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Convenção dos Direitos das Crianças

"Queremos ouvi-las." Juízes visitam reclusas "que se agarram ao amor de um filho"

20 nov, 2019 - 16:27 • Liliana Monteiro (texto e fotos)

A propósito do Dia Mundial da Convenção dos Direitos das Crianças, Associação Sindical de Juízes visitou duas prisões e ofereceu prendas às crianças e às reclusas grávidas. Direção Geral da Reintegração e Serviços Prisionais pondera alargar visitas a famílias completas e durante mais tempo.

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No dia em que se assinalam os 30 anos da Convenção dos Direitos das Crianças, a Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP) visitou dois estabelecimentos prisionais onde as crianças vivem com as mães até aos três anos de idade. A Norte, a visita deu-se na cadeia feminina de Santa Cruz do Bispo (onde vivem 11 mães e filhos). Mais a sul, a Renascença acompanhou a visita ao Estabelecimento Prisional de Tires.

Carla Oliveira, secretária-.geral da ASJP, confessa que "é totalmente diferente estar aqui, a realidade não é nova porque sabemos o que acontece quando decretamos pena de prisão a um arguido, mas vir ver o sofrimento e o dia a dia destas crianças, apesar de estarem com a mãe não deixam de estar prisioneiras, e pensar no que acontecerá quando tiverem três anos, as condições e o que as mães sentem é duro, não é fácil".

Na ala prisional destinada a mulheres com filhos vivem por estes dias 18 crianças com as respetivas mães e ainda duas mulheres grávidas. Algumas não são portuguesas e a reclusão torna-se para elas ainda mais difícil.

A visita começou pela creche onde todos os menores permanecem entre as 9 da manhã e as cinco da tarde. São três salas, uma dos 6 aos 12 meses, outra dos 12 aos 24 meses e por fim uma última até aos 36 meses. À entrada pode ler-se: "Aqui cada criança começa a agitar as asas e aprende a voar."

Os espaços estão minuciosamente decorados com muita cor, recortes, animais, mensagens positivas e brinquedos. À espera estão as mães, todas sentadas nas miniatura de cadeiras que existem na sala, e ao colo têm os seus filhos. Atentas, e algumas delas com olhar tímido, recebem a visita das duas juízas.

"Viemos porque para nós que somos juízes é importante conhecer também o lado de cá. Queremos ouvi-las e saber quais as dificuldades nesta fase da vossa vida e numa altura em que se agarram ao amor de um filho", afirmou a juíza Vânia Magalhães, vogal da ASJP.

A Associação Sindical de Juízes distribuiu brinquedos e bens de primeira necessidade a todas as crianças e às futuras mães. O momento fez a felicidade dos mais pequenos que rapidamente se apressaram a abrir os sacos. A par deste momento os adultos conversavam. Eram muitas as dúvidas que as juízas queriam esclarecer: Como é o dia a dia de cada uma das mulheres? Como são as celas? O que lá podem ter? O que fazem os menores? Como encaram esta fase da vida?

Uma reclusa prontifica-se rapidamente a responder. "Eu preferi logo que ela viesse para a creche, é muito melhor estarem aqui do que ficarem um dia inteiro fechados num pavilhão", disse, em referência à filha e às outras crianças. "Quando saem da creche damos-lhes banho e o jantar, tudo no nosso quarto, que eu não gosto de chamar de cela."

A filha desta reclusa, que entrou com ela para a prisão aos três meses, hoje tem um ano e meio e a mãe espera poder ficar com ela ali até aos três anos. "Gostava que a lei permitisse às crianças ficarem mais tempo com as mães na prisão. Sinto que a minha filha está bem aqui. Ela não chora quando vai à rua em visita à família e também não chora quando regressa porque para ela tudo isto é normal."

Após a partilha, as juízas quiseram saber o que gostavam as reclusas de ver alterado. A resposta não tardou. "Gostávamos de poder ter visitas em família. No meu caso o pai também está preso e a minha filha não sabe o que é ter a mãe, o pai e as irmãs, todos juntos."

A questão, garantiu Paula Costa, inspetora coordenadora da Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, está já a ser estudada. "É uma possibilidade muito real. Queremos promover os laços das crianças e estamos a ponderar um sistema de visitas alargadas com o resto da família e até durante mais tempo. Esta é uma possibilidade séria que está já em estudo."

A visita terminou já à porta das celas destas reclusas. Foi aqui que as juízas anunciaram que a cada reclusa tinha sido dada uma verba de 50 euros creditada na conta prisional de cada uma para gastos pessoais. O anúncio foi recebido com palmas e muitos sorrisos.

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