14 jan, 2021 - 11:27 • Joana Gonçalves
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A nova variante do SARS-CoV-2, inicialmente detetada na África do Sul, está a preocupar as autoridades de saúde internacionais, numa altura em que o aumento de casos de infeção pelo novo coronavírus disparou, por todo o mundo. Com uma transmissibilidade superior à apresentada pela estirpe originalmente identificada no sul de Inglaterra, os especialistas tentam agora perceber que efeitos terão as mutações desta nova variante na eficácia da vacina contra a Covid-19.
“Partilho a preocupação, porque esta nova variante da África do Sul apresenta mutações na proteína spike, que é essencial para a interação com o receptor celular, e isso pode tornar a vacina um bocadinho menos eficaz, no que diz respeito aos anticorpos que ela gera”, adianta Pedro Simas. “Essas pequenas variações, que afetam de alguma forma a eficácia dos anticorpos, podem ter um efeito, no sentido de a pessoa estar menos protegida contra a infeção mais ligeira da nasofaringe. Isso é possível que aconteça”, acrescenta.
Em entrevista à Renascença, o virologista do Instituto Molecular da Universidade de Lisboa explica que, apesar desse impacto, “o efeito não será dramático”.
A eficácia das vacinas tem sido medida pela presença de anticorpos neutralizantes do vírus, que impedem a sua entrada nas células. Mas há outra parte do sistema imunológico que é “extremamente importante” no combate às infeções virais - a imunidade celular. “São estas células especiais que eliminam as células infetadas e resolvem a infeção”, esclarece o especialista. Ora, a imunidade celular é muito robusta, neste tipo de mutações, e consegue resistir, protegendo o organismo contra a doença severa.
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“Uma das coisas que ainda não se sabe é se esta vacina confere uma proteção grande contra a infeção superficial da nasofaringe. O que se sabe é que protege muito bem e é muito eficaz contra a infeção grave do pulmão. Isso sabemos”, defende o virologista.
A Organização Mundial de Saúde antecipou para esta tarde a reunião do comité de emergência para discutir estas duas variantes do novo coronavírus, que apresentam maior capacidade de disseminação.
Mas o que as distingue? A variante da África do Sul é ainda mais transmissível do que a do Reino Unido. Pedro Simas explica o que está em causa.
“Há diferenças. Os aminoácidos, unidades que constituem as proteínas, ligam-se para as construir, como se fossem tijolos de uma casa. Alguns destes tijolos ligam-se diretamente à proteína da célula que é o recetor do vírus”, começa por esclarecer.
“O que distingue a variante da África do Sul da variante do Reino Unido é que além de ter uma mutação num aminoácido comum ao do Reino Unido (501) - um dos tais tijolos que constroem a proteína - há um segundo aminoácido (444) que também mudou e aumenta ainda mais a capacidade de ligação ao recetor”, adianta.
É esta acumulação de duas mutações que faz da variante da África do Sul ainda mais transmissível.
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Ambas as estirpes têm um enorme impacto na disseminação do vírus, mas nada indica que provoquem uma manifestação mais severa da doença, isto é, não são mais virulentas. Este equilíbrio é fundamental para o sucesso do vírus e há uma razão biológica para isso.
As medidas que temos vindo a adotar para combater a pandemia têm procurado impedir a disseminação, portanto a pressão seletiva vai selecionar aquelas mutações, aqueles vírus, que são mais eficientes a disseminarem-se. ”Esses vírus, por definição, provocam manifestações mais leves da doença, porque são os assintomáticos, que não sabem que estão infectados, que mais disseminam o vírus”, adianta.
Apesar das novas variantes do SARS-CoV-2 que têm surgido pelo mundo, Pedro Simas está confiante no êxito da vacina contra a Covid-19. O virologista destaca o exemplo dos vírus do sarampo ou da poliomielite, que são também vírus RNA, com grande taxa de mutação, e que nunca sofreram alterações suficientes para colocarem em causa a eficácia das respetivas vacinas. “Neste momento as vacinas, que já se usam há muitos anos, permanecem eficazes”, lembra.
O especialista afasta, ainda, a possibilidade de o novo coronavírus se comportar de forma semelhante ao vírus da gripe, que exige uma atualização anual da vacina. “São vírus totalmente diferentes. Este vírus usa uma estratégia completamente distinta da adotada pelo vírus da gripe. Cada coisa na natureza ocupa o seu nicho”, esclarece.
É também por isso que defende que “não é legítimo dizer que se não conseguimos uma vacina para o HIV há mais de 30 anos, não vamos conseguir para este novo coronavírus”. “Nós sabíamos que íamos conseguir a vacina para este coronavírus, com base em vacinas que já existiam para outros coronavírus para animais domésticos. Não foi um milagre. Nós sabíamos que era possível”, explica o especialista.
Em Portugal, já foram vacinadas mais de 75 mil pessoas, entre profissionais do SNS, profissionais do Hospital das Forças Armadas, profissionais do Instituto Nacional de Emergência Médica e profissionais e residentes em estruturas residenciais para idosos e unidades de cuidados continuados.