22 mar, 2021 - 06:48 • Fábio Monteiro
No ano passado, entre março e maio, a concentração de dióxido de carbono (CO2) na água do estuário do Douro baixou para níveis de há 35 anos. Mas mal a economia retomou, o país abandonou lentamente o confinamento, os níveis de poluição voltaram a subir. Voltou a acontecer o mesmo no atual confinamento? E o que significa esta inversão?
“Quando o homem abranda, outras formas de vida florescem. Nós vimos isso nos oceanos, vimos isso nas cidades menos poluídas, nos rios. Isto é uma mensagem clara. Uma mensagem da mãe terra, do sistema terrestre, a reclamar ao homem uma outra harmonia com o mundo natural”, diz Ricardo Campos, presidente do Fórum da Energia e Clima, em declarações à Renascença esta segunda-feira, 22 de março, data em que se comemora o Dia Mundial da Água.
Para Ricardo Campos, “nos nossos cinco grandes rios, Douro, Minho, Mondego, Tejo e Guadiana, temos um traço comum: é que as águas, quando nascem nas montanhas, vêm ecológicas, com toda a qualidade. O problema começa quando chegamos às zonas onde todos nós vivemos e aí há uma influência direta das atividades humanas na qualidade da água.”
Segundo o Presidente do Fórum da Energia e Clima, “muitas vezes concentramos as nossas atenções nos grandes problemas, em fiscalizar os grandes problemas, e aí é muito importante a vigilância da atividade das indústrias, que são obrigadas a fazer o tratamento das suas águas residuais em estações próprias”. Todavia, muitas vezes “não prestamos tanta atenção àquilo que é o comportamento a uma escala mais pequena”.
À Renascença, Ricardo Campos sublinha que é “importante dizer às pessoas que há produtos, que são resíduos, que não devem ir para as sanitas e os esgotos”. Na mesma medida, “nas indústrias existe sempre um problema de haver cuidado com o tratamento das águas residuais, até porque há componentes que as nossas ETAR, do efluente urbano, não estão preparadas para tratar, como por exemplo o crómio e outros.”
Em vários aspetos, os últimos doze meses de pandemia foram uma catástrofe. Não é preciso citar inúmeros estudos científicos para atestar a veracidade desta afirmação. Mas o ambiente pode ter sido uma exceção.
“Julgo que no ano de 2020 houve uma melhoria de toda a situação ambiental, porque houve uma menor pegada, digamos assim, daqueles que são os processos industriais que têm também outra consequência económica e social. De facto, assistimos a essa melhoria, em vários aspetos relacionados com os temas e com as preocupações ambientais. É um dado inegável que, relativamente aos anos anteriores, 2020 foi um ano mais importante e com importantes lições que devemos aprender para futuro”, afirma Ricardo Campos.
O presidente do Fórum da Energia e Clima dá dois exemplos. Primeiro: “Vimos a poluição nas cidades a baixar. Os carros a Diesel libertam partículas, algumas nano-partículas muito prejudiciais, nomeadamente o dióxido de azoto nos carros a gasóleo. E vimos cidades menos poluídas.” De acordo com um estudo publicado no início de março na revista científica Nature, as emissões de gases de efeito de estufa (GEE), como o dióxido de carbono, caíram globalmente 6,4% em 2020.
Segundo exemplo: “Há estudos referentes a Itália que mostram que em cidades menos poluídas os doentes com Covid-19 recuperam com mais facilidade”, aponta.
Um artigo publicado na revista Environmental Pollution indicia mesmo que a poluição atmosférica pode estar relacionada com a taxa de mortalidade do vírus no norte de Itália; na Lombardia, 12% dos infetados faleceram, no restante país foi de 4,5%.