09 mar, 2020 - 18:49 • Tiago Palma
O Governo aprovou esta segunda-feira o Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo Coronavírus. O documento, de 80 páginas, define, partindo das orientações da Organização Mundial da Saúde e do Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças, a resposta (minimizando a doença grave, as mortes e os impactos sociais e económicos) a uma potencial epidemia pelo vírus SARS-CoV-2, que já infetou mais de 30 pessoas em Portugal.
Este documento é conhecido poucos horas depois de, em declarações à Renascença, o presidente do Conselho Nacional de Saúde (órgão consultivo do Ministério da Saúde), Henrique Barros, ter denunciado a falta (e divulgação) de um plano de contingência.
O documento recorda que a pandemia do vírus H1N1, em 2009, “representou o primeiro grande teste de Portugal ao seu trabalho e esforço de planeamento” e que, apesar de à época o SNS “ter sofrido constrangimentos”, a resposta foi positiva – como o foi noutras ameaças, do Ébola ao MersCoV e ao vírus Zika.
O plano diz ser “fundamental” a identificação precoce de casos de doença e surtos, desde logo através de “um sistema de vigilância de elevada sensibilidade”. O problema, ou “ponto crítico”, como é referido, é que essa vigilância está “condicionada pelos recursos humanos” e pela “escassez de equipamentos [médicos]”.
Também essencial é, segundo o plano agora divulgado, o diagnóstico laboratorial, que vai “documentar o eventual reaparecimento do vírus e responder e gerir a surtos”. Mais uma vez, é tida como problemática a “capacidade de recursos humanos propriamente capacitados e disponíveis”, bem como a disponibilidade dos laboratórios para “aquisição de serviços e materiais” necessários à realização do número de testes laboratoriais requeridos.
Quanto às medidas de saúde pública a adotar, de modo a “reduzir o risco de transmissão individual e de propagação na população”, a aplicação de algumas delas, refere o documento, “levanta questões de ordem ética e legal”, nomeadamente as chamadas medidas de distanciamento social, “uma vez que podem pôr em causa a liberdade individual”.
O que não levanta questões de ética ou legalidade é a higiene das mãos e a “etiqueta respiratória”, que o Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo Coronavírus recomenda aos profissionais de saúde e à população em geral.
Quanto à denominada etiqueta respiratória, o documento enumera conselhos repetidos pela Direção-Geral de Saúde nas últimas semanas: “Cobrir a boca e/ou o nariz ao tossir, assoar ou espirrar, com lenços de papel descartáveis; depositar imediatamente os lenços após a utilização em recipientes adequados; não usar as mãos para cobrir a boca e/ou o nariz; na ausência de lenços de papel, usar o antebraço para tapar a boca e/ou o nariz; após se ter tossido, espirrado ou assoado deve ser feita a higienização completa das mãos e não se deve tocar com as mãos na cara sem antes as ter higienizado; não cuspir para o chão”.
O que não é aconselhável é a utilização de máscaras descartáveis por quem não apresenta sintomas de infeção, devendo estes restringir-se a “indivíduos sintomáticos”, os doentes, e profissionais de saúde que com os mesmos contactam diretamente.
Aos restantes, a utilização de máscara é aconselhável somente a “cuidadores de indivíduos doentes no domicílio” e “indivíduos com suscetibilidade acrescida” – como, por exemplo, imunodepressão –, bem como a quem (se tiver algum tipo de “suscetibilidade acrescida”) se dirigia a serviços de saúde.
Quando já diversos estabelecimentos de ensino (escolas, universidades) encerraram em Portugal, o Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo Coronavírus refere que, além do encerramento em si, existem “medidas menos interventivas” a considerar, como reduzir a interação entre os alunos – seja através da “redução do tamanho das turmas”, seja “aumentando o espaço entre os alunos”.
Nas empresas, por sua vez, o documento refere que a efetividade da intervenção “é baixa em situações de epidemia ou pandemia de gripe”. No entanto, e de modo a “aplanar o pico da epidemia”, este deve ser contemplada.
“Estas medidas podem traduzir-se na implementação de horários de trabalho flexíveis e desencontrados, promoção do trabalho à distância, maior utilização de ferramentas de comunicação como o correio eletrónico ou a teleconferência, até ao encerramento de locais de trabalho”, lê-se no plano agora conhecido.
Aconselhável é igualmente “evitar participar em eventos ou frequentar locais de utilização coletiva”, caso sejam apresentados sinais ou sintomas sugestivos de Covid-19, “e evitar contacto próximo com pessoas visivelmente doentes”.
O plano diz mesmo que os organizadores dos eventos ou os responsáveis pelos locais – “como centros comerciais, estádios desportivos, entre outros” – devem articular com a autoridade de saúde competente para otimizar a implementação das medidas – que poderão variar, dependendo do tipo de evento e do local onde o mesmo vai decorrer, “entre o adiamento ou o cancelamento”.
O documento alerta não só para a falta de profissionais de saúde, mas igualmente para a “insegurança dos profissionais”, fruto, também, do seu “desconhecimento quando à gestão de casos de Covid-19”. Preocupante quanto à resposta médica, e o documento refere-o, é também a “limitação de capacidade de resposta das linhas especializadas” – seja a linha SNS24, seja a Linha de Apoio ao Médico.
Imperativo é determinar, “se necessário”, o recrutamento de profissionais de saúde, identificando “as organizações que podem providenciar voluntários” e “desenhando uma estratégia para assegurar os recursos humanos necessários às fases de preparação, resposta e recuperação” do Covid-19. E imperativa é, quanto aos recursos, “capacitar Portugal com medicamentos, dispositivos médicos e equipamentos de proteção individual para apoiar a resposta a Covid-19”.
Quanto à investigação, o documento refere que “o sucesso da resposta perante uma situação que possa colocar a saúde pública em risco depende, também, da celeridade com que o conhecimento é gerado”. No entanto, mais adiante se lê que “identificar e caracterizar o perfil genético associado a maior transmissibilidade e/ou gravidade da doença” pode acabar comprometido pela “falta de recursos dedicados, incluindo financiamento e recursos humanos”.
O documento salvaguarda que, devido à dinâmica do contexto epidemiológico e a incerteza científica quanto às características deste vírus, e por forma a adequar e flexibilizar a resposta, “proceder-se-á à revisão e atualização deste Plano, sempre que tal se mostre necessário”.