16 mai, 2019 - 00:00 • Eunice Lourenço e Ana Maia (Público)
O presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, Alexandre Lourenço, mostra-se preocupado com os últimos casos denunciados na Saúde e do ruído que se tem gerado em torno da Saúde. Numa entrevista conjunta ao Público e à Rádio Renascença, que vai esta quinta-feira para o ar às 13 horas, o responsável afirma a discussão sobre a nova Lei de Bases da Saúde não resolve os problemas dos portugueses.
Acha que a revisão da lei de bases pode ajudar à maior autonomia e a
mais investimento?
Os portugueses não conseguem entender esta discussão da Lei de Bases. Acho que
é uma questão mais política do que propriamente uma questão de resolução dos
problemas dos portugueses. Aliás, esta discussão da Lei de Bases não traz nada
de novo nem de concreto. Esta discussão não resolve problemas concretos dos
portugueses, que são quando não têm capacidade financeira para ir a uma
consulta ou quando vão a uma farmácia e não têm dinheiro para pagar
medicamentos. Sabemos que as despesas directas dos portugueses em saúde são
muito elevadas, chegam praticamente a um terço da despesa total em saúde, e a
Lei de Bases em si devia resolver e limitar os problemas do acesso a cuidados
de saúde.
O que tem estado mais no centro da discussão é a questão das
parcerias público-privadas (PPP). Qual é a sua posição?
A associação não tem nenhuma posição concreta sobre as PPP. Agora, parece-nos
claro que as PPP têm apresentado melhores resultados que os hospitais entidades
públicas empresariais (EPE). Isso decorre do facto de terem um elevado grau de
autonomia na gestão interna. Coisa que actualmente os hospitais de gestão
pública directa não têm e que se vêem limitados na sua capacidade.
Então a solução não será acabar com as PPP, mas aplicar os critérios
de autonomia das PPP à gestão pública.
Exactamente.
Como vê as denúncias relacionadas com o Hospital de Cascais, feitas
por actuais e antigos profissionais, da administração falsear dados clínicos,
em termos de sistema de triagem nas urgências e em termos de internamento,
valorizando sintomas que no momento não são importantes?
No caso do serviço de urgência, é com elevada preocupação que vimos esta peça.
Será importante ter todos os esclarecimentos, quer do conselho de administração
do hospital, quer o ministério público, quer da Inspecção-Geral das Actividades
em Saúde, e apurar todas as responsabilidades desse processo.
Este caso pode ter implicações num concurso futuro para aquele hospital?
Creio que devemos ter muito cuidado com o tipo de contratos e modelo de
pagamento que fazemos com os hospitais. Este tipo de modelos, de fazer depender
de uma avaliação única o volume de pagamento que recebem — aliás, vimos isto no
caso da ADSE —, leva a comportamentos anómalos por parte dos prestadores.
E como explica situações, como outra que denunciada recentemente, de
casos de doentes do Algarve que não fizeram as análises necessárias no IPO de
Lisboa por falta de garantia de pagamento?
O conselho de administração do IPO de Lisboa veio prestar esclarecimentos sobre
isso. Não percebemos claramente o que sucedeu, mas existiu uma burocracia que
impediu os doentes de ter acesso a alguns exames complementares de diagnóstico.
Isso não deve ser tolerável no sistema de saúde e numa rede que é o SNS. Todas
as organizações devem funcionar em cooperação.
Tem conhecimento de mais casos?
Não conheço mais casos.
Isto não é um exemplo de como os hospitais estão tão pressionados
pelas questões financeiras que a burocracia de impõe?
Efectivamente são pressionados por questões financeiras. Agora, os doentes não
devem ter esse impacto no seu dia-a-dia. Deve existir um modelo de encontro de
contas entre estes hospitais para acertarem contas entre eles. A questão
financeira não pode ser um justificativo da limitação do acesso aos cuidados.
Como vê os últimos números da mortalidade infantil e materna? Há
falhas na cobertura de saúde?
Deveremos analisar caso a caso e perceber o que é que sucedeu em cada uma das
situações. Se ocorreram em maternidades públicas, se em privadas, se em
maternidades com menos de mil partos ou com mais de mil partos, que equipas
estavam disponíveis naquele momento, a que horas se realizaram aqueles partos e
apurar responsabilidades. É uma obrigação do Ministério da Saúde averiguar caso
a caso e o que esteve por trás de cada uma destas mortes, que são preocupantes.