02 nov, 2018 - 07:52
A associação pediátrica do Hospital de São João, no Porto, está a estudar a apresentação uma queixa-crime contra quem mandou parar a obra da ala pediátrica.
“Há de ser o ministro das Finanças, o ministro da Saúde, o presidente do conselho de administração, a atual ministra enquanto presidente da ACSS, todas as pessoas envolvidas que estejam a entravar o procedimento da obra”, afirma à Renascença o presidente da associação.
Jorge Pires diz que o objetivo é “fazer alguma coisa que nunca foi feita em Portugal, que é tentar responsabilizar quem toma atitudes governamentais, mas não quer saber das consequências”.
“Qualquer particular, se tomar uma atitude má na empresa, a empresa fecha e leva com as consequências todas, normalmente. No Estado, tomam-se as atitudes, as consequências vêm e nunca há um responsável. Temos uma obra que começou em 2015, foi parada por este Governo e por este presidente do conselho de administração quando tomaram posse e, para além disso, agora vêm com ‘fait-divers’ de procedimentos concursais, concursos para isto e para aquilo e andamos aqui no empurra para a frente e ninguém faz nada”, critica.
Jorge Pires lembra que as crianças estiveram internadas em contentores “miseráveis” desde 2011 e que o assunto tem andado em pára-arranca.
O hospital de dia pediátrico do São João “funcionava num corredor”, passou em junho “para o edifício central”, mas “as instalações do internamento, onde as crianças dormem e estão isoladas quando fazem quimioterapia. Eram miseráveis e continuam miseráveis”, afirmou à agência Lusa, acrescentando: “As crianças não têm culpa das politiquices ou da incompetência dos políticos”.
Falando em políticos, “a nova ministra da Saúde, no dia 1 de junho de 2017, assinou um memorando juntamente com a Administração Regional de Saúde do Norte e o hospital de São João da urgência da construção da ala pediátrica, até têm o cronograma da despesa”, recorda o também porta-voz da Associação Pediátrica Oncológica do Hospital de São João nas declarações à Renascença.
“Se não fossem os pais, em abril de 2018, virem falar sobre o assunto – porque este assunto voltou à ordem do dia em abril de 2018 – nada tinha sido feito e só quem vive a realidade ali dos contentores é que percebe o problema realmente grave que ali está – um problema de saúde pública do Porto cidade e do Norte em geral, porque aquele hospital recebe crianças do Norte inteiro”, defende.
A paciência chegou, portanto, ao fim, admite. Não existe ainda uma data para a queixa-crime dar entrada – “temos os juristas a tratar disso” – mas “terá de ser o mais rápido possível para as obras começarem”.
“Se as obras começarem, é o que nós queremos” e o “objetivo fica cumprido” sem necessidade de queixa.
Mas, afinal, o que está em causa?
O presidente da APOHSJ explica estar em causa “todo o internamento pediátrico”, instalado em contentores, onde as crianças com cancro surgem como “a parte mais sensível” do problema por estarem “imunodeprimidas” e a “lutar contra o tempo, que muitas vezes não existe”.
“Quando vemos as pessoas a mentirem todos os dias e a nada quererem fazer, ou baixamos os braços e morrem crianças ou temos de fazer alguma coisa para que as coisas mudem”, justifica.
As “instalações são péssimas”, diz Jorge Pires: “quartos sem cortina ou janelas calafetadas” e “espaços para tomar banho sem condições de isolamento ou higiene”.
“Quando as crianças estão nos contentores e precisam de fazer um exame, têm de viajar para o edifício central em ambulâncias com condições indescritíveis. Os lençóis que as cobrem andam aos caídos dentro da ambulância”, descreve.
“Como é que é possível haver o descanso das pessoas que mandaram parar a obra?”, questiona.
A 24 de outubro, o primeiro-ministro disse que o reforço do orçamento da Saúde permitirá "avançar com o lançamento" do concurso para a nova ala pediátrica do Hospital de S. João, ao passo que a nova ministra da tutela, Marta Temido, afirmou ainda não haver data para o procedimento.