26 abr, 2021 - 07:32 • Vítor Mesquita
É urgente recuperar os níveis de vacinação anteriores à pandemia. O alerta é da Unicef, na Semana Mundial da Imunização, que arranca nesta segunda-feira. As atenções mundiais continuam viradas para a vacina anti-Covid19, mas é importante ter em conta que há outras doenças a combater. Se nada for feito para repor o ritmo de administração das restantes vacinas, corremos o risco de voltar a níveis de desenvolvimento do século passado.
A diretora executiva do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Beatriz Imperatori, explica que é importante, “não só fazer a administração da vacina Covid-19, como a de todas as outras vacinas, seja à poliomielite, da tuberculose, da rubéola, das hepatites, do sarampo, etc., retomando o ritmo e recuperando o tempo que foi perdido por causa do impacto da pandemia”.
“O risco que nós corremos aqui – e quando falamos em Índice de Desenvolvimento Mundial, que tem diversas dimensões, uma delas a da saúde – é que se nós não atuarmos rapidamente, esse índice pode vir a recuar para valores que tínhamos em 1990, existindo mesmo a possibilidade de termos valor de desenvolvimento de 1980”, alerta, em declarações à Renascença. E essa é uma realidade que o Fundo das Nações Unidas para a Infância quer ver revertido o quanto antes.
No seu mais recente retrato ao panorama da vacinação está escrito que, “enquanto lutamos contra o impacto da Covid-19, não devemos esquecer que, a cada ano, 14 milhões de bebés em todo o mundo não recebem vacinas contra doenças evitáveis. A maioria dessas crianças vive em meio de conflitos ou em comunidades remotas mal servidas e em ambientes informais, onde frequentemente lutam para ter acesso a serviços básicos de saúde e sociais. A pandemia veio agravar esta situação. As interrupções nos serviços e o caos económico gerado ameaçam levar um aumento devastador nas mortes evitáveis de crianças não imunizadas”.
A posição encontra eco nos números da Organização Mundial de Saúde (OMS), segundo os quais entre janeiro de 2020 e este mês de abril, mais de 16 milhões de crianças em África falharam a toma de doses da vacina do sarampo devido às perturbações causadas pela pandemia nos programas de imunização. No mesmo período, oito países africanos reportaram grandes surtos da doença, mas também de febre amarela, cólera e meningite.
Pandemia de Covid-19
Diretora-executiva da Unicef alertou que a covid-1(...)
É uma realidade que Imperatori aclara ao explicar que “nós é que vamos ter aos centros de saúde. Em muitos sítios, são os profissionais de saúde que vão ter com as comunidades. Quando estes profissionais de saúde não se podem deslocar, estas comunidades deixam de ter apoio. Aquelas crianças deixam de ser vacinadas. Não há nenhum profissional médico que tenha as vacinas para administrar ou que possa deslocar-se até àquela comunidade. Aconteceu em vários locais do mundo, África, Ásia ou América Latina”.
Já sobre Portugal, Beatriz Imperatori refere que, apesar dos impactos negativos da pandemia, o Plano Nacional de Vacinação não sofreu consequências graves. A responsável recorda que, no início, “houve algum atraso na resposta à pandemia, porque todos nós tivemos medo de nos deslocarmos, por exemplo, a um hospital, a um centro de saúde, a uma clínica. Mas pensa-se que isso foi recuperado e que não está em causa o Plano Nacional de Vacinação”.
“Aliás, isso está relacionado com a qualidade do nosso Sistema Nacional de Saúde, que provou, obviamente, sendo testado ao limite, que esteve à altura, num contexto muito diferente”, destaca.
A diretora executiva da Unicef Portugal defende a importância de não deixar para trás as outras doenças, mas, no atual contexto pandémico, a Unicef tem sido chamada a dar resposta às necessidades da vacinação contra a Covid-19, num raio de ação alargado.
“Nós somos, pela primeira vez, chamados a responder a uma pandemia universal e, dado este investimento que temos vindo a fazer desde 1948, em campanhas de imunização, em compra de vacinas e na conceção de vacinas junto com os próprios fabricantes, grandes empresas farmacêuticas, de facto faz com que a Unicef esteja neste momento a utilizar toda a sua estrutura para a pandemia, abrangendo não só crianças, mas adultos”, indica.
Beatriz Imperatori adianta que o objetivo passa por distribuir milhões de vacinas este ano.
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“A UNICEF, juntamente com a Organização Mundial de Saúde e várias fundações, como a Melinda e Bill Gates Foundation e outras, privadas também, juntaram-se numa aliança que é a Covax, que tem como objetivo distribuir gratuitamente doses de vacinas contra a Covid-19, sem custos, num total de dois mil milhões de vacinas em 2021. O que é necessário para fazer isto? Por um lado, é preciso trabalhar com os produtores destas próprias vacinas e, por outro lado, estabelecer os acordos com os governos. Há aqui uma preocupação muito importante nesta aliança. Temos de vacinar todos”, explica.
Ainda assim, a diretora da Unicef Portugal reconhece que o ritmo de distribuição está a ser mais lento nos países menos desenvolvidos. “Há aqui uma diferença grande na velocidade de vacinação dos ditos países ricos e desenvolvidos e dos países em vias de desenvolvimento. Há. É verdade”, admite.
Considera, por isso, que “é preciso continuar a investir. É preciso relembrar que temos de ser todos vacinados e não podemos querer as vacinas só para nós, esquecendo-nos dos outros”.
É uma corrida contra o tempo. “O grande desafio que se coloca agora a todos os países do mundo é que as vacinas contra a Covid-19 sejam distribuídas de forma equitativa e solidária, e não sejam monopolizados pelos países com mais recursos. É necessária uma liderança global para maximizar a produção de vacinas e garantir a igualdade de vacinação. A pandemia mostrou que os nossos destinos estão ligados e, por isso, este é um caminho que temos de percorrer juntos, lado a lado”, pode ler-se no mais recente documento da Unicef sobre imunização.