06 mai, 2021 - 08:46 • Lusa
A Cimeira Social do Porto, que se realiza esta sexta-feira e é seguida de um Conselho Europeu informal no sábado, é considerada o ponto alto da Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.
António Costa discute os vários pontos que estarão em cima da mesa durante os dois dias da cimeira, mas destaca a possibilidade de o evento deixar uma marca importante na história da União Europeia, ao ser a primeira vez que um acordo geral é assinado por instituições europeias e parceiros sociais.
Para além desse acordo, o líder do executivo sublinha que um dos principais objetivos da cimeira é combater o populismo, e que as ações de contestação da CGTP e do BE não são uma “surpresa”.
O primeiro-ministro espera que a Cimeira Social, no Porto, na sexta-feira, seja um marco na história da União Europeia (UE) com a obtenção de um acordo geral subscrito por instituições europeias e, pela primeira vez, parceiros sociais.
"Se conseguirmos na Cimeira Social obter pela primeira vez um compromisso em que o Conselho e a Comissão assinam um acordo com a central europeia dos sindicatos, a ETUC, com a Business Europe, que é a associação das SIBS europeia, com a confederação das pequenas e médias empresas (PME) europeias, com a confederação das empresas dos serviços gerais, então é a primeira vez na história da União Europeia que há um acordo geral que reúne todos os parceiros sociais e as instituições europeias", afirmou António Costa em entrevista à agência Lusa.
De acordo com o primeiro-ministro, esta será "a primeira vez" que um compromisso com esta amplitude é alcançado, "porque em Gotemburgo [na Suécia, em 2017] houve uma declaração que teve um acordo a nível institucional, mas não foi assinado por nenhum parceiro social".
Para o primeiro-ministro, "a possibilidade de haver esse acordo, em si, será um marco muito importante" para a União Europeia. “Depois, temos todo o trabalho pela frente de concretizar este plano de ação que foi apresentado em março passado", completou o primeiro-ministro.
Nesta entrevista, António Costa procurou também relevar o caminho percorrido em termos de desenvolvimento do Pilar Social, desde 2017, com a Cimeira de Gotemburgo, na Suécia, onde então se aprovaram 21 princípios gerais.
"Na altura, fui um dos que disse: Muito bem, temos princípios gerais, mas agora temos de passar das palavras aos atos, precisamos de um plano de ação. Tivemos de esperar de 2017 até 2021 para haver este plano", refere.
"A Comissão Europeia cumpriu, apresentou a tempo e horas o plano de ação, esteve em discussão pública e lançou-o. E temos agora a oportunidade de os parceiros sociais poderem dizer não só que estão de acordo, mas assinarem um documento em que se comprometem a apoiar a execução do plano de ação", reforça. António Costa até admite que esse ato seja sobretudo "um gesto simbólico".
Face a esta evolução, o primeiro-ministro manifesta-se confiante de que no sábado, no Conselho Europeu informal, se conseguirá também a aprovação da Declaração do Porto, um documento em que o Conselho dá "um claro endosso político a este Pilar Social".
"Não me posso antecipar às conclusões do Conselho. Mas se perguntam quais são as metas que eu tenho para estes dias, são estas", frisa.
Na questão do salário mínimo, segundo António Costa, alguns dos Estados-membros que se opõem à diretiva não o fazem por serem contra o salário mínimo.
"Opõem-se pelo facto de o salário mínimo ser imposto por lei ou poder vir a ser imposto por lei, que é o caso dos nórdicos. Os nórdicos têm com certeza um modelo social mais avançado, mas têm princípios. Para eles, o Estado não pode intervir no diálogo social entre os parceiros para a fixação do salário mínimo", alegou ainda o primeiro-ministro.
António Costa afirma que a escolha da Cimeira Social como o grande evento da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia tem como "razão fundamental" o combate ao populismo e ao medo.
“O que mais tem alimentado o populismo é o medo, que se funda em diversas razões, uma das quais é uma profunda angústia social que as pessoas têm relativamente às transformações que o futuro lhes impõe", nomeadamente o receio de perder o emprego, sublinha o primeiro-ministro.
