29 abr, 2021 - 23:42 • Ana Carrilho
Os dados de seis milhões e meio de residentes em Portugal, que responderam aos “Censos 2021” até terça-feira ao fim da tarde, estão em risco de cair nas mãos das agências de segurança vigilância norte-americanas.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) fez um contrato com a empresa tecnológica americana “Cloudflare” que prevê a transferência de dados para os Estados Unidos. Várias denúncias chegaram à Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que atuou de imediato.
A secretária-geral da Comissão Nacional de Proteção de Dados confirmou à Renascença que recebeu diversas queixas, mas uma em particular suscitou a intervenção, dando 12 horas ao INE para suspender qualquer transferência de dados pessoais para os Estados Unidos.
Isabel Cruz explicou que a circulação de dados decorria do contrato assinado pelo Instituto Nacional de Estatística. O objetivo era tornar a operação dos censos mais célere, sem sobrecarregar o site e levando a que não caísse em horas de maior procura. Mas esse contrato traz problemas acrescidos de proteção de dados que podem cair nas mãos das agências de vigilância norte-americanas.
“A CNPD averiguou a situação, confirmou que assim era – que tinha sido subscrito pelo INE um contrato para prestação desse tipo de serviço. Quais foram os problemas que se colocaram? Em primeiro lugar, os servidores não estão restritos à União Europeia e andam por todo o mundo, até países sem a proteção adequada. Por outro lado, o contrato subscrito prevê que as agências de vigilância dos Estados Unidos podem solicitar a este tipo de empresas acesso a todos os dados e essas empresas não podem avisar o cliente de que houve esse acesso aos dados”, disse.
Censos 2021
O Governo já garantiu que os dados dos censos estã(...)
Ou seja, o INE deixava de ter controle sobre os dados desde que saíam, encriptados, até que regressavam. Até porque a chave de desencriptação também era da empresa.
O INE, entretanto, terminou o contrato com a “Cloudflare” mas cerca de seis milhões e meio de respostas aos censos já tinham sido enviadas. A Comissão agiu rapidamente para salvaguardar os outros quatro milhões de pessoas que ainda não tinham respondido.
“A urgência da decisão da CNPD foi evitar que os restantes quatro milhões de cidadãos que ainda não tinham respondido ficassem na mesma situação. Os que já tinham ido, não há solução para esses”, confirma Isabel Cruz.
Uma situação que, frisa a secretária-geral da Comissão Nacional de Proteção de Dados, nos deve deixar muito preocupados.
“Esta é uma situação que não é desejável. Quando o tribunal de justiça da União Europeia vem declarar que os acordos que a Comissão Europeia fez para a transferência de dados para os Estados Unidos são nulos porque violam os tratados da União, quando há transferência de dados para os Estados Unidos devemos ficar preocupados”, refere.
A Comissão abriu um processo e vai analisar os ilícitos que terão ocorrido. A coima a aplicar ao Instituto Nacional de Estatística pode ir até aos 20 milhões de euros, mas não quer dizer que seja essa a ser aplicada, diz.
Isabel Cruz sublinha que os processos que implicam obtenção de prova são geralmente mais demorados, mas garante que a Comissão de Proteção de Dados está a dar grande importância a este processo.
Entretanto, o presidente do INE, Francisco Lima, em comunicado, já tinha anunciado o fim do contrato com a tecnológica americana e garantiu que essa ação não vai afetar a segurança do site do “Censos 2021”. Mas poderá haver uma diminuição da rapidez de acesso ao site.