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​Operação Marquês: “Uma investigação errática com prova especulativa"

09 abr, 2021 - 21:26 • Liliana Monteiro

Em declarações à Renascença, Paulo Sá e Cunha, advogado de Sofia Fava, considera que o juiz de instrução Ivo Rosa fez bem em mandar investigar a distribuição do processo da Operação Marquês ao juiz Carlos Alexandre.

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“Uma investigação errática com prova especulativa só podia resultar numa decisão instrutória como a proferida pelo juiz Ivo Rosa”, diz defesa de Sofia Fava em reação à desfecho de mais uma fase do processo Operação Marquês.

Sofia Fava, ex-mulher de José Sócrates, não vai a julgamento: viu arquivados um crime de branqueamento de capitais e um crime de falsificação de documento.

A defesa não podia estar mais satisfeita e diz que uma investigação errática com prova especulativa só podia resultar numa decisão instrutória como a proferida pelo juiz Ivo Rosa.

Em declarações à Renascença, o advogado Paulo Sá e Cunha elogia o trabalho feito pelo juiz Ivo Rosa e lamenta que o Ministério Público (MP) tenha levado para a frente um caso com factos ligeiros e não sustentados.

“Quando se chega a uma acusação tão grande que vem na sequência de uma investigação errática e a prova é muitas vezes assente em pura especulação, fantasiosa e as vezes delirante, não conseguimos alcançar bons resultados, fazer justiça. Porque independentemente do que aconteceu e da convicção da culpabilidade de A, B ou C, o processo trabalha com provas e têm de ser suficientemente sólidas com indícios suficientes dos crimes”, diz.

Paulo Sá e Cunha admite que a corrupção é um crime de difícil investigação e prova, no entanto recorda que a investigação não pode descurar determinadas orientações.

“Há muitas frases feitas, a corrupção é difícil de provar, mas não é vedado o recurso à prova indireta. Para haver essa prova tem de haver factos resultantes de prova direta que permitam, por processos lógicos, chegar à prova de outros factos que não são diretamente provados, mas que se podem inferir a partir da prova direta. E esta acusação é muito escassa nisso e tem falhas apreciáveis. Dizer que A é amigo do B e que o A faz em favor do B, sendo que o que faz não depende só dele, mas de um conjunto vasto de pessoas, acaba por não traduzir a prova de coisa nenhuma.”


E acrescenta que houve deduções de atos apontados apenas a um arguido em processos que não passavam apenas por uma pessoa. “Se pensarmos na corrupção. Havia atos do conselho de ministros, do conselho da Caixa Geral de Depósitos e o juiz questionou como é que a designação de um administrador condiciona atos que não dependem só de uma pessoa sem se demonstrar que ele influenciou 10 ou 15 pessoas que estão na origem das decisões que supostamente são o resultado pretendido da corrupção”, referindo-se à escolha de Armando Vara acusado de viabilizar um empréstimo ao empreendimento Vale do Lobo.

Paulo Sá e Cunha não tem dúvidas do impacto na opinião pública, mas lembra que o tempo e a forma de trabalhar da justiça não é o mesmo da comunicação pública e do debate da sociedade e meios de comunicação.

“O que o juiz disse foi acertado, o processo foi alvo de fugas de informação, decisões que criaram expectativa na opinião pública, isto com base em elementos que não são os do processo. Desta decisão resulta a simples aplicação do direito aos factos que estão da acusação.”

A Operação Marquês descreve-a como um “processo que na fase de inquérito começa por uma ponta e depois vai chegando a outros factos e outros arguidos, vai tirando coelhos da cartola e isso sucede ao longo dos anos. Isso representa uma linha pouco coerente de investigação. Uma investigação demasiado alargada que avançou de forma desconexa e perdeu o norte, um problema típico dos megaprocessos”.

Ivo Rosa fez bem mandar investigar escolha de Carlos Alexandre

O juiz Ivo Rosa anunciou a extração de uma certidão para a Procuradoria-Geral da República (PGR) averiguar a distribuição do processo da Operação Marquês ao juiz Carlos Alexandre.

Segundo Ivo Rosa, que está a ler a decisão instrutória do processo Operação Marquês, em causa está a eventual violação do princípio do juiz natural ou juiz legal.

“Não sei se houve uma ação tendenciosa ou não, mas como ando nisto há muitos anos e vejo outros processos (por exemplo o caso EDP, em que acontecem coisas estranhas que me fazem suspeitar se não haverá naquele tribunal um certo sentido de oportunidade) é bom esclarecer a questão da escolha do juiz, até porque se tem falado muito disso”, argumenta Paulo Sá e Cunha.

Nestas declarações à Renascença, o advogado comentou ainda as entrevistas dadas nomeadamente pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e por inerência do Conselho Superior da Magistratura (CSM).

“Acho absolutamente surpreendente nas vésperas desta decisão que se tenham multiplicado entrevistas de altos responsáveis atuais e passados da justiça a sugerir alterações ao processo penal e ao Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), só agora se deu conta dos problemas? Além de que fica a sensação que essas intervenções públicas servem para condicionar quem está com os processos.”

Fazendo apelo à experiência no terreno, o advogado afirma que “esta questão da distribuição tem de ser esclarecida porque já se percebeu que isso é um problema. Há duas linhas de atuação antagónicas nos juízes que lá [TCIC] trabalham. Todos nós sabemos, advogados e Ministério Público que se um determinado processo vai para um determinado magistrado a linha de orientação é mais para um lado ou para o outro e isso pode permitir orientar a decisão do processo em função do juiz a quem o processo pode calhar”, conclui Paulo Sá e Cunha.

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