O primeiro-ministro salienta que isto acontece tanto em eleitores de Donald Trump, como eleitores e candidaturas populistas na Europa. "Há uma raiz comum que tem a ver com esta ideia de que as pessoas são deixadas ao abandono", sustenta.
Ora, afirma o primeiro-ministro relativamente ao Pilar Social, "a transição climática e digital podem ser os motores da recuperação económica, (...) e temos que assegurar o investimento efetivo na qualificação e na requalificação de todas as pessoas para que todos possam participar na mudança".
Costa considera que é uma "irresponsabilidade" os políticos "iludirem" que estas mudanças têm custos sociais e, sabendo-o, que não organizem respostas sociais adequadas. "Por isso quisemos repor o tema do Pilar Social e os direitos sociais no centro do debate político da União Europeia e até agora conseguimos", destaca.
O primeiro-ministro desvaloriza a contestação da CGTP-IN e do Bloco de Esquerda à agenda da Cimeira Social e destaca que a reunião europeia estará centrada na vida das pessoas, sobretudo no emprego.
O líder do executivo nega a existência de qualquer contradição entre a política social seguida pelo seu Governo em Portugal e aquilo que agora é proposto no âmbito da presidência portuguesa do Conselho da UE.
Já sobre as ações agendadas pelo Bloco de Esquerda e CGTP-IN, o primeiro-ministro argumenta que "uma das grandes vantagens da democracia é existirem visões diferentes sobre o que é necessário fazer, visões diferentes sobre a legislação do trabalho, visões diferentes sobre a evolução da economia e sobre as políticas económicas".
"Isso é normal e legítimo em democracia e a democracia não se suspende porque há uma Cimeira Europeia. Portanto, é natural que cada partido diga o que tem de dizer. É sabido, aliás, que a CGTP-IN não é propriamente uma central sindical muito pró-europeia. E o Bloco de Esquerda integra um grupo europeu que faz parte de uma oposição no Parlamento Europeu ao atual executivo comunitário. Portanto, aí não vejo qualquer surpresa nem qualquer alteração", remata.
"Desta vez, temos uma cimeira que está concentrada sobre algo que tem a ver com a vida do dia a dia das pessoas, como é que vai ser o seu emprego no futuro, quais vão ser as condições que têm para poderem transitar de emprego, como vão ter acesso a formação que lhes garanta poderem ter mais e melhor emprego, como vão ver assegurada a proteção social em caso de perda de emprego”, explica.
António Costa assinala depois que, caso se analise o plano de ação dos direitos sociais que estará em discussão na Cimeira Social, este documento "tem a dimensão laboral, a do combate à pobreza, e tem as dimensões que têm a ver com a política de habitação e com o acesso à habitação a preços acessíveis".
"Tem a ver com uma política europeia de integração dos sem-abrigo. E, sobretudo, um foco muito grande na importância decisiva de responder às necessidades das novas gerações", indica.
Segundo o primeiro-ministro, em toda a Europa, registam-se "taxas inaceitáveis de desemprego juvenil, níveis de precarização e de desregulação do trabalho das novas gerações e dificuldades de acesso à habitação".
"E essa é a maior ameaça à dinâmica demográfica na Europa. Os populistas gostam de dizer que a grande ameaça demográfica à Europa é a imigração. Mas a maior ameaça demográfica ao futuro da Europa é, de facto, a ausência de condições para as jovens gerações se poderem autonomizar e terem a liberdade de construir a sua própria vida", contrapõe.
Nesta entrevista, o primeiro-ministro recorre igualmente às razões que estiveram na origem dos protestos por parte dos 'gilets jaunes' [coletes amarelos] em França para sustentar a sua tese.
"Em França, começou quando o Presidente [Emmanuel] Macron adotou um conjunto de medidas fiscais para desincentivar a utilização de combustíveis fósseis. Toda a gente aplaude a Greta [Thunberg], os grandes movimentos ambientalistas, mas depois nós não podemos esquecer que essa transição também tem custos para pessoas. E nós estamos a ver", adverte.
Para António Costa, as políticas de transição climática e de transição digital têm por isso de ser "acompanhadas de fortes medidas sociais".
"Caso contrário, criamos fraturas, aumentamos assimetrias, e com essa disrupção social comprometemos o sucesso, que não podemos comprometer, da transição que temos de fazer", acrescenta.