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Casa do Douro volta a ser pública. Solução não agrada a todos

11 abr, 2019 - 12:49 • Olímpia Mairos com Lusa

A instituição da lavoura duriense volta a ser uma associação pública de inscrição obrigatória. Alguns concordam com a decisão, mas há quem a considere uma "machadada na região".

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Longe vão os tempos em que a Casa do Douro, no Peso da Régua, era uma instituição mais credenciada. Criada em 1932 pelo Estado Novo, tinha como objetivos intervir na regulação do mercado e prestar um conjunto de serviços socioprofissionais aos viticultores da Região Demarcada do Douro, com competências atribuídas pelo Estado.

A instituição da lavoura duriense foi perdendo competências com o passar dos anos, ao mesmo tempo que ia acumulando dívidas. Só ao Estado, a dívida atingiu os 160 milhões de euros.

Para tentar resolver o problema, o anterior Governo, liderado por Pedro Passos Coelho, preparou um plano que incluiu uma alteração legislativa, transformando o estatuto de direito público e inscrição obrigatória em associação de direito privado e de inscrição voluntária.

Assim, em dezembro de 2014, a natureza pública da instituição foi extinta e foi posteriormente aberto um concurso para a gestão privada da instituição, que foi ganho pela Federação Renovação do Douro.

Recentemente, a Assembleia da República aprovou um projeto de lei conjunto do PS, BE, PCP e PEV que restaura a Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória.

A solução conjunta, aprovada pelos quatro partidos, contou ainda com o voto a favor de Manuela Tender, deputada do PSD eleita pelo distrito de Vila Real.

O documento aprovado também “anula a inscrição do edifício da sede da Casa do Douro no Peso da Régua, distrito de Vila Real, a favor de qualquer outra entidade”.

"Grande consenso"

Os deputados socialistas eleitos por Vila Real, Francisco Rocha e Ascenso Simões, congratularam-se com esta solução conjunta, com Francisco Rocha a afirmar em comunicado que “hoje é um dia feliz, porque estamos a culminar um processo político longo que exigiu ponderação, participação diálogo, para alcançar consenso alargado”.

O deputado socialista realça ainda “o grande consenso em torno da proposta”, não só “com os partidos de esquerda, mas também com o PSD (…), pela voz dos seus autarcas representados na Comunidade Intermunicipal (CIM) do Douro”.

A solução conjunta que restaura a Casa do Douro como associação pública e de inscrição obrigatória prevê a realização de eleições 150 dias após a publicação da nova lei em Diário da República.

Até à realização de eleições para a constituição dos novos órgãos sociais, mantém-se em funções a comissão administrativa, criada em 2016 pelo Governo de António Costa, para a regularização das dívidas e da situação dos trabalhadores.

A nova Casa do Douro, a quem caberá a representação dos viticultores junto de entidades públicas e privadas, terá como órgãos um conselho geral, a direção, o conselho de direção e um fiscal único, designado por despacho conjunto dos membros do Governo com a tutela das Finanças e da Agricultura.

Uma medida “inqualificável”, uma “machadada na região” e uma “afronta”

A Casa do Douro como associação pública e de inscrição obrigatória para os viticultores durienses não agrada, contudo, a vários setores.

Em declarações à Lusa, o presidente da Associação das Empresas de Vinho do Porto (AEVP) classificou a medida como “inqualificável” e uma “machadada na região”.

“Obviamente que isto preocupa as empresas, porque a região estava calma, serena, e isto vai novamente criar muitas divisões dentro da região. O que mais me preocupa é que parece que o PS e os partidos de esquerda venderam o Douro em troca de algum acordo eleitoral, porque as eleições estão à porta”, afirmou António Saraiva.

Também António Lencastre, da Federação Renovação do Douro que representa produtores durienses, considera a nova lei como uma “afronta” e avança que o caminho a seguir é o pedido de inconstitucionalidade.

A Federação Renovação do Douro ganhou a gestão da Casa do Douro (CD), mantendo a sede da instituição que passou de associação pública a privada, após a extinção da natureza pública da instituição, em dezembro de 2014.

Segundo António Lencastre, a nova lei impõe um “retrocesso legal e estatutário” e foi feita “à revelia dos viticultores, menorizando-os e retiram-lhes a possibilidade de se associarem de forma livre”.

“Obrigar os viticultores à inscrição obrigatória, à representação forçada e ao pagamento involuntário de quotas é uma deriva antidemocrática e constitui uma opção claramente divergente de todas as diretivas comunitárias”, acusa o dirigente.

A restauração da Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória é também contestada pela CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal) que aponta “eventuais motivações ideológicas e partidárias” na reversão estatutária de 2014.

Em comunicado a confederação de agricultores lamenta o “retrocesso iminente” e esclarece que “atualmente, o sistema de gestão da Casa do Douro está fundamentado na atividade de uma federação de agricultores, estando a gestão do benefício” e do cadastro garantidas pelo Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto (IVDP)”.

E, segundo a CAP, esta é “uma solução estável, sustentada por um quadro de valorização dos vinhos da região e de recuperação da imagem e da economia associada aos vinhos do Porto e Douro”.

Para a Confederação dos Agricultores de Portugal, a restauração da Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória “representa o regresso ao passado, sem qualquer vantagem acrescida face à situação atualmente em vigor, garantida por um estatuto baseado no direito privado e de inscrição voluntária”.

“Esta solução vem retirar a liberdade de associação aos viticultores do Douro, o que constitui uma situação inaceitável e redutora do livre associativismo, desvirtuando, em absoluto, o valor da democracia e da livre iniciativa”, conclui a CAP em comunicado.

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