19 mai, 2020 - 19:56 • Inês Rocha
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No fim de fevereiro, quando Portugal ainda não tinha casos de Covid-19, a Casa de Repouso Jardim da Foz, no Porto, mais conhecida como “Casa do Anjo”, já tinha decidido cancelar e suspender todas as visitas de familiares de utentes.
Encomendou álcool gel e máscaras no fim de janeiro – ainda antes de começarem a esgotar - e, no início de março, optou por juntar num só espaço, completamente fechado, todos os idosos que estavam distribuídos pelas duas casas da instituição. Os funcionários que andavam de transportes públicos passaram a andar de Uber e a passar por um processo de desinfeção antes de entrar na instituição, pelas traseiras.
Quando começaram a surgir as primeiras orientações da DGS para lares de idosos, no dia 11 de março, já tudo isto estava implementado neste lar do Porto há mais de uma semana.
A razão de estar um passo à frente em relação ao resto do país reside no facto de a diretora morar num dos locais do mundo que mais bem conseguiram controlar a pandemia: Macau.
“Vivo num dos sítios com maior densidade populacional no mundo e conseguiu-se controlar a pandemia, só por causa das medidas rigorosas que eles tomaram”, explica à Renascença Graça Morais, diretora da Casa de Repouso Jardim da Foz.
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A diretora trabalha como jurista no Comissariado contra a Corrupção do Governo de Macau. Vai acompanhando o lar à distância, com o apoio da diretora técnica.
Graça diz estar já habituada a ter medidas rigorosas de higiene no seu dia-a-dia. “Todos os dias me medem a febre, quando chego ao trabalho, ainda hoje”, conta. O gel desinfetante já era uma presença habitual e as máscaras também, ainda antes de a Covid-19 chegar – “no sítio onde eu trabalho, as pessoas quando estão constipadas usam máscara. A máscara é de uso frequente e comum”.
Macau registou, numa primeira fase, dez infetados, e após 45 dias sem novos casos, identificou mais 35 doentes. Todos os 45 casos diagnosticados foram importados e as autoridades indicaram não ter existido contágio na comunidade. Hoje, com a pandemia completamente controlada, “continua a não haver uma única pessoa na rua sem máscara”.
“Eu acho que tem a ver com as pessoas. As pessoas estão habituadas a seguir o que lhes dizem, há um rigor maior em tudo”, considera. Quanto à atuação das autoridades portuguesas, considera que “estão a dar instruções corretamente, as pessoas é que tem de ter consciência para as seguir”.
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Uma das medidas mais “polémicas” que Graça optou por tomar foi a junção de todos os utentes, normalmente divididos por duas casas, num só espaço.
“Foi uma decisão difícil porque eu sabia que era uma coisa que não devia agradar a Segurança Social. Porque as casas têm um alvará para determinar o número de pessoas”.
Uma das casas da Casa de Repouso tem autorização para albergar 11 utentes, outra tem para sete.
No entanto, Graça considerou que esta seria a melhor solução possível. “Comecei a pensar: e se me começam a falhar funcionários? Não vou conseguir gerir isto”.
Por outro lado, a casa que está localizada na Avenida Dr. Antunes Guimarães “é grande” e tem capacidade para todos os utentes. A casa da Foz ficou livre para possíveis quarentenas, caso fosse necessário. E foi.
“Na altura tínhamos duas utentes hospitalizadas, que quando tiveram alta ficaram 14 dias na casa da Foz, com duas funcionárias, por precaução – ainda que tivessem tido um teste negativo”.
Graça optou por fechar todas as portas à chave, para garantir que ninguém entrava. Os funcionários passaram a entrar pelas traseiras, por uma lavandaria, a medir a febre à chegada e a trocar de roupa antes de entrar. Passaram também a usar máscara a tempo inteiro.
Para garantir que não andavam de transportes públicos no percurso até ao trabalho, o lar contratou um motorista de Uber.
“Era sempre a mesma pessoa, ia buscar o funcionário a casa e levá-los no fim do turno”, conta à Renascença.
Quanto a visitas de familiares, que foram retomadas em todo o país esta segunda-feira, Graça prefere jogar pelo seguro.
“Vou tentar abrir o lar a visitas só no início de junho. Isto se tudo continuar a melhorar”, ressalva.
“Acho que ainda não é a hora certa. Acho que lá dentro nós conseguimos controlar a situação, mas quem vem de fora eu não sei. São pessoas muito distintas, trabalham em sítios muito diferentes e não sei se vou conseguir controlar. Acho que vou esperar mais 15 dias para ver se as coisas melhoram um pouco”, explica à Renascença.
A diretora do lar diz que os familiares têm compreendido as opções, ainda que alguns não concordem. “Chegaram a ir para a porta do lar, para tentar convencer as funcionárias a deixarem-nos entrar”.
“Acho que as pessoas foram todas apanhadas de surpresa e não havia muita informação, mesmo da parte da direção-geral de saúde e da Segurança Social”, explica.
Ainda assim, a maioria compreendeu que as regras estavam a ser tomadas para bem dos idosos.
As visitas estão já a ser agendadas. Graça espera que se possam concretizar brevemente.