08 dez, 2020 - 12:16 • Lusa
O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP), Paulo Rodrigues, cessa funções ao fim de 14 anos, com algumas conquistas e a certeza de que conseguiu dar visibilidade aos problemas dos profissionais da polícia.
A ASPP vai a eleições na quinta-feira e, em entrevista à agência Lusa, Paulo Rodrigues, que decidiu não se recandidatar, diz que os sindicalistas “são, por norma, uns eternos insatisfeitos” e que o trabalho sindical “nunca fica concluído nem nunca se consegue” o que se gostaria de alcançar.
“No entanto, houve algumas situações que considero positivas. Hoje, a sociedade tem a noção muito mais real do que são os verdadeiros problemas dos polícias. Conseguimos dar visibilidade àquilo que estava mal na polícia, em prol, não só dos polícias, mas também da sociedade. Temos uma Instituição que tem muitas carências, [que] tem muitas dificuldades em dar respostas àquilo que são as exigências da sociedade e que ainda não se adequou à evolução da sociedade”, sublinha o presidente cessante da ASPP.
Para o sindicalista, de 46 anos, a PSP “tem de fazer um grande progresso” e de “investir muito mais” no recrutamento de jovens com o perfil adequado para ingressarem nos quadros da Instituição, para que a mesma possa responder às necessidades da população, mas avisa que “não se pode exigir excelência e depois pagar como amador”.
“É importante que o Governo faça muito mais do que aquilo que fez. Durante todos estes anos, temos insistido na importância de fazer um bom recrutamento, de adequar aquilo que são os salários à realidade da Instituição e das exigências da missão, [nas] compensações e [numa] carreira que tenha perspetiva. Aquilo que tem acontecido é precisamente o contrário. Este menosprezo, esta desvalorização de grande parte do poder político e do Governo têm criado dificuldades”, lamenta Paulo Rodrigues.
Apesar dos obstáculos com que se deparou nos 14 anos em que liderou a maior associação sindical da PSP, que ainda hoje representa mais de 50% dos polícias (cerca de 10.000), o dirigente sindical congratula-se com “algumas conquistas pontuais” alcançadas.
“Nomeadamente [o] aumento do suplemento das forças e serviços de segurança de 14,5% para 20%, [o] aumento do fardamento de 5 para 50 euros, [ou] a questão de voltarmos a conquistar a polícia como corpo especial da Função Pública, algo que tínhamos perdido e que foi, infelizmente, necessário subir a escadaria da Assembleia da República para conquistar esse novo estatuto”, recorda.
Paulo Rodrigues admite que é “muito difícil neste momento fazer grandes conquistas”, revelando que “para se conseguir uma pequena conquista é [preciso] um esforço enorme”.
Esta realidade, assume, “custa bastante” a aceitar por parte da ASPP, pois, Paulo Rodrigues considera que o Governo, além de ter o dever de fazer mais, “devia ouvir mais” o maior sindicato da polícia “e adequar mais as políticas àquilo que são as necessidades dos profissionais que todos os dias andam no terreno” e que são “os menos ouvidos”.
Para o ainda presidente da ASPP, os sucessivos governos “têm desvalorizado muito” as forças de segurança, nomeadamente a PSP, porque não é uma Instituição que, diretamente, crie riqueza.
“[N]outras instituições, sejam ligadas às Finanças ou a outros setores, em que produzem riqueza direta para o Estado, há uma maior sensibilidade para olhar para os problemas desses profissionais e dar resposta às suas necessidades. A polícia é o contrário. A polícia, por norma, não cria riqueza, previne aquilo que é a nossa segurança. Claro que acaba por, indiretamente, promover o país, e tem-no feito, que depois tem alguma influência na economia. Mas a verdade é que o Governo tem desvalorizado completamente estes profissionais”, lamenta.
Outra das razões apontadas para que os governos desvalorizem a PSP, prende-se com o facto de esta força de segurança não poder usufruir do direito à greve.
“Tenho a noção de que se tivéssemos esse instrumento, os governos teriam, com certeza, tido outra postura nas negociações e na forma de tratar os profissionais de polícia”, frisa Paulo Rodrigues, que deixa a ASPP “com a ideia de que o direito à greve começa a ser essencial ou quase crucial para que o Governo tenha atenção, perceba e escute verdadeiramente os profissionais da polícia e os sindicatos”.
Quanto ao surgimento do 'Movimento Zero', o presidente cessante da ASPP considera que nasceu “dos vários erros que os governos e a Direção Nacional da PSP foram cometendo” e da falta de respostas às reivindicações dos sindicatos.
“É importante que o Governo tenha essa consciência, porque não me parece que este movimento, independentemente de ser este ou outros, que não possam aparecer no futuro. Vão aparecer no futuro se os governos continuarem a não dar respostas aos sindicatos, que são os legítimos representantes [dos polícias]”, avisa Paulo Rodrigues.
As eleições na ASPP/PSP estão marcadas para quinta-feira, em que o único candidato é o atual vice-presidente da associação, Paulo Santos.
O próximo presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP) quer manter um diálogo construtivo com a tutela, “olhos nos olhos”, mas admite “imprimir alguma contundência na luta”, devido ao “desânimo brutal e às expectativas goradas” dos polícias.
Em entrevista à agência Lusa, o atual vice-presidente da ASPP/PSP e único candidato às eleições para a direção da associação sindical mais representativa da PSP, que se realizam na quinta-feira, traça as linhas mestras para o mandato de quatro anos.
“Continuar a dialogar com a tutela, com o Governo, com a Direção Nacional [da PSP], em termos mais locais, com os seus comandantes da forma que tem sido a intervenção da ASPP nos últimos anos, olhos nos olhos, de forma assumida, frontal, transparente e sempre com um espírito de contribuir e [com] propostas como sendo contributos para resolver os problemas dos polícias”, revela.
Paulo Santos diz, contudo, que a ASPP estará disponível para ouvir os polícias e definir as lutas que entendam ser necessárias travar.
“Obviamente que estas lutas nunca poderão extravasar aquilo que são as balizas determinadas pela lei sindical e pela demais legislação. Agora, poderemos imprimir alguma contundência na luta, até porque temos razões e há um desânimo brutal por parte dos profissionais, que têm tido várias expectativas goradas, têm vários anseios, têm tido vários governos que não têm respeitado aquilo que são as promessas que são feitas”, critica o dirigente sindical.
O futuro líder da ASPP, de 43 anos, lembra que “há uma responsabilidade que é colocada diariamente em cima dos ombros dos polícias”, que não tem correspondência nem se vê “da parte dos governos e, muitas vezes, da parte da Direção Nacional [da PSP] e dos superiores uma atenção especial para com os polícias”.
“Se houver razões, que acho que já as temos, para imprimir uma dinâmica de luta mais contundente, estaremos disponíveis para isso, mas nunca ultrapassando aquilo que são os princípios da intervenção e da ação sindical séria que é aquilo que a ASPP sempre foi e será”, garante.
Em relação às manifestações, Paulo Santos diz que “são um instrumento da intervenção e da ação sindical” que estará sempre em cima da mesa como uma forma de luta, apesar de haver outras.
“Poderemos, caso a caso, e avaliar junto dos polícias, depois de os auscultar, perceber qual é que será a forma de luta mais assertiva naquele determinado momento. Mas, obviamente, que a manifestação é uma forma de protesto que está na génese da ASPP e dos sindicatos”, recorda o ainda vice-presidente da ASPP, no cargo há seis anos.
Paulo Santos contou que andou em campanha pelo país a ouvir os profissionais da polícia e chegou à conclusão de que há um ponto comum a todas as zonas e a todas as valências da PSP: “Há um desacreditar naquilo que foram as políticas dos últimos anos”.
“A ASPP tem tido durante estes anos um contributo fulcral naquilo que são as negociações que temos tido com os governos, e também junto da Direção Nacional [da PSP], e, muitas vezes, aquilo que sai cá para fora não corresponde àquilo que é negociado e que é aquilo que é anunciado pelos governos”, denuncia o dirigente sindical.
Entre as principais queixas, Paulo Santos afirma que “há um desânimo geral” relativamente à pré-aposentação e ao incumprimento do estatuto profissional nessa matéria.
Os “salários muito baixos”, em função das exigências e da responsabilidade da missão da PSP, e “uma falta de identificação que acontece muitas vezes com a cadeia de comando e com os políticos que têm a incumbência de gerir a parte da administração interna”, são outras das principais preocupações no seio dos profissionais da PSP.
“E depois há um problema que também é fulcral que tem a ver com a forma como a sociedade civil tem avaliado e, muitas vezes, a comunicação social tem avaliado aquilo que é o trabalho dos polícias no terreno. E há alguma falta de conhecimento por parte de quem avalia aquilo que é a ação e a intervenção policial, e essa falta de conhecimento, por vezes, transmite cá para fora algo que não corresponde àquilo que é exatamente o que se passa no terreno, e isso desmotiva muito os profissionais da PSP”, lamenta o futuro presidente da ASPP.
Sob o lema “Razão e Coesão”, Paulo Santos diz que os polícias “têm a razão do seu lado e todas as razões” para continuarem a lutar pelos seus direitos.
Com a coesão, o futuro presidente da ASPP pretende dar enfoque à “família policial”, uma condição que se foi perdendo.
“Consideramos que tanto a união como a coesão não são valores que apenas se divulgam, que se usem como retórica, mas pretendemos junto daqueles que são polícias, desde aos agentes, aos chefes ou aos oficiais, ver na ASPP um espaço coeso e que possa lutar pelos seus direitos”, garante o dirigente.
Paulo Santos toma posse como presidente da ASPP em 16 de dezembro.