26 out, 2018 - 11:30
O presidente da Mobinov, José Couto, marcou o início dos trabalhos da Conferência Internacional do Futuro da Mobilidade (CIFMOB), que decorre esta sexta-feira na Alfândega do Porto, ao lançar uma dúvida sobre aquilo que muitos encaram sobre o futuro: “Eu não punha as fichas todas nos veículos elétricos."
O economista que lidera aquele "cluster" do setor automóvel em Portugal acredita que a inovação dos carros elétricos é essencial e deve ser mais trabalhada, mas sublinha que as pessoas têm de tomar a maior iniciativa. Esta opinião é também subscrita pelo diretor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), João Falcão e Cunha: “A tecnologia tem de obedecer aos padrões da sociedade. Por exemplo, ontem vi um carro eléctrico. O problema vai ser ver se amanhã: ele estaciona em segunda fila.”
O diretor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) vincou que é fundamental pensar além da simples inovação dos engenheiros e pede que a profissão reflita de forma mais política, porque, no futuro, a tecnologia nada vai mudar se não se tentar mudar as mentalidades dos consumidores. “Antes, havia engarrafamentos de carruagens. Depois, passaram a ser de carros. No futuro, não sabemos, mas temos de trabalhar para melhorar essa situação”, advertiu.
O presidente do Instituto Superior Técnico (IST), Arlindo Oliveira, sublinhou um ponto que será indesmentível: a forma como nos deslocamos nos dias de hoje é insustentável e exige uma mudança de hábitos de consumo para salvar o planeta.
“Se cada ser humano tivesse a mesma atitude, bastava fazer dois voos transatlânticos e já gastávamos metade da vossa quota do Acordo de Paris. Conduzir 20 mil quilómetros gasta metade da quota. Comer o que comemos durante um ano gasta metade da quota. Mantermos um estilo de vida vagamente semelhante ao que temos é insustentável no que toca às emissões de carbono, para não falar do desperdício e da poluição dos oceanos”, apontou o presidente do IST.
“Tudo o que temos à volta foi pensado e concebido por engenheiros"
A adoção das novas tecnologias, as já existentes e as que possam surgir, nas cidades é, segundo a generalidade dos especialistas presentes na Alfândega, o grande problema até 2050, especialmente pelo investimento que necessita. “Há bolhas financeiras e políticas. Toda a retórica dependerá comercialmente das opções dos governos. Vão-se criar 'clusters' sobre o uso das tecnologias, antes da massificação”, prevê Miguel Monjardino, especialista em Geopolítica e Geoestratégia.
Monjardino afirma que os próximos anos serão “uma época de enorme ruído político”, devido aos problemas ambientais interligados com a política e a economia. E Arlindo Oliveira completou a ideia, recorrendo a um "velho" discurso que passa aos seus alunos no IST: “Tudo o que vocês têm à vossa volta foi pensado e concebido por engenheiros. Não quero dizer que o resto não é importante, mas todos consomem os produtos de engenharia”.
Ouvem-se risos na plateia e o presidente do IST esclarece. “Sou, obviamente, enviesado”. Mas continua a explicação, deixando claro que é preciso repensar o investimento na tecnologia, sob o risco de ficarmos para trás no mundo. “Portugal e os outros países têm de perceber que a sua competitividade económica a longo prazo depende da sua capacidade tecnológica. Acho que não temos investido o suficiente nisto.”
Arlindo Oliveira tocou num ponto ético, em torno dos carros elétricos, admitindo que compreende o ceticismo de muitos, uma vez que, em situações de risco, “o carro elétrico não terá os mesmos instintos de um ser humano”. Isso, todavia, não é, para o especialista, motivo para desistir destes automóveis. “Estas questões têm de ser abordadas muito mais clara e explícita", rematou.
A CIFMOB realiza-se durante esta sexta-feira e contará ainda com painéis que vão continuar a discutir questões sobre a temática da mobilidade urbana e dos transportes públicos no futuro.