22 mar, 2019 - 00:44 • Redação
A Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) recebeu 346 denúncias em 2018, quase o dobro em relação a 2017. As queixas aumentaram significativamente a partir de 2016.
Segundo os dados divulgados pelo Alto Comissário para as Migrações, Pedro Calado, no ano passado foram feitas 346 denúncias em Portugal por discriminação racial e étnica, o que equivale a quase o dobro das recebidas em 2017, ano que se registaram 179.
Das queixas apresentadas, apenas 53 originaram processos de contraordenação, porém a maioria não teve resultados criminais, uma vez que apesar de haver indícios de discriminação, não havia elementos que abrissem um processo.
Das denúncias resultaram sete condenações, entre elas quatro multas, duas reprimendas e uma indeminização civil.
Este é também o primeiro ano em que se assinala o dia Nacional para a Eliminação da Discriminação Racial, decretado o ano passado em Parlamento.
A importância da mudança da lei
Existem várias organizações que denunciam casos de discriminação em Portugal, quer seja por motivos raciais, quer seja étnico.
A assessora técnica do Gabinete de Apoio à Vitima do Porto (APAV), Rita Bessa, quando questionada sobre a importância da alteração da lei sobre a discriminação racial, que passou a permitir, por exemplo, que tanto vítimas como testemunhas, fizessem a queixa, sublinha que a alteração foi relevante, uma vez que “as situações que não eram consideradas tão graves, ou de violência, não estavam criminalizadas”.
Rita Bessa lembra que existem várias situações de discriminação, que não são vistas como tal por “não serem de uma forma tão direta”. A dificuldade em identificar como discriminação muitas vezes inviabiliza a criminalização.
“Imaginemos situações muito subtis que acabam por ser uma discriminação indireta. Existe muitas vezes essa dificuldade em identificar”, explica Rita Bessa.
É precisamente devido à dificuldade que existe em provar e em identificar alguns tipos de discriminação, que maior parte dos processos-queixa não resultam em condenação. A assessora exemplifica com anúncios de arrendamento habitacional, que muitas vezes é negado a cidadãos estrangeiros. Rita Bessa afirma que este é um do tipo de casos mais “subtil” e “que chegam mais até nós [APAV]”.
No entanto, o aumento de queixas, principalmente nos últimos três anos, não implica necessariamente um aumento do racismo em Portugal. Para justificar a situação, Rita Bessa lembra que a lei foi alterada e que, ao mesmo tempo, “as pessoas estão mais informadas e consciencializadas à cerca dos seus direitos”.
Para além disso, sublinha a reputação positiva de Portugal no acolhimento a migrantes, dizendo que não acredita que o país, na generalidade, seja racista.
Trabalho, o pior local
As denúncias feitas até 2015 eram essencialmente por discriminação em contexto laboral. A partir de 2017 a situação inverteu-se, passando maioritariamente para o comércio e o online.
Em relação ao online, a assessora técnica acredita que a forte liberdade e utilização das redes sociais está a agravar a discriminação, por via de “algum tipo de linguagem que é usada nos comentários”. Por isso mesmo, defende a educação dos jovens, já desde o pré-escolar, para promover a tolerância e mostrar que mesmo sendo todos iguais, existem diferenças em cada um.
É precisamente para desmistificar mitos que foram criados ao longo dos anos, que Rita Bessa defende a relevância das atividades lúdicas nas escolas para “trabalhar estas questões” e também “uma forma de estar consciencializados e mais tolerantes.”
A assessora lembra que até há poucos anos, nas escolas, era identificado um lápis de colorir como “cor de pele”, sendo que isto criava estereótipos, pois a cor da pele é diferente de pessoa para pessoa.
A APAV tem gabinetes de apoio à vítima migrante, mas também de discriminação. Faz um apoio prático, emocional, social e jurídico, para auxiliar as vítimas nestas questões. Os serviços são gratuitos e confidenciais.