30 set, 2020 - 18:11 • Fábio Monteiro
Mais de uma centena de empresas parceiras da Uber e da filial Uber Eats vão avançar com uma ação coletiva contra a plataforma devido a pagamentos em atraso, apurou a Renascença. O processo deverá dar entrada na justiça na próxima semana. Até ao momento, cerca de 125 “lesados” já manifestaram interesse em entrar no processo judicial contra a Uber, mas a expectativa dos promotores é que o número ultrapasse as duas ou mais centenas.
Os atrasos nas remunerações semanais começaram no início de setembro, como é exemplo o caso de Andreia Morgado, proprietária do restaurante Pátria Burger, na Maia.
“No dia 30 de agosto recebemos o último pagamento [da Uber] e desde aí não recebemos nem mais um cêntimo. De momento, a dívida ascende a quatro mil euros. Já enviei cerca de 40 e-mails e só recebi respostas automáticas. O meu advogado já enviou vários e-mails também, porque nós entendemos começar uma ação em tribunal”, conta a proprietária.
Quando os pagamentos foram bloqueados, a Uber exigiu um comprovativo de atividade das Finanças da hamburgueria – documento, garante Andreia, que já havia sido submetido dois meses antes, quando começou a parceria com a plataforma. “Ao fim de uns trinta e-mails aprovaram [o comprovativo], mas continuaram sem pagar”, diz.
Há quatro semanas que Andreia não recebe nenhum valor das refeições vendidas através do serviço Uber Eats, o que, na prática, está a colocar uma corda ao pescoço do estabelecimento. “Estamos a ponderar encerrar. O restaurante é pequenino. Somos três pessoas. Começámos no meio da pandemia”, diz.
O Pátria Burger abriu em junho, em plena pandemia, e o seu modelo de negócio está fortemente assente nos serviços de entrega ao domicílio. “Fizemos parceria com a Glovo. Tem pago normalmente, sem problema algum, mas só a Glovo não chega para nos manter. Em termos de clientela presencial é muito pouca. Não podemos ter muita gente no restaurante”, lembra.
Notícia Renascença
À Renascença, fonte oficial da plataforma diz que (...)
David Assis, sócio único de uma empresa parceira da Uber, vive a mesma luta que Andreia, mas está noutra frente: os veículos TVDE. Desde o início de setembro, também está sem receber da plataforma; em causa, estão cerca de dois mil euros.
Como outros lesados ouvidos pela Renascença, David foi apanhado de surpresa uma segunda-feira, no início do mês, quando percebeu que não tinha recebido da Uber. Para se informar, deslocou-se às Amoreiras, ao Green Light Hub da Uber, onde lhe foi dito que tinha de atualizar os dados da empresa – o que fez, apesar das exigências não “fazerem sentido”. “A plataforma estava a pedir documentos que já tinha.” Mas a situação não se resolveu.
David continuou sem receber e depois foi-lhe dito que teria de submeter o registo de um dos sócios. O problema é que tal indivíduo nunca existiu. “Sou o proprietário único da empresa. Achei aquele e-mail descabido, para uma empresa deste gabarito, que avalia tudo e mais alguma coisa, vírgula a vírgula, ponto a ponto”, conta.
Ângela Reis, também detentora única de uma empresa parceira da Uber, relata uma experiência muito semelhante à de David. “Desde janeiro e até há um mês, a Uber sempre honrou os pagamentos. A mim, ficou sem pagar durante quatro semanas.” Na aplicação, “tinha tudo a verde”, nada indicava documentos em falta.
Por três vezes, durante o mês de setembro, Ângela deslocou-se ao centro de apoio da Uber nas Amoreiras, onde foi atendida por “miúdos novos sem experiência, sempre com os mesmos argumentos”, queixa-se. “Da segunda vez que lá fui, perdi um pouco a calma com o rapaz. Estava a dizer-lhe que a minha firma é unipessoal e ele dizia que faltava o cartão do sócio. Mas qual sócio? Não alterei nada. Não saí de lá enquanto o rapaz que me estava a atender percebesse o que é uma unipessoal”, conta.
Ângela não teve de submeter nenhum novo documento – e esta segunda-feira, dia 28 de setembro, recebeu os pagamentos em falta. “Não fiz nada”, garante – o que não é totalmente exato.
A empresária sediada em Algés submeteu uma reclamação no Portal da Queixa e incentivou os restantes “lesados”, que estão organizados e juntos em grupos de Whatsapp, a fazer o mesmo. “A Uber vive muito da imagem e isso afeta-os um bocado. Quando nós fazemos a queixa, passado 20 minutos, no máximo, já estão a pedir para a darmos como resolvida”, lembra.
Segundo a Uber, a demora nos pagamentos está relacionada com a entrada em vigor de uma nova diretiva da União Europeia, relativa ao branqueamento de capitais.
“É uma situação que está a afetar um número muito reduzido de parceiros, mas reconhecemos que mesmo para um número reduzido é um problema relevante. Estamos a trabalhar com eles para conseguirmos recolher a documentação necessária e ultrapassar estes constrangimentos o mais rapidamente possível”, disse fonte oficial da plataforma à Renascença.
De acordo com a empresa, entre maio e setembro, foram feitas várias chamadas e enviados múltiplos emails a alertar para a necessidade de atualizar registos. Além disso, foi também deixado um aviso de que os pagamentos poderiam ficar suspensos caso não submetessem os documentos requeridos.