25 ago, 2020 - 16:40 • Fábio Monteiro
Desde 17 de agosto, as operadoras Meo, Nos e Vodafone, numa parceria com Accenture, passaram a obrigar os utilizadores dos seus serviços a assistir a uma publicidade de 30 segundos, antes de acederem a uma gravação nas boxes televisivas. Esta mudança foi conhecida apenas cinco dias antes de tomar efeito, por via de uma notícia no Expresso.
Agora, um grupo de seis deputados do PS enviou questões ao Ministério das Infraestruturas e Habitação sobre o que apelidam ser uma “decisão unilateral” e que “levanta questões do ponto de vista concorrencial”, tendo em conta que se pode tratar de uma ação concertada das três maiores operadoras em Portugal.
“No nosso entender, existe uma relação de equilíbrio contratual entre os consumidores e as operadoras das boxes, que é gravemente prejudicado por esta decisão. Havia um pressuposto de que os conteúdos televisivos eram gravados de forma automática durante um determinado período e podiam ser livres de acesso”, diz Miguel Costa Matos, deputado do PS e um dos signatários da missiva, em declarações à Renascença.
Nas questões endereçadas ao ministro Pedro Nuno Santos, os socialistas argumentam que os “operadores de televisão vêm alterar materialmente as condições de acesso aos serviços contratados pelos consumidores, interferindo na sua liberdade de acesso a conteúdos gravados, como descrito nos serviços que contrataram, e alterando o equilíbrio contratual entre as plataformas e os consumidores no sentido de gerar maior valor do consumidor”.
Os anúncios em causa estão integrados nas gravações automáticas; o único nível de autonomia dos consumidores é decidir se preferem publicidade genérica ou personalizada. Ao "Expresso", as operadoras argumentaram que a alteração limita-se a seguir tendências de outros países que já exploram a publicidade de gravações automáticas. E refira-se: a ferramenta será disponibilizada pelas operadoras, mas a inserção de anúncios nas gravações será decidida pelos próprios canais.
Segundo Miguel Costa Matos, o princípio de liberdade de acesso aos conteúdos gravados está a ser “prejudicado e obstaculizado”, porque as três maiores operadoras “decidiram monetizar o acesso a essas plataformas, procurando extrair um lucro, das pessoas aproveitarem um serviço que já tinham contratado de qualquer maneira”.
Aliás, o deputado do PS confessa estranhar o facto de a inclusão de publicidade nas boxes ter ocorrido ao mesmo tempo na Meo, Nos e Vodafone. “O estranho foi justamente isso. Surgiu ao mesmo tempo as três operadoras a dizerem que queriam passar, ao mesmo tempo, a obrigar os consumidores a verem publicidade. Sabemos que a Autoridade da Concorrência tem encontrado inúmeras situações que motivam a nossa preocupação. E esta é mais uma. Na medida em que a esmagadora maioria dos portugueses tem serviços de televisão contratados com estas empresas e ficam, de certa forma, sem qualquer hipótese de escolha”, afirma.
O socialista diz ter esperanças que o Governo tome uma posição sobre esta alteração e que se possa iniciar um debate público, com outras entidades reguladoras, nomeadamente a Anacom, “sobre se existe ou não uma necessidade de intervir em termos regulatórios ou legislativos”.
A discussão pública terá como objetivo último assegurar que as pessoas não são um instrumento para extrair lucro, quando no fundo o que elas querem ver é a televisão pela qual já estão a pagar para aceder”.