria dado conta do local onde estaria o material. Hoje sabe-se que a chamada foi feita por um elemento da PJ militar e que o material foi transportado para o local numa carrinha da mesma organização.
Entre o material devolvido estava também uma caixa de petardos que não tinha antes sido dada como desaparecida.
Até hoje a lista do material estava em segredo de justiça. Ao início da noite, a Procuradora-Geral da República, que hoje passa a pasta à sucessora Lucília Gago, revelou que vai suspender o segredo de justiça no caso de Tancos, segundo adianta a SIC.
Esta é, por isso, uma pergunta cuja resposta poderá estar para breve.
A reputação de Portugal permanece intacta?
A 7 de julho de 2017, Azeredo Lopes garantiu que sim. Marcelo Rebelo de Sousa parece não estar tão certo.
Desde o primeiro dia, o Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas assumiu o caso como “grave” e apelou ao eficaz apuramento dos factos.
Durante as celebrações do 5 de outubro, Marcelo Rebelo de Sousa reforçou a sua posição, “tem de se respeitar aquilo que é o apuramento da verdade e de eventuais responsabilidades”. Uma mensagem que não chegou a Azeredo Lopes, já que o então ministro da Defesa escapou à cerimónia.
Há dois dias, o Chefe de Estado repetiu a ideia, talvez por consideração à anterior ausência do Executivo, “às tantas fala-se da devolução, mas para haver devolução é porque elas primeiro foram furtadas. Quanto às duas situações, deve ser apurado integralmente, doa a quem doer".
É possível que, desta vez, Azeredo Lopes tenha ouvido.