26 dez, 2020 - 22:00 • Lusa
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A “megaoperação” de vacinação contra a covid-19, que arranca domingo, mobilizará cerca de 100 profissionais no Hospital de São João, no Porto. Ao longo de 10 horas está previsto administrar 2.125 doses, num processo quase que cronometrado ao segundo.
“O processo de entrega [das vacinas] correu de forma tranquila. As vacinas chegaram bem e estão bem de saúde”, diz o diretor dos Serviços Farmacêuticos do Centro Hospitalar e Universitário de São João (CHUSJ).
Pedro Soares falava aos jornalistas junto ao local de armazenamento das vacinas, que chegaram ao Porto cerca das 16:30. Estão guardadas a temperaturas que vão dos dois aos oito graus, o equivalente a um frigorífico doméstico, e podem manter-se assim durante cinco dias.
Mas as 2.125 doses que o Hospital de São João recebeu em 425 “frasquinhos”, sendo que cada um serve para preparar cinco vacinas, cada uma com 0,3 mililitros de produto, vão ser administradas num só dia ao longo de 10 horas consecutivas e a um ritmo próximo das 200 unidades por hora.
Às 10h00 será vacinado o primeiro profissional de saúde. Incluem-se nos elegíveis médicos, enfermeiros, assistentes operacionais e técnicos de diagnóstico e terapêutica, de serviços referenciados pela Direção-Geral da Saúde (DGS).
Duas horas antes dessa primeira administração histórica – que será acompanhada da ministra da Saúde, Marta Temido – já a equipa da farmácia iniciou a preparação das doses. Pedro Soares chama à “megaoperação”, que “nunca na história do hospital envolveu uma equipa desta dimensão ao serviço num domingo”, uma espécie de “ballet russo” e promete o rigor de um relógio suíço.
“É uma operação logística que assusta pela sua dimensão, mas que esperamos conseguir executar com a eficiência de um ballet russo. Neste momento, o maior desafio é o volume de preparações que estamos a fazer”, referiu, descartando potenciais hesitações ou dúvidas sobre o processo porque, afinal de contas, só a vacina contra a covid-19 é nova, o processo de manuseamento não e foram feitos testes para preparar toda a equipa.
“Estamos a falar de um bem escasso que muita falta nos faz e que é muito ansiado e desejado pelos portugueses e pela população mundial. Temos de ter noção que temos uma janela relativamente curta de oportunidade para eficazmente podermos começar a utilizar as vacinas”, acrescentou.
A “janela de oportunidade” à qual se refere Pedro Soares prende-se com o facto desta vacina contra a covid-19 ter, após estar preparada, uma “estabilidade de seis horas até ser administrada”. Consigo, o diretor de serviço terá dois farmacêuticos, seis técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica e assistentes operacionais. “Temos de funcionar como um relógio suíço”, sintetizou.
Cinco minutos é o tempo do trajeto entre a Farmácia e o Centro de Ambulatório, área normalmente dedicada às consultas externas. O produto diluído em soro será colocado em bolsas com proteção de luz e transportado em mala térmica para ser administrado à temperatura ambiente.
Xavier Barreto, diretor do Centro de Ambulatório do CHUSJ, fala em cerca de 100 profissionais envolvidos na operação. Pelo menos quatro dezenas deles são enfermeiros. Há 25 gabinetes médicos preparados que receberam um reforço de consumíveis, como luvas e compressas, e todos os profissionais que serão vacinados têm chamada marcada para uma hora específica. “A cadência vai-se acelerando ao longo do dia”, disse o responsável.
É que o tal “relógio suíço” inclui meia hora no pós-administração da vacina para vigiar possíveis eventos adversos, como reações alérgicas, por exemplo.
“Não esperamos nada muito mais grave. Há algumas pequenas reações que estão descritas e são iguais, ou muito semelhantes, às da vacina da gripe”, descreveu, por sua vez, o diretor da Unidade Autónoma de Gestão de Urgência e Medicina Intensiva do Hospital de São João, Nelson Pereira.
A operação de “vacinação massiva”, como lhe chamou antes Xavier Barreto, mobilizará, além dos Serviços Farmacêuticos do CHUSJ, o Serviço de Saúde Ocupacional para esclarecimento de dúvidas, a Unidade de Farmacologia Clínica, o Serviço de Imunoalergologia, bem como uma equipa da Emergência Intra-Hospitalar que terá a missão de monitorizar essas eventuais reações. E até o voluntariado foi envolvido na missão no apoio com cafés, chás e bolachas.
Também está prevista a presença de elementos do Agrupamento de Centros de Saúde Porto Ocidental para apoio nos registos eletrónicos, existindo reforço da segurança interna, desde o local de preparação na farmácia aos locais de administração, mas o diretor do Centro de Ambulatório “não acredita que algo estranho aconteça a esse nível”.
“Não esperamos grandes problemas. Temos a segurança habitual com alguns reforços em algumas portas (…). O nosso hospital de dia, [única área de ambulatório que nunca para porque há doentes que têm de fazer tratamentos ou fármacos em qualquer dia, incluindo sábados e domingos] terá um circuito diferente”, descreveu Xavier Barreto.
Soma-se, ainda de acordo com informação enviada à Lusa pelo CHUSJ, “uma célula de crise instalada no conselho de administração, para acompanhar ‘online’ toda a operação”.
“Este processo é fundamental para conseguirmos uma imunidade de grupo e defendermos o nosso país”, concluiu Nelson Pereira na visita à imprensa que serviu para mostrar os bastidores de uma operação que teve início esta manhã quando o primeiro lote de vacinas contra a covid-19 chegou a Portugal, escoltada por forças de segurança numa viatura refrigerada.
À semelhança de outros países da União Europeia, em Portugal a vacina é facultativa, gratuita e universal, sendo assegurada pelo Serviço Nacional de Saúde.
Os profissionais dos centros hospitalares universitários do Porto, Coimbra, Lisboa Norte e Lisboa Central serão os primeiros a ser vacinados.
A pandemia de covid-19 já provocou mais de 1,7 milhões de mortos no mundo desde dezembro do ano passado, incluindo 6.556 em Portugal.