20 mar, 2019 - 23:10 • Lusa
A procuradora-geral da República defendeu esta quarta-feira que um "facto ainda que grave" na atuação da Polícia Judiciária Militar (PJM) no caso do furto de Tancos não deve comprometer "todo o trabalho de qualidade" daquela polícia. Lucília Gago falava um dia depois de a ex-procuradora Joana Marques Vidal ter questionado a existência daquela força.
"A circunstância de ter ocorrido um facto, ainda que grave, envolvendo quadros da Polícia Judiciária Militar, não permite referir que será por esse facto que se deve comprometer todo o trabalho de qualidade que a maioria, certamente, dos elementos da PJM, vêm desenvolvendo ao longo de anos e em centenas e milhares de processos", declarou.
A PGR, que respondia na comissão de inquérito ao furto de material militar de Tancos, frisou que nunca lhe foi "reportado", desde que iniciou funções, em outubro de 2018, "qualquer juízo de desvalor relativamente à prestação" daquele órgão de polícia criminal.
Sobre a atuação da PJM no caso concreto de Tancos e no processo que levou ao "achamento" de parte do material militar furtado, Lucília Gago considerou que "parece óbvio" que aquela polícia não podia interferir num processo que estava atribuído à Polícia Judiciária.
Questionada sobre a necessidade de alterar o atual regime legal, reconsiderando o papel da PJM, Lucília Gago advertiu para os riscos de uma "precipitação", reforçando que a "circunstância de haver um ato, ainda que grave, que não respeitou a lei, não permite concluir por si só que deva esse regime no seu todo objeto de alteração".
Independentemente de ser possível "uma alteração ou aperfeiçoamento do regime", Lucília Gago defendeu que não deve ser "imediatamente equacionável como boa esta ou aquela solução".
"É muito comum que, perante algo que corre menos bem, haver a tendência de alterar a legislação que nos rege. Julgo que não será um bom caminho", disse.
Questionada pelo PS, a PGR recusou que tenha havido alguma "descoordenação" entre a Polícia Judiciária e a Polícia Judiciária Militar, afirmando que "a ter havido algo, terá sido uma desconformidade de atuação de um dos OPC's [órgãos de polícia criminal] e só".
"Não se trata de descoordenação. Chamemos-lhe sobreposição de papéis em termos indevidos. Em incumprimento das normas processuais aplicadas", frisou.
Para Lucília Gago, o atual modelo de coordenação "não merece qualquer reparo".
Numa audição terça-feira passada, a ex-PGR, Joana Marques Vidal, considerou ilegal a intervenção da PJM no dia em que foi recuperado parte do material militar, em 18 de outubro de 2017, quatro meses após o furto dos paióis de Tancos, por ter feito diligências sem as comunicar nem à Polícia Judiciária (PJ), que liderava a investigação, nem ao Ministério Público.
O furto do material militar, entre granadas, explosivos e munições, dos paióis de Tancos, foi noticiado em 29 de junho de 2017 e parte do equipamento foi recuperado quatro meses depois.
O caso ganhou importantes desenvolvimentos em 2018, tendo sido detidos, numa operação do Ministério Público e da PJ, sete militares da Polícia Judiciária Militar e da GNR, suspeitos de terem forjado a recuperação do material em conivência com o presumível autor do crime.
Este processo levou à demissão, ainda em 2018, do ministro da Defesa Nacional, José Azeredo Lopes, e do chefe do Estado-Maior do Exército, general Rovisco Duarte.
A comissão de inquérito para apurar as responsabilidades políticas no furto de material militar em Tancos, pedida pelo CDS-PP, vai decorrer até junho de 2019, depois de o parlamento prolongar os trabalhos por mais 90 dias.