07 abr, 2021 - 06:30 • Liliana Carona
Já podem reabrir os centros de dia, mas a maioria dos contactados pela Renascença recusou falar sobre o tema, justificando-se com a indefinição e a insegurança.
No caso do Centro de Dia da Associação Humanitária Social e Cultural de Pinhanços, fundado em 1995 no concelho de Seia, prepara-se a reabertura oficial para a próxima segunda-feira, dia 12, embora alguns utentes mais ansiosos já visitem a instituição.
Marisa Bento, assistente social, confirma que recebeu muitos telefonemas por estes dias.
“Estavam sempre a perguntar quando ia abrir o centro de dia”, revela a técnica que durante o encerramento continuou a trabalhar, porque os utentes do centro de dia foram englobados no apoio domiciliário com 80 idosos.
Aos 89 anos e casado há 63, António Amaral resume a importância do centro de dia, para ele e para a sua mulher.
“Já vínhamos aqui há muitos anos, íamos e voltávamos, fomos sempre tratados como gente. Sempre a irem-nos buscar, às vezes até à noite. Eu estou feliz por estar aqui, só tenho a falar bem do centro de dia. Dão-nos coisas para fazer e ler, aprendo coisas que não sabia”, desvenda sobre a rotina.
Também António Duarte, 94 anos, tece elogios ao apoio recebido. “Acolhem-nos para não andarmos sozinhos por lá. Em casa tivemos bastante apoio: lavagem, tudo o que nos fazia falta, roupa, comida, estava tudo presente, sempre bem acarinhado”, assegura Duarte, que é casado há 70 anos com outra utente, mas da valência do lar.
É hora de rever os amigos e de pôr a conversa em dia para António Amaral, 89 anos, e o amigo, António Duarte, de 94, que diz serem “como irmãos”.
“Já tínhamos bastantes saudades”, interrompe António Amaral, exibindo um corte de cabelo que classifica de “radical”, feito no apoio domiciliário. Marisa Bento atesta a veracidade das declarações de António Amaral. "Mesmo com os cabeleireiros fechados, houve corte de cabelo, tratamento de unhas, reforço de autoestima”, diz enumerando outras atividades feitas, “desde alimentação, a higiene, cuidados de imagem, tratamento de roupa, limpeza de habitação" E admite as saudades dos utentes no centro.
“Eles acabam por ser a nossa família e estávamos cheios de saudades. Temos ginástica, fisioterapia, enfermagem, psicologia e faltava o convívio com os outros utentes, ficaram mais fragilizados”, revela.
Manuel Fonseca, 85 anos, viúvo, “sentia muita falta” do centro, pois “ia tomar ar e vinha. Todos os dias via os colegas, todos nos damos bem”, sorri, enquanto conta que não sabe ler, mas pinta, ao som dos Coldplay. A música aqui preenche todos os espaços.
“Estou aqui há dois anos e não tenho queixas. Hoje, o almoço foi pernas de frango com batatas, estava porreiro mesmo. A minha filha fica sempre mais livre, comigo aqui. Aqui lavam-me, vestem-me, calçam-me”, refere.
Enquanto estiveram ausentes, Carlos Lagarinhos, 57 anos, o presidente da Associação Humanitária Social e Cultural de Pinhanços, providenciou mais condições para o centro de dia.
“Tento sempre trazer a tecnologia cá para dentro. Adquiri mais dois televisores, cada um vê o canal que quer, e uma coluna de som portátil para começarem a ir para fora ouvir música, para que eles sintam que estão sempre acompanhados”, salienta, acrescentando que recentemente organizou um passeio pelo concelho, com recurso a sete carros, de forma a saírem da instituição.
Mas porque não abriu logo portas o centro de dia, na segunda-feira, dia 5 de abril? “Para as instituições que têm outras valências, como nós que temos o lar, com 72 utentes, temos de avaliar bem. Os meios humanos estão cá, não poupo nos recursos humanos, mas há a parte burocrática, autorizações, etc. Mas nunca deixamos de acompanhar as pessoas. O regresso oficial é na próxima segunda, para que nada lhes falte”, conclui.
Maria dos Santos, 83 anos, está feliz de poder voltar a comer arroz doce. Mas hoje chegou à hora do lanche, no exterior do edifício, como se de um convívio se tratasse.
Chá e marmelada aquecem-lhe a voz para começar a cantar, mas antes o desabafo: “tenho um filho e uma filha, mas estão longe, fora do país, não havia cá lugares para eles. Se não fosse isto, estava sozinha”.