05 mar, 2020 - 16:45 • Pedro Mesquita com Redação e Lusa
O antigo ministro Miguel Poiares Maduro, signatário de um manifesto que pede a libertação de Rui Pinto, considera que o responsável pelo Futebol Leaks e pelo Luanda Leaks não deveria manter-se em prisão preventiva, classificando a medida de coação aplicada como "desproporcional".
"Parece-me desproporcional se atendermos àquilo que acontece noutros casos, incluindo de pessoas sujeitas a investigação ou já acusadas por crimes mais graves, relacionados, até, com denúncias feitas pelo próprio Rui Pinto", diz Poiares Maduro à Renascença.
"Reconheço e sei que é às autoridades judiciais que compete fazer esse juízo, mas posso, naturalmente, discordar dele e defender que ele é incorrecto e inapropriado", acrescenta.
Poiares Maduro sublinha que foram conhecidas "recentemente, investigações que parecem ter relação com aquilo que foi divulgado pelo Rui Pinto" pelo que "atendendo, quer ao crime de que ele é acusado quer à comparação com aquilo que acontece com pessoas acusadas de crimes mais graves, é dificilmente compreensível que ele esteja sujeito à medida de coação mais gravosa".
Questionado sobre que razões de fundo levam a Justiça a manter o jovem talento informático de Vila Nova de Gaia atrás das grades, o antigo ministro diz ter "algumas interpretações, algumas suspeitas quanto ao que pode estar por trás disso", mas alega que não pretende "especular".
"A partir do momento em que não tenho dados claros que me permitam tirar uma conclusão, seria inapropriado fazê-lo", argumenta, notando que a decisão da manutenção da prisão preventiva "pode até ter a ver com aspectos que não têm nada de conspirativo".
"O fundamental é que não se justifica a aplicação de uma medida de coação tão gravosa e é importante que a informação que ele tem possa ser utilizada pelas autoridades de investigação criminal e que haja cooperação com o Rui Pinto", remata.
José Eduardo Agualusa: "O Futebol Leaks nem sei o que é"
O escritor angolano José Eduardo Agualusa subscreve também o manifesto pela libertação de Rui Pinto "porque ele é denunciante do Luanda Leaks".
Em declarações à Renascença, Agualusa não esconde que tem a sua preocupação centrada no caso Luanda Leaks: "Eu entendo que esta pessoa possa ter infrigido a lei, ao entrar em computadores, mas a informação por ela recolhida tem uma relevância tal, que implica com a vida de milhões de pessoas, no caso Luanda Leaks. Estamos a falar de valores extraordinários que foram desviados e utilizados indevidamente."
"Isto diz-me muito por ser angolano, o resto não me interessa. Se quer que lhe diga, o Futebol Leaks nem sei o que é. Não me interesso por futebol", acrescenta.
"Uma pessoa que torna pública tanta informação relevante para o conjunto da sociedade, em particular para a sociedade angolana, não pode estar preso, deve estar a apoiar a Justiça, de forma a que estas situações sejam clarificadas e que as pessoas nelas envolvidas - essas sim - respondam perante a Justiça."
"A vida de milhões de angonados foi prejudicada devido a isso e se há uma pessoa que conseguiu aceso a documentos e que pode ter ainda mais informação e mais relevante, o que a Justiça tem a fazer é trabalhar com essa pessoa. O que eu gostaria é que ele viesse a trabalhar para a Justiça angolana", remata o escritor angolano.
Em prisão preventiva desde 22 de março de 2019, Rui Pinto, de 30 anos, foi detido na Hungria em 16 de janeiro de 2019 e entregue às autoridades portuguesas, com base num mandado de detenção europeu, que apenas abrangia os acessos ilegais aos sistemas informáticos do Sporting e da empresa Doyen, mas que depois viria a ser alargado a pedido das autoridades portuguesas.
Em setembro de 2019, o Ministério Público (MP) acusou Rui Pinto de 147 crimes, 75 dos quais de acesso ilegítimo, 70 de violação de correspondência, sete deles agravados, um de sabotagem informática e um de tentativa de extorsão, por aceder aos sistemas informáticos do Sporting, da Doyen, da sociedade de advogados PLMJ, da Federação Portuguesa de Futebol e da Procuradoria-Geral da República, e posterior divulgação de dezenas de documentos confidenciais destas entidades